Ao amigo General

Meu amigo General,

Antes de qualquer palavra, presto continência, recordando nosso primeiro encontro, no qual, com sua gentileza habitual, retificou e corrigiu minha postura e posição de mãos equivocadas. Como todo grande mestre, era a primeira das muitas lições que aprenderia ao seu lado. Nossa proximidade e convivência foram espontâneas, mesmo sem nos conhecermos muito bem, sempre me fez sentir a vontade e em pouco tempo, me receberia como um filho de alma. Aliás sempre foi nato o seu carisma e liderança. É o pai de muitos filhos, de todos aqueles que tiveram o privilégio de ter sua companhia e hoje se sentem um pouco órfãos. Sempre foi muito fácil segui-lo. Sua vida sempre foi um exemplo de renúncia, privações e uma dedicação inteira a tudo aquilo que se dedicou. Seu primeiro amor ao exército, onde lutou muitas guerras emocionais, psicológicas, profissionais, dentro e fora do país, sendo obrigado a ter vários lares e tendo feito de todos eles, moradas do coração . Inclusive a guerra pela própria vida quando o enfisema se posicionou e que bravamente e com senso de humor enfrentou. Aliás não poderia deixar de destacar seu senso de humor! Uma inteligência brilhante que tornava leve as situações mais pesadas e das mais banais, momentos especiais. Com a sua vocação aprendi o senso de responsabilidade, disciplina e justiça.

O segundo amor ao qual devotou sua vida à sua esposa..amor que daria inveja a Shakespeare e a qualquer poeta... E me permitindo apenas um adendo, sempre admirei sua sensibilidade artística, seu gosto infinito por músicas, fotos,..mas retomando à sua paixão infinita... O que dizer de um amor de 68 anos juntos? Que todos os dias cantava para que a manhã fosse boa e todo dia dizia e demonstrava o valor desse sentimento... Sejam em palavras ( que embora contrariando que o Sr. Julgava não escrever tão bem, era um verdadeiro poeta), mas especialmente em atitudes.. Com surpresas diárias e inesperadas. Nunca esquecerei todos os instantes das mãos dadas com ela por mim admirado... Um amor que nunca precisou do símbolo de uma aliança, ja que a união era presente em todos os instantes. Com a sua devoção, aprendi não apenas o amor por uma mulher, mas a dedicação, concessão e esforço diário que é preciso na sustentação infinita do que se sente. Uma vez disseram: "que seja eterno enquanto dure", e o Sr provou que quando se quer, se dura para sempre.

O seu terceiro amor é o que mais me sinto parte... O amor a família e aos amigos, sendo que nunca distinguiu um dos outros... Era amigo de sua família e tratava seus amigos como uma família..o amor infinito e presente pelos seus filhos, não apenas os dois de sangue, os quais estava presente sempre, mas com aqueles de alma como eu. É meu amigo, ... você sempre foi conselheiro, atencioso, dedicado e bastante paciente, mesmo dentro da sua eventual impaciência...seus instantes de seriedade eram muito breves perto do sorriso, quase sempre presente...aliás um aperto de mão romano e no nosso latim e russo inventado e improvisado! Saudatibus! E espero que não me deixe sozinho nos comentários às tentativas de seriedade das novelas e das comédias da política...

O seu quarto amor à Abaíba-MG a qual atribuo também a sua natureza de fé e espiritual... Nos instantes meditativos da pescaria, nos quais algumas vezes, tomou consciência de ser muito mais que um corpo... De fato, sempre foi...sua presença sempre chegou antes mesmo do corpo! Devo confessar que algumas vezes em silêncio acompanhei suas preces diárias e noturnas que nunca esqueciam ninguém, nem os presentes, muito menos os ausentes.

Abaíba também era um símbolo de sua simplicidade... Que nunca precisou se valer dos títulos de General de 4 estrelas e ex ministro do exercito para transmitir a sua elevada condição.

O Sr também me fez perceber que a alma é atemporal... Nunca me senti diferente ou desigual pelos meus anos a menos... Sempre atualizado, contextualizado e disposto a um bom diálogo! Idade é um estado de espirito.. Sempre foi mais jovial do que eu mesmo. Aliás um brinde a você, na mesma mesa, que sempre nos reunimos. Mesmo sendo tímido, hoje lhe roubei a palavra para lhe homenagear e o que representa para mim.

Agora meu ultimo cumprimento, já um tanto extensivo, uma rajada de perdigotos...afinal sempre preocupado que pudesse transmitir algo, me lançava brincando os vírus imaginários (uma das tantas palavras que lhe rendeu uma camisa com os dizeres que não gostava) como um gesto de carinho, mesmo em um momento que para você era tão difícil, mas sempre os tornando leves para nós.

Não sei se reparou, meu amigo, mas não usei passado para falar de nossa amizade. Porque acho realmente que só existe ausência no esquecimento..

E o Sr. segue presente e vivo dentro de mim e de cada um, que tem a imensa honra de amar você!

Fernando Paz
Enviado por Fernando Paz em 18/08/2015
Código do texto: T5350072
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