Os Filhos de José Dilton

Caros colegas do recanto, a pedidos gentis de muitos de vocês, estou tentando escrever pelo menos um texto por mês. Muito obrigada pelo reconhecimento. Para o “escritor” não tem sentido escrever para não ser lido. Todo ser humano precisa de reconhecimento e apreço em todas as áreas da vida.

Mesmo assim, eu particularmente, escrevo para o meu próprio deleite, escrevo para me conhecer, para me fortalecer, para me divertir e homenagear quem eu amo. Mas é certo que me sinto feliz com a leitura e comentário de colegas tão gentis. Os comentários enriquecem minha alegria em escrever. É bom saber que há pessoas que também gostam de escrever e ler, assim como eu. Vocês são uma espécie de família ou clube que tenho alegria de participar, de pertencer.

Hoje escrevo para os filhos de meu irmão mais velho, José Dilton, que o considero inteligente, forte, decidido e por isso tenho aprendido muito com ele. Ultimamente estamos muito ligados apesar de estarmos longe um do outro. Falamo-nos uma vez por semana e nossas conversas são sempre em torno da espiritualidade, fé, desafios vencidos, coragem.

A família é a maior escola que podemos ter. É no seio dela que aprendemos, convivemos, entendemos e ficamos fortes, capazes. Minha família sempre foi meu porto seguro. Hoje quero que Maria Adélia tenha a mesma segurança quando tive no convívio com meus oito irmãos. Sempre considerei todos inteligentes, capazes, habilidosos, capacitados e sempre quis ser igual a eles.

No auge da minha adolescência nasceram os filhos de José Dilton. Sua primogênita, Hérida, linda, meiga e quase nunca ouvíamos seu choro. Parecia mesmo uma coisinha frágil. Recebeu o apelido de passarinho. Cuidei dela por algum tempo antes de ensaiar os primeiro passos.

Lembro-me de um vestidinho vermelho que ela tinha. Gostava de arrumá-la como se fosse uma de minhas bonecas: dava banho, vestia o famoso vestido vermelho acompanhado de sapato e chapéu combinando. E assim, eu saia desfilando orgulhosa pelas ruas de Aguada Nova exibindo o bebê mais lindo que eu já tinha visto: cabelos claros e encaracolados, olhos grandes, incrivelmente brilhantes e o sorriso mais lindo do mundo. Até hoje, aquele sorriso só empatou com o sorriso de Uener, um outro sobrinho homenageado em "Os filhos de Ti Dona."

Na casa de minha mãe havia uma pilastra que separava a sala da cozinha. Com sua andadeira, por um minuto de descuido meu, Hérida caiu e quebrou um dentinho. Chorei muito. Cultivei por muito tempo um sentimento de culpa. Não foi uma emoção agradável para uma menina de 12 anos.

O sentimento foi arrefecendo com um dos melhores curadores de feridas: o tempo. Mais tarde ela teve que usar aparelho, e graças a Deus, o seu sorriso continua lindo.

O segundo filho de José Dilton, Hebert, ou simplesmente Pinho, Bertinho sempre soubemos que seria muito ativo, independente, decidido,cheio de atitudes e inteligente. Sua forma de se expressar sempre nos causavam risos e admiração.

Quando recebeu uma rural de flandre de presente bem colorida enrolada no papel colorido, passado algum tempo, depois de desenrolá-la e brincar o dia inteiro, perguntou por onde andava a casca de seu carro.

Um dia desapareceu e não teve lugar em Aguada Nova que não procurássemos. Aguada Nova foi toda mobilizada. O nosso principal medo: o garotinho ter fugido e caído numa lagoa chamada Criminoso. Todos se dirigiram para lá. Minha mãe, coitada, colocava as mãos na cabeça e gritava:

____Meu Deus, onde está o meu netinho? Sagrado Coração de Jesus, ache meu menino.

Depois de muito alvoroço encontramos Hebert dormindo debaixo do pé de goiaba depois de muito brincar com sua rural. O incrível é que todos passávamos pelo pé de fruta inúmeras vezes, mas ninguém viu o menino.

MISTÈRIO!!!!!

Das suas inumeráveis “traquinezas”, a insistência em subir nos pés de figo e goiaba deixavam-nos aflitos, principalmente minha mãe. Era uma labuta de louco vigiar Bertinho todo o dia. O jeito era disponibilizar todos os tipos de entretenimento para ele esquecer do quintal. Quando meu irmão, Claudionor, estava por perto descansávamos um pouco. Os dois brincavam, cantavam, gritavam e deixavam a gente surda.

Claudionor começava:

___E a tiete gritou:

Bertinho respondia:

___Xiquetes com manana!

Enquanto durava essa sinfonia, era só alegria.

Na semana santa, no sábado de aleluia, os caretas saiam às ruas. Foi a única situação em que vi Bertinho com medo, procurando um lugar para se esconder.

___Tia, não quero ver os caretas. São feios. Vão me carregar.

Depois veio a minha flor morena, Thabata, a caçula. Tem um texto no recanto exclusivamente para ela: “Minha Cinderela”. Estranhava todos, não queria colo de ninguém, chorava o tempo todo querendo apenas a mãe e o pai. Mesmo assim, ficou um tempo comigo. Convivi de perto com suas peripécias vocabulares. Encontrava resposta para tudo. Super argumentativa. Corrigia a cozinha: os temperos teriam que ter uma colherinha em cada pote.

___Fica mais prático, tia. Você vai ganhar tempo. Daqui que abre a gaveta e pega a colher, já perdeu uns minutinhos.

E quando ficava doente?

___Quero remédio que tá doendo, tia.

Ao contrário de seus irmãos sempre foi a mais magrinha, talvez por isso eu tinha pena de pegá-la no colo. O banho quando bebê, nunca me atrevi. E se eu a machucasse?

Mas a danada era carismática, passeava pela casa com seu charme de manequim acompanhada de sua cobertinha arrastando-a e não tinha quem tirasse sua companheira inseparável.

Na adolescência descobrimos muitas coisas em comum e até hoje, quando nos encontramos “é assunto pra mais de metro”. Na verdade, Thábata é minha melhor amiga. Minha confidente, minha conselheira, minha incentivadora, meu porto seguro. Alguém que tenho uma admiração muito grande por estar vencendo seus limites e desafios.

Na verdade os três eram terríveis e tínhamos que estar de olho o tempo todo. Quando estavam mais crescidos passaram um aperto merecido. Em Aguada Nova havia uma senhora não muito equilibrada das ideias. A garotada a chamava de Cobra Preta, o que a deixava furiosa. Não é que meus pimpolhos resolveram mexer com a coitadinha. Eu só soube depois que o reboliço tinha passado. A careira foi tão grande que cada um entrou em uma casa diferente sem conhecer ninguém. Depois voltaram para casa da vó com as carinhas mais inocentes do mundo. Coisas de criança!! Aposto que eles tem saudades dessa época maravilhosa, onde nada era perigoso por aqui.

Hoje estão crescidos. Ganharam o mundo. São independentes. Cuidam de suas vidas. Raramente vejo Hérida e Hébert. Thábata tenho mais contato, pois me acolheu durante todo o ano de 2014 em sua casa para estudos.

Os três moram longe, raramente nos encontramos no coletivo, mas as lembranças não morrem jamais e a saudade é sempre presente.

Sorte, saúde e felicidade para vocês. Beijos de tia Neide.