Antonio e eu

A Historia que escrevi é verídica e incrivelmente cômica,

Durante os quinze meses em que trabalhei no Grupo Votorantim onde pensaram eu ser da família Ermírio de Moraes e sendo super bem tratado e depois ao verem que que eu não era, tudo mudou.

Antônio Ermínio de Moraes e eu

CAPITULO I

Antônio e eu trabalhamos juntos na mesma empresa, ele como patrão e eu como empregado, não recebia ordens diretamente dele, alias entre nós havia um enorme precipício, ele no mais alto posto, eu no mais baixo ponto.

hoje Antônio se foi e eu senti muito, passei a admirá-lo desde o primeiro dia que soube quem ele era.

O ano era 1978, eu acabara de perder o emprego de quase quatro anos na empresa Estratégias Empresariais a qual trabalhei desde sua fundação e naquele momento se mostrava uma grande empresa e eu já não mais útil a ela.

Após vinte dias, sentindo se dentro de umas devidas férias, comecei a ser cobrado pelo meu pai para levantar cedo para procurar emprego, eram todos os dias a mesma cobrança, como eu detestava aquilo e como foi maravilhoso, (aposentei cedo), obrigado Nicandido, meu querido pai.

Sabia que tinha que tomar uma direção e voltar a trabalhar, mas começar por onde, pois até então nos dois empregos que trabalhei, ele quem me colocou nos dois empregos em que estive, por ser fiscal na prefeitura de são Paulo, tinha grande conhecimento dos comerciantes, mas eu já com meus dezoito anos, creio eu que nos pensamentos dele, eu é quem deveria tomar todas as iniciativas, mas... como?

Até que um certo dia minha mãe entrou em contato com minha irmã Vardiria e pediu a ela que o Reinaldo, seu marido conversasse comigo e num domingo a noite ele me ligou e pediu que eu fosse no dia seguinte logo de manhã em sua casa, pois havia separado uns recortes do jornal de emprego para mim.

Sete horas da manhã lá estava eu na casa de minha irmã, o Reinaldo me levou para cozinha com os recortes e começou a dar as instruções de como eu deveria agir quando chegasse nas empresas, se não me engano eram uns sete recortes, mas quando comecei a lê-los fiquei totalmente apavorado, pois todos eram de altos cargos, como exemplo... supervisor, três anos de experiência, chefe de sessão, dois anos de experiência, e assim por diante, ai comentei com ele...

-Reinaldo, só trabalhei de office boy, não tenho experiência de nada disso

-Tarso, você vai fazer o seguinte... vá com esses recortes de emprego e mostre na portarias das devidas empresas e diga apenas que esta lá a respeito do anuncio de emprego do jornal e não será barrado, será encaminhado ao recurso humano, chegando lá ai sim, você terá que explicar a sua divergência profissional com o anuncio pedir um emprego que esteja a seu nível, não adianta este pedido na portaria, ali seria logo barrado.

Entendi plenamente seu recado, em seguida me levou para seu quarto me apresentando quem me acompanharia nessa jornada, isso mesmo, terno e gravata, nunca havia colocado um, na época ele era magro, já eu, bem mais que ele, mas oque fazer, coloquei-o e sai para esta minha jornada

Lembro me que em todas as empresas que fui deu tudo certo até chegar no recurso humanos, mas quando o funcionário via o anuncio do jornal e a minha carteira que não condizia com nada, eles me punham para correr, era até cômico para eles, para mim... humilhante, mas nos meus dezoito anos dentro da minha imaturidade eu simplesmente virava as costas e sai como se nada tivesse acontecido.

Mas quando cheguei na empresa do Antônio, o trato foi diferente... Mostrei o anuncio do jornal na portaria onde fui encaminhado para o primeiro andar, recurso humano, chegando lá, veio uma funcionaria me atender e disse a ela que estava lá pelo anuncio do jornal, ela olhou para mim, pensou, pensou e perguntou....

-Quantos anos você tem?

-dezoito

-mas foi eu quem colocou os anúncios no jornal e não me lembro de alguém com sua idade, sem experiência?

-deixa eu dar uma olhadinha no seu anuncio

E ela leu... Supervisor de vendas com experiência de três anos

- posso ver sua carteira de trabalho?

-sim, aqui esta

-você só tem experiência em office boy e não é oque esta no anuncio do jornal

- olha... me desculpe, eu apenas queria pedir um emprego e sei que não adiantaria pedir lá na portaria

Ela olhou fixamente para mim, silencio se e depois de alguns segundos deu um longo sorriso e disse...

- adorei sua tática, adorei mesmo, olha... Só por causa disso vou verificar se há algo, nossa empresa é tão grande, quem sabe arrumo alguma coisa para você nem que seja em outra empresa do grupo,

( nesta época o grupo Votorantim era a maior empresa brasileira e eu naquele momento estava em sua sede ou seja... Na matriz)

Depois de uma hora sentado ela retornou toda alegre

-arrumei uma coisa para você e aqui mesmo em nosso prédio (ela falava comigo como se fossemos amigos de muitos anos e o meu contato com ela foram só aquelas horas nos quinze meses que ali trabalhei.

-você vai ao subsolo em frente ao restaurante fica o arquivo, procure o Sr Domingos, ele é o encarregado, entregue esta carta a ele, que o entrevistará e boa sorte!

- para ela também dei um longo sorriso de agradecimento e felicidade e fui para o subsolo

Assim que entrei me direcionei a primeira mesa e perguntei ao rapaz que nela estava pelo Sr. Domingos ( este rapaz veio a ser meu melhor amigo enquanto estive lá)

- seu Domingos sai mas deve voltar logo, sente se enquanto ele não chega.

Passado uns vinte minutos ele chegou, um senhor com uma enorme estatura, bem acima do peso, estilo alemão

O rapaz ( Mario Sérgio), foi até ele e disse sobre a minha presença e ele me chamou

- Pois não, em que posso ajudar?

-estou vindo do recurso humano e pediram para entregar esta carta ao senhor e aguardar por sua entrevista...

CAPITULO II

Ele olhou fixamente por alguns segundos e me disse...

-deve estar havendo algum engano, não pedi nenhum funcionário.

Pegou o telefone e conversou com alguém, disse oque estava acontecendo, mas por um bom tempo ficou calado, apenas ouvindo, desligou o telefone e começou uma longa entrevista comigo, suas perguntas e minhas respostas, mas num determinado momento percebi vir dele um leve sorriso com um negativa no balançar de sua cabeça, isso aconteceu quando ele perguntou onde eu havia nascido e eu lhe disse... Sorocaba.

Terminando a entrevista nos despedimos com comprimentos de mãos e pediu que eu aguardasse uma ligação telefônica.

Passado uma semana, veio o telefone da Votorantim, pedindo que eu comparecesse na próxima segunda feira com todos os documentos e assim aconteceu.

Detalhar o inicio é impossível pois não os tenho na memoria, mas fatos que ocorreram durante o tempo em que estive lá por algum tempo me fez levar a crer que oque acontecia comigo não passava de um enorme engano e eu mesmo só vim a perceber isso pelas coisas que aconteciam comigo .

Após um mês de trabalho, já havia me enturmado com boa parte do pessoal que ali estavam, eu, fui registrado como arquivista, sem nenhuma experiência, mas aquele rapaz que primeiramente me recebeu, o Mario Sergio, me ensinou todo o serviço nos mínimos detalhes, nossa equipe se resumia a trinta e poucos funcionários até o dia que veio a seguinte noticia, o Sr Domingos reuniu toda a equipe e disse que a partir de amanhã, seriamos transferidos para outra empresa do grupo Votorantim, trabalhávamos na S.A.I.V., que era a sigla das S.A. industrias Votorantim e passaríamos para a Siderúrgica Barra mansa, mas em cima dessa noticia, viria o pior, alguns dos funcionários não seguiriam na nova empresa e só no dia seguinte o setor de recursos humano é quem nos informariam.

Lembro muito bem deste dia, fui arrasado para casa, acho que cheguei até a chorar dentro do ônibus, pois estava adorando aquilo tudo, era um pessoal super divertido, e outra, desde que comecei a trabalhar quando tinha treze anos, nunca havia trabalhado em um serviço interno.

No dia seguinte lá estava eu indo diretamente para o recurso humano com todos meus colegas, um mais pálido que o outro, já eu um pálido pálido impalidado, eu seria o primeiro a ser mandado embora pois acabara de entrar e não teria motivos para me segurarem, foi sendo chamado um por um para uma sala que tinha outra saída, então... nem sabíamos oque acontecera naquele momento, apenas aguardávamos ser chamado, mas uma coisa comecei a aprender naquele momento, por pior que seja oque esteja acontecendo, estando em turma, tudo vira piada, lembro de que dávamos muito risadas, lembro me de um virar para mim e dizer...

-É menino... Acabou de chegar e nem vai sentir o sabor

Mas uma coisa eu ia percebendo... Eu estava ficando, não era chamado, num certo momento o Mario Sérgio me disse...

-Acho que já chamaram todos os que seriam mandado embora

-como assim?

-O Sr Domingos conversou comigo antes de eu ir embora e disse para eu ficar tranquilo, pois eu continuaria na empresa, primeiramente chamariam os que seriam demitido e depois os que seriam transferido para a nova empresa, só não estou entendendo por que você não foi mandado embora.

Não respondi, fiquei mudo a aquele seu questionamento, deixei o tempo passar ate chegar minha vez, e chegou, um Sr me chamou e lá me informou que eu estava sendo transferido para a Siderúrgica barra Mansa, , entrei dentro de mim e pulei de felicidades, mas ai veio uma coisa super legal..., como fazia um mês que eu estava trabalhando, começou vir valores de todos os lugares possíveis, multa pela rescisão do contrato da empresa comigo, quando eu sai da outra empresa eu era office boy e por ser o primeiro da empresa eu ganhava muito bem, ao entrar na Votorantim vim a ganhar o dobro e com a muita da rescisão da empresa comigo choveu dinheiro em mim e no mesmo dia, saindo daquela sala, voltei para a minha, para a mesma mesa, nada para mim havia mudado em relação ao trabalho, apenas oito funcionários continuaram, vocês podem perguntar, serviço triplicado para cada um? Nada disso, mudaram o sistema de informação sobre os clientes, o que era feito pessoalmente, passou a ser feito pelos correios.

A vida ali continuou para nós, o tempo foi passando Seu Domingos me tratava com todo carinho possível, na mesa atrás da minha sentava o ser Walter, um tremendo gozador de primeira, ele dizia que eu era sobrinho do homem por isso o do Sr Domingos me tratar tão bem, eu mesmo não entendia o que ele queria dizer, todos riam e assim as coisas seguiam.

Passado uns três meses começou a acontecer algo hilário, uma secretária jr começou a ir no cadastro, nosso setor para pegar fichas de empresas, clientes nossas, isso era feito anteriormente por um continuo, achamos maravilhoso aquilo, ela se chamava Vera, uma menina de seus dezoito anos, assim que ela sai, virava o maior rebuliço, todo mundo ali babando, ela de um corpo escultural, olhos verdes, pareciam rubis uma voz de veludo e ao desaparecer lentamente seu fino corpo dançava dentro de nossos olhos, era a única mulher que entrava em nosso setor, alias a mais linda de todo o prédio.

Um detalhe importante que tenho de frisar, este Mario Sergio que disse no começo da historia e que primeiramente me recebeu, sentava na mesa a minha frente, ficamos muitos amigos, almoçávamos todos os dias juntos, o restaurante era em frente a nossa sala, no subsolo, após o almoço todos os dias fazíamos a mesma coisa, era como se fosse um ritual, tínhamos uma hora e meia de almoço, amocávamos em meia hora e depois íamos paquerar, o centro de São Paulo em 1978 era maravilhoso, não existiam os shoppings e tirando o jardins na paulista, ali estavam as mais belas, saiamos e passava pela praça ramos, atravessávamos o viaduto do chá , pegávamos a rua direita e sentávamos nuns banquinhos em frente a um local onde se vendia churros, churros era uma modinha nesta época, como se fosse hoje esses sorvetes do McDonald’s, faziam fila, umas mais belas do que as outras, e ali viajávamos, Ah! O detalhe importante... Homem não gosta de falar sobre outro homem, homem para homem é tudo feio, mas aquele danado do Mario Sergio era um galã de cinema, filha da mãe, andando pelas ruas todas as mulheres olhavam para ele, eu rs, nem existia para os olhares delas, tinha mulher que até cutucava a outra ao lado para mostrar ele e eu rapidamente mostrava a ele dizendo...

-Mario Sergio olha que deliciosa e ela esta pagando pau para você

Ele apenas sorria e nada dizia, era assim direto, eu tinha vontade de dar uma surra nele, homossexual ele não era, pois era nítido como ele também admirava as mulheres, simplesmente ele nunca correspondia a um flertar .

Bom... voltando a falar da Vera, aquela loira que ia em nosso setor, comecei a perceber que ela e outra secretaria no restaurante sempre sentava próximo a nós, o restaurante era enorme, mas todos os dias lá estavam elas em algum lugar onde podiam nos ver, ou seja, um lugar onde a Vera pudesse ver o Mário.

De um certo dia em diante a Vera não veio mais em nosso setor, ficamos todos tristes, mas o Walter nunca deixava de reclamar com o continuo

-O menino, não me aparece mais aqui, deixa que a Vera venha

o menino sempre ria mas não dizia nada, até um certo dia que não se aguentou e respondeu ao Sr. Walter

-Ela só vinha aqui para ver uma pessoa.

CAPÍTULO III

- E quem é o felizardo?

-um tal de Paulo

Em nosso setor er eu e um outro Paulo, de bate pronto o sr Walter disparou a rir e dizendo...

- eu não acredito que ela vem aqui para ver um desses dois, alias os mais feios do nosso setor

Mas de repente o Mario Sérgio que sentava em minha frente se virou para mim dando risada e disse

- Como é bobinho, a mina paga o maior pau pra você a tempos e você nada.

A ironia para cima de mim foi inacreditável, pois eu sempre tirava sarro dele das meninas que paqueravam sem ser correspondidas, acho que umas mil, mas aquele comentário dele, descontou por todas, e eu o tempo todo achando que lá no restaurante ela sempre sentava próximo a nós por causa dele, puxa vida! Custava ele dizer que era para mim.

Deste dia em diante as coisas mudaram e eu comecei a olhar para ela e realmente observei que seus olhos eram para mim, a cada dia trocávamos mais olhares, a cada dia vieram as trocas de sorrisos, mas ao sairmos do restaurante, tudo acabava, eu ver as mulheres comerem churros com o Mario Sérgio e ela ia com a Sheila (lembrei o nome da secretaria) para outro lado qualquer.

Nesta época todas as sextas feiras meu primo Pinho, passava na porta da Votorantim as 17 horas e íamos para Atibaia, lá meu tio tinha um motel e ele quem gerenciava, ele éramos muito amigos e confidentes um ao outro, ele sabia da existência da Vera e assim que eu entrava em seu corcel, a primeira pergunta que vinha era...

-e ai, chegou na mina

-não

Na semana seguinte

-chegou na mina?

Ainda não

Na outra...

Chegou?

Só balancei a cabeça negativamente e ele...

- PUTAQUEOPARIL, quando vc vai chegar nessa mina?

Era inacreditável o que acontecia, no restaurante as nossas trocas de olhares eram beijos, ela declarava o desejo por mim, mas eu não acreditava que aquilo estava acontecendo, ela era linda de mais, nunca alguém com tamanha beleza me presenteava com tantos olhares, mas saindo do restaurante eu não consegui tomar nenhuma atitude para me aproximar, até que um certo dia o telefone tocou

O Sr Walter quem atendeu

Paulo, telefone

Peguei o e...

- Alo!

- Se eu não ligo você não ligaria mesmo

-Quem esta falando?

-A Vera, aqui da diretoria

Por segundos fiquei mudo, e quando voltei a falar... não falei, gaguejei

-O o o oi, tu tudo bom

Ela começou a rir, não acreditando da minha reação

-Você é um tremendo tagarela lá no restaurante e no telefone um tremendo gago, kkkk

Detalhar o que veio a acontecer entre nó, não tem como, me fugiu da memoria, mas lembro perfeitamente que após aquele telefonema eu e a Vera começamos a almoçar juntos, ao sair do serviço íamos ao cinema, além do filme tinham beijos, mas não me lembro de termos nos encontrado em algum final de semana, de andarmos de mãos juntos, lembro apenas de um dia estarmos sentado em uma praça no centro de são Paulo, não lembro qual, mas ela me disse da sua vontade em casar logo e já eu o da minha, de não casar tão já, e em seguida seu ar de tristeza.

Assim que entrei na Votorantim, via ela todos os dias com um homem e deduzia ser seu namorado, depois ao conhecê-la, me contou que estavam noivos e que haviam terminado

Acho que por dois meses almoçamos, caminhamos e nos beijamos e não me recordo de como tudo acabou, lembro apenas de não ter sofrido, por mais bela que ela fosse... não era a hora, não era ela, dias depois sei que ela voltou com seu noivo, pois como no inicio, todos os dias eles estavam juntos na porta da empresa juntinho, essa parte em relação a Vera se encerrou enquanto estive na Votorantim

Duas coisas que marcaram muito enquanto estive lá foi o fato de que nunca tive sorte com prêmios e rifas, mas lá por duas vezes fui premiado, na primeira foi na festa de final de ano onde fui sorteado em segundo lugar com uma sexta de natal, mas não era coisinha simples, todos na empresa ganharam uma, mas aquela dava de dez e o segundo premio que ganhei, ah! Esse foi cômico, o Mario Sérgio estava vendendo uma rifa de cem números de uma câmera Kodak aquelas que vinha numa caixa transparente com flash e filme, ele estava a meses tentando vender e todos os dias os que já haviam comprado os cobrava de quando abriria a rifa, e ele pedia para o pessoal ficar calmos, todos já estavam para pular no pescoço dele , e ele... nem ai, imagine um cara pacato, enrolador, então ele era esse cara, mas eu já não aguentava mais ver aquilo tudo, até que um dia disse a ele

-Quantos números faltam para você abrir a rifa?

Ele não estava com ela , mas disse

-uns trinta números

-eu compro tudo e você abre logo esta rifa

O cara ficou feliz da vida em ouvir aquilo, paguei ele na hora e esperei o dia seguinte ele trazer a rifa para ser aberta, o dia seguinte chegou mas sem rifa, o outro dia também, e sem a rifa, os dias foram passando e me juntei a aqueles que queriam pular seu pescoço, e olha que aqueles haviam comprado só um numero, bom... no ultimo dia de trabalho na empresa depois de cinco meses da compra da rifa quando fomos nos despedir, ele abriu sua gaveta pegou um pacote e me entregou e disse

-Você ganhou a rifa

Abri o pacote e lá estava a maquina, já usada, riscada, sem os flash e filmes, minha cabeça naquela hora estava se despedindo de todo aquele ar e não tive nem como brigar com ele, simplesmente peguei a máquina e sai.

Voltando a três meses antes de sair da empresa, recebemos uma péssima noticia, assim como aconteceu quando entrei, as transferência de empresa, iria acontecer tudo novamente e seriamos transferidos para a atlas S.A., outra empresa do grupo, só que desta vez, sairíamos do prédio em que estávamos e iriamos para um outro localizado na Vila Leopoldina, totalmente longe de casa, assim que recebi essa noticia comecei com uma nova postura a de deixar os cabelos crescerem, quem sabe assim eu seria mandado embora e não precisaria ir para lá.

CAPITULO FINAL

Quando digo... deixar os cabelos crescerem, volto na semana anterior ao primeiro dia de trabalho na Votorantim, na quarta feira após conversar com meu cunhado o Reinaldo, umas das coisas que me pediu foi a de eu cortar os cabelos, estavam bem compridos e isso mexeu muito comigo, eu adorava eles e a mudança foi radical, cortei bem baixinho como me pediu, neste mesmo ano aconteceu algo em minha vida que me tirou os pés do chão, fiquei sabendo que era adotivo e até então não havia desconfiado de nada, não detalharei este momento que passei, digo apenas que foi tudo muito estranho, mas passado algum tempo, percebi que foi maravilhoso, pois eu tive a honra de ser presenteado por duas famílias, aquela que me recebeu de braços abertos e me educou maravilhosamente e esta nova, a minha biológica a qual me aproximei rapidamente e assim como a outra coloquei também em meu coração, mas durante um certo tempo aconteceu algo que nunca esqueço, constantemente comecei a sonhar onde eu me via com os cabelos como antes, compridos e em todas as vezes ao acordar destes sonhos eu sofria muito, pois para mim nunca mais eu voltaria a ter cabelos compridos e isso baseado na minha nova família, a biológica, sei apenas que o tempo passou e sempre me monitorei aguardando as quedas dos meus fios, coisa que acabou não acontecendo.

Voltando aos três meses antes de sair da empresa, aqueles que achavam eu ser da família dos Ermírio de Moraes acabaram com suas duvidas, pois viram que nada vinha de cima para me beneficiar, (se ele fosse mesmo, não estaria aqui entre nós e sim num cargo bem mais alto), então o fato de eu ser de Sorocaba, cidade vizinha a Votorantim e a forma como eu havia entrado criando se uma vaga exclusiva e de também não ter sido mandado embora no mês seguinte quando muitos foram, fizeram eles acreditar que não passara de uma simples coincidência e assim os comentários que antes em tom de piadas deixaram de me favorecer, mas deixo bem claro que nunca tirei proveito desta situação, pois sabia do perigo que era revertendo todo um panorama, eu apenas não negava, apenas sorria.

O Sr Domingos era um bom chefe, muito profissional, sua fisionomia era a de um alemão alto, bem acima do peso, a pele bem branca e seu rosto parecia com a de um buldogue, só que nas sextas feira após o almoço, seu rosto mudava de cor, do branco para o rosado, isso só acontecia por causa do álcool, seu profissionalismo nas sextas a tarde ia por agua a baixo, ele entrava em nossa sala lentamente se segurando nos moveis após sete passos parava... Dava um leve sorriso, olhava para todos nós, e todos nós para ele, seu próximo passo era a esquerda e assim sumia por de traz de uma enorme coluna onde ficava sua mesa, neste momento olhávamos um para o outro e sem nenhum barulho caiamos numa silenciosa gargalhada, esperávamos uma meia hora e sempre um de nós disfarçava ir ao banheiro para vê-lo, ou confirmar se já estava dormindo, e ele era expert nisso, ficava em uma posição imóvel com a cabeça a trinta centímetros da mesa como se estivesse lendo algo e nunca ninguém o pegou, isso era um ritual, não falhava em nenhuma sexta.

Meus cabelos começaram a dar o ar da graça, já o Sr Domingos não viu nisso nenhuma graça e ai um mês e meio antes de mudarmos para a vila Leopoldina, numa sexta feira após sua chegada vespertina logo ao virar a esquerda e sumir dos nossos olhos, me chamou pausadamente

-Paulo... Paulo... o Paulo

Levantei e fui a ele

-sente se Paulo, Paulo você precisa cortar este cabelo, esta um pouco comprido

-ah! Vou cortar sim Sr Domingos

-ok ok

Levantei e voltei para minha mesa para trabalhar e aguardar a hora de ir embora

Na sexta feira seguinte aconteceu novamente, sete passos, um olhar a nós, o leve sorriso, o mesmo ritual, mas agora me chamando novamente

Paulo... Paulo... o Paulo

Levantei e novamente fui a ele, mas desta vez ele nem pediu que eu sentasse, apenas apontou com a mão a cadeira e isso sempre com seu leve sorriso de buldogue

-Paulo... o cabelo?

-Ah! Sr Domingos, vou cortar vou cortar

- Ok, Paulo, pode voltar para sua mesa

Voltei para a mesa e continuei trabalhando

Uma coisa muito interessante no Sr. Domingos, era a educação e suavidade com qual conversava com as pessoas, e mesmo ali naquela situação comigo, não era diferente, em momento algum até aquele momento eu nunca tinha visto ele levantar a voz com alguém, conversar com ele era como ver uma pena cair ao chão, parecia tudo de muita paz.

e assim foi por varias sextas feira, mas o mais engraçado que veio a acontecer foi a interatividade de meus colegas comigo, sempre que chegava a sexta feira já na parte da manhã, sem que o Sr. Domingos percebesse, todos passavam por mim e diziam...

-É hoje que o bicho vai pegar

-O homem hoje esta com fome de você

-Hoje ele rola com você no chão

Eram vários comentários todos no mesmo estilo, mas o mais engraçado de todos era o que o Mario Sergio fazia todas as sextas assim que o Sr Domingos sumia por de traz da coluna, ele olhava para mim e começava a fazer uma contagem regressiva até eu ser chamado e não errava nunca, cinco, quatro, três, dois, um

-Paulo... Paulo... O Paulo

Eu Levantava e ia a ele, mas depois de um certo tempo, comecei a dizer o seguinte...

-Sr Domingos, não cortei o cabelo ainda por que quem corta meu cabelo é minha irmã e ela está viajando

-Ok Paulo

Na semana seguinte... cinco, quatro, três, dois, um

-Paulo... o Paulo... Paulo Paulo

-Paulo me diz uma coisa... e sua irmã, ainda não voltou de viajem?

-ainda não Sr Domingos

-ok Paulo

Era um ritual nosso, todos os outros dias da semana tanto ele como os outros não tocavam no assunto, isso só acontecia nas sextas feira a tarde e nunca ele alterava a voz, até que chegou a ultima semana que trabalharíamos naquele prédio, segunda feira estaríamos na Vila Leopoldina, meus cabelos já bem longos e a sexta feira chegando e chegou, ele entrou na sala lentamente, sete passos, parou... o mesmo sorriso, o rosto rosado, virou a esquerda e sumiu, segundos depois veio a contagem regressiva... cinco, quatro, três, dois, um e em seguida um silencio, pela primeira vez o Mário Sérgio errara, todos olharam para mim, e um silencio, até que...

-Paulo... Paulo... Paulo

Levantei e fui a ele, sentei em sua frente e veio a pergunta

-Paulo... o cabelo Paulo, e sua irmã que não volta dessa viajem, para onde ela foi viajar Paulo?

-tudo bem suavemente até a hora que respondi a sua pergunta

-Sr. Domingos, ela foi para o Iraque

-SUMA DA MINHA FRENTE, AGORA, AGORA, PEGUE TODAS AS SUAS COISAS E VÁ PARA O RECURSOS HUMANOS E PEÇA SUA CONTA

Levantei e voltei para minha mesa, peguei meus pertences pessoal, subi ao primeiro andar e pedi minha demissão, ao sair do recursos humano, descendo a escadaria veio em minha direção subindo as escadas Antônio Ermírio de Moraes, o presidente da empresa, quase que tropeçamos um ao outro , desviamos, e lembro perfeitamente que eu estava muito triste antes e depois que o vi, até dei um sorriso, em todo tempo que estive lá nunca havia visto ele, pois sempre entrava com seu carro pela garagem e pegava um elevador exclusivo que dava diretamente em sua sala.

Fim.

Algumas observações:

Em nenhum momento menti ao Sr. Domingos quando lhe dizia sobre ser minha irmã que cortava meu cabelo, pois era verdade, ela quem cortava e realmente havia viajado para o Iraque, meu outro cunhado foi trabalhar lá, sem previsão de volta.

Dois meses depois arrumei emprego no banco Bamerindus no setor de arrecadação o SETAR, na rua Aurora, centro de São Paulo, um ano depois mudou se para o bairro do Brás e posteriormente para vila Leopoldina, bem próximo ao prédio da Votorantim onde eu iria trabalhar, ganhando a metade do salário, mas trabalhando meio período, nunca encontrei nenhum colega da Votorantim por lá

Trabalhando no Bamerindus no nono andar da rua Aurora, uns sete meses que eu já estava lá, o porteiro ligou em meu ramal dizendo que havia uma pessoa lá em baixo que queria falar comigo, ao descer me surpreendi com a visita, era a Vera trazendo seu convite de casamento para mim, me disse que estava fazendo aquilo contra a vontade do seu coração, acho que minha imaturidade não soube me explicar os seus sentimentos, pois ela disse aquilo carregado de lágrimas nos olhos, e eu que sempre achei que ela se aproximou de mim por interesse por achar eu ser da família Ermírio de Moraes, me enganara totalmente, parabenizei com um forte abraço, e nunca mais nos vimos.

Desde o primeiro dia em que entrei na Votorantim até domingo passado quando Antônio nos deixou, sempre o acompanhei nos noticiários, quando dentro da empresa e o via na televisão, dizia com orgulho, ( olha meu chefe), depois fora da empresa, quando via algo no jornal sobre ele, lia tudo, sabia que ultimamente já a alguns anos seu escritório era dentro do Hospital beneficência portuguesa, onde ele veio a falecer, no mesmo hospital que minha mãe biológica faleceu, e com lágrimas nos olhos que finalizo esta história que vivenciei.