Lucy

*Em homenagem a uns meninos ingleses

que conheci há pouco tempo, mas já admiro muito.*

Diego acabou suas obrigações e olhou o relógio. Três horas! Eram apenas três horas, e ele já não tinha o que fazer até a hora de dormir. Olhou para a aliança de noivado em seu dedo e lamentou que a gêmea dela estivesse a quilômetros de distância, em outra cidade.

“Cristina...”

Sem Cristina, as horas passavam como um sistema de cinco incógnitas e cinco equações, como um período tortuoso, comprido e cheio de preciosismos, como um interminável e dissonante intermezzo.

Um tédio.

Era em horas como aquela que ele sentia saudades de estar com ela, conversar com ela, tocá-la, aborrecê-la, fazê-la sorrir... E logo que se lembrava da distância entre os dois, ele via que aquilo era impossível.

Se ao menos tivesse algo para fazer... Mas não tinha.

Tinha apenas a saudade e uma necessidade profunda e imediata de dar e receber afeto. Uma idéia travessa cruzou-lhe a mente, e ele a dispensou. Cristina não iria gostar. Porém, já dizia o grande escritor, idéias são da família das moscas. A idéia voltou e voltou, até que ele cedeu. Só havia um jeito de aliviar aquela saudade, aquele desejo.

“Lucy.”

Sua tentação e sua perdição.

Diego levantou-se da cama e cruzou, cuidadosamente, os longos corredores daquele que acabou se tornando seu lar. Parou diante da porta trancada e, com a habilidade que vem da reincidência, arrombou a fechadura.

Lá estavam elas, trancadas para serem protegidas dos homens que as buscavam, ávidos. “Como se elas não quisessem o que quero tanto quanto eu.” As mais novinhas pareciam ansiosas, mas ele as ignorou. Procurava um leito especial. No mesmo lugar onde, num saudoso passado, já estiveram Julia, Penny, Pepper e Hill, Lucy repousava tranqüila.

A mais velha de todas.

Não podia ouvir, nem falar, mas ele percebia que ela mal podia se conter. Isso aumentou a ansiedade de Diego, que, naquele dia, já estava muito grande. Agarrou o braço de Lucy sem cerimônias e levou-a consigo para o quarto dele, sem dar nenhuma explicação. Ela seguiu-o, dócil.

Quando chegaram ao quarto, ele abraçou-a forte e se atirou na cama com ela. Houve um pequenino som de protesto, e o garoto apressou-se em colocá-la em posição mais confortável. Após um rápido afago, um zíper foi puxado e o vestido preto e justo de Lucy foi atirado displicentemente para o lado.

Agora sim!

Como eram belas aquelas curvas! Como aquela visão o encantava!

Diego começou tocando levemente os cabelos dela. Lucy gemeu melodiosamente. Aquilo fez o corpo todo do garoto tremer de satisfação. Um novo toque e o mesmo som. “Você gosta de me provocar, não gosta? Sabe bem que a Cris não está aqui. Bobo daquele que diz que você não percebe nada...” Sentou Lucy em seu colo e passou a fazer-lhe cócegas leves na barriga. O gemido se tornou ainda mais suave, quase um ronrom. “Sua malandra! Sabe que a Cris tem muito ciúme de você? O que ela diria se nos visse agora? Ou melhor, o que faria? Ela não é do tipo de ladrar muito... Ela morde, Lucy.” Alheia aos pensamentos de Diego, Lucy continuava abandonada a suas carícias, correspondendo com os sons que o garoto tanto adorava.

Com Lucy, o tempo e o espaço pareciam se distorcer aos poucos. A cama e o quarto eram tão grandes quanto o Universo, o tempo fluía em velocidades diferentes para cada momento. Céus de marmelada. Flores de celofane. Táxis de jornal.

Caleidoscópio. Um grande caleidoscópio.

Os minutos com ela logo se converteram em horas, e não foi sem alarme que Diego constatou que já eram seis horas. “Ficamos até tarde hoje! Logo darão por sua falta!” Ainda acariciou-a, deitada em seu colo. Sem pressa, o vestido foi reposto e eles voltaram se arrastando para o quarto de Lucy.

“Cris não vai ficar brava comigo, se descobrir, vai? Sei que vai entender. Faço isso porque a amo. E, sem ela aqui, só passando muito tempo com a Lucy para suportar sua ausência. Lucy não é concorrente da Cris. É sua suplente.”

Deitou Lucy muito suavemente em seu lugar, jurando que ainda encontraria um modo de não permitir que outras mãos, que não as dele, tocassem-na. “Você é minha, Lucy. Sabe disso.” Ele não queria as outras que o esperavam, cheias de desejo de trabalhar. Nem chegavam aos pés da mais velha. Seus nomes não lhe diziam nada. Elas não eram nada para ele.

A porta foi trancada novamente e Diego se afastou. Os pensamentos com a noiva se alternavam com os pensamentos com ela.

Lucy.

Sua companheira de solidão.

O alívio de seus desejos.

Sua eterna amante.

Lucy.

A melhor guitarra do Conservatório.

Strix Van Allen
Enviado por Strix Van Allen em 25/05/2007
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