302 - O ÚLTIMO CAFÉ...

          Mesmo dormindo pouco depois de uma noite muito agitado pela tosse, hoje ele acordou cedo, como de hábito, nesta manhã fria de um inverno itabirano como não se via há muitos anos.
          Lá fora o frio e leve vento soprando brisa suave que balançava os ramos da bougainville arranhando algum metal como um violino sendo afinado para uma música de adeus aumentava ainda mais o desconforto e a sensação de friagem que invadia a casa e penetrava entre os agasalhos e os nossos corpos. Com olhar triste, girou a cabeça olhando à sua volta e pediu a sua Rainha, a amada, amiga e companheira por longas décadas, uma xícara de café sentindo vontade também de comer biscoito ou pão.

          Não tocou no biscoito, tomou apenas um gole de café. Um acesso de tosse sacudiu seu pequeno e debilitado corpo; um clarão de imaginária luz iluminou sua mente e ele percebeu, na derradeira lucidez, que a lembrança dos seus entes queridos apareceu. Estavam como que envoltos em uma névoa e sua cabeça rodopiava como se estivessem todos dançando uma valsa de boas vindas.
          Lembrou-se também dos muitos amigos e tentou puxar mais oxigênio para dar sustentação ao corpo e aclarar a mente. Como quem se despede, empurrou a xícara mais para o centro da mesa, olhou para sua esposa e disse que dela também se despedia. Sabia ser chegado seu momento e ele ia embora sem traumas, sem dor e agradecendo ao Pai por ter-lhe concedido vida longa sempre ao seu lado...
Francisco De Almeida
“Chiquinho Alfaiate”
10/03/1915
03/07/2014
CLAUDIONOR PINHEIRO
Enviado por CLAUDIONOR PINHEIRO em 13/07/2014
Reeditado em 28/11/2017
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