AOS NAMORADOS - II
NA MANHÃ DE 11 DE JUNHO DE 2014
Seguem-se três textos a dizerem, a simbolizarem, a sintetizarem três amores, a evocarem 33 anos de uma vida, que são mais do que esse tempo. O primeiro texto, por exemplo, o poema CIDADES DO CORPO, diz também de um tempo anterior a 1981 (quando foi escrito): remotíssimos tempos de um adolescente coração, de um adolescente ser.
CIDADES DO CORPO
Poema escrito em 1981
E volta a curva do dia
a espantar a superfície estagnada.
No viés das entranhas
brilha uma asa.
Nas cidades do meu corpo
o amor ensaia caminhos.
Teu corpo é uma foz
onde desaguarão minhas águas.
Amor, esse clandestino mutante
que vem do Norte
para contar as viagens
do mar e de suas passagens
pelos olhos de outras mulheres.
Amor que me traz nas asas
o cheiro de outras vertigens
e cresce, árvore de gozo,
na terra fértil do corpo.
A voragem de ser um
Não extingue a viagem das mãos...
esta cama, esta relva
esta palavra este sono
também fazem parte de nós.
O dia nasce, teus olhos
são campos de girassóis russos
tua alma transpira cheiros de Amsterdam.
Tantas cidades em ti
algumas, fundas raízes,
outras quase à flor das águas.
Cidades de outro tempo
emergem suas pontes.
O dia cai tão alto
sobre a nossa nudez
nos ergue
para outra viagem.
POEMA-SAUDADE-NOSTALGIA DOS CORPOS QUE NÃO HOUVE, QUE NÃO SE PUDERAM HAVER.
A UM GUERREIRO A QUEM DEVO, DEVERAS, PEDIR PERDÃO
Texto escrito em 1994, com outro título
A ti, guerreiro, que em tempo imemorial lutou com o dragão para defender a donzela, olho teu rosto, teus olhos, teu corpo, estremecendo no gozo que é teu, na agonia de seres no instante o tudo, que é só teu. O poder que me outorgas neste momento em que tenho teu corpo em minhas mãos, anêmola, estrutura de planta e água... Sabendo disso, faço de mim dedos pianíssimos, asas de borboleta sobre teu instrumento e sinto-te a música feita da mesma substância que teço em ti, substância de água, de brancura, de silêncio, e depois meu olhar velando o teu sono, guerreiro que em dia ancestral lutou com o dragão, para defender a donzela.
REPUBLICAÇÃO
A UM GUERREIRO ALADO
Texto de 1991
Um texto chamado A UM GUERREIRO ALADO foi escrito em fevereiro de 1991. Hoje, em 13 de março de 2011, véspera do Dia da Poesia, se completam 21 anos de uma noite,(março de 1990) da única noite em que eu e o guerreiro alado do título pudemos estar, por um breve tempo, sem a companhia do mundo, sempre à nossa volta. Por causa do "assédio" geral, nunca mais pude nem posso sequer demorar meu olhar sobre o rosto dele, nem ele o próprio olhar sobre o meu rosto. Nunca, nunca mais.
Gostaria de ser ainda capaz de escrever um texto de agora para dizer daquele encontro, mas, a linguagem para isto se tornou impossível. Não sei mais dizer, com alguma palavra nova, do encontro que transformou o tempo dos relógios e inverteu os polos dos mundos de dentro, em inversão que acabou por alterar também os caminhos de fora e os de outros seres. Como achar palavra nova para dizer do encontro que nos transformou para sempre em personagens de nós mesmos?
Eu, personagem para sempre deserta de mim; eu, rainha destronada para sempre; eu, para sempre colombina abdicada de si mesma; eu, musa que há um tempo infinito nada mais tem inspirado senão sombra e dor, eu venho mais uma vez saudar-te, guerreiro alado de todas as saudades, mais uma vez saudar-te com as palavras antigas de mim, as palavras de um texto escrito há 20 anos já a falar, em seu tempo, dos personagens que sempre fomos, que jamais deixamos de ser, estes personagens que a vida, os outros, talvez o Destino e principalmente nós mesmos, jamais nos permitiram deixar de ser, bem como jamais nos permitiram ser.
REPUBLICAÇÃO
Obs. Tudo, tudo, tudo, tudo em minha vida, REPUBLICAÇÃO.
SEJAM FELIZES OS QUE TÊM CHANCE DE SEREM FELIZES. SEJAM FELIZES.