Meu Pai ...
 
Escutei três batidas na janela do quarto e, sobressaltado abri os olhos. Minha mulher dormia o sono dos justos e não dava sinais de ter ouvido qualquer ruído.
Uma chuva fina umedecia o vidro da janela que, mesmo assim, apesar da visão meio turva e embaçada, me deixava distingui-lo na escuridão. Ele vinha, de vez em quando, e, sempre queria conversar comigo sobre uma infinidade de assuntos. Sentia falta do nosso convívio. Perguntava pelas meninas.
Dizia que nada estava completo, porque ele queria ter ficado um pouco mais entre nós e, que não deu tempo de dizer do quanto éramos preciosos para ele.
Na verdade, a gente bem sabia da nossa importância. Afinal, disse-lhe eu, foi assim que haviamos aprendido, guiados pelas suas mãos.
Não havia necessidade de abrir a porta ... ele estava lá, na sala, sentado na poltrona perto da mesinha de centro, tamborilando, como de costume, os dedos no descanso macio. Parecia que, naqueles momentos, o mundo parava, entrava num estado de torpor e, permitia que na forma de um anjo bom ele viesse trazer suas melhores bênçãos.
Comentou-me sobre a vida que eu levava e procurava me acalmar falando de coisas que aconteceram recentemente e sobre os que partiram.
Sabia da viagem que fiz até Portugal e lamentou não estar aqui para compartilhar comigo os segredos de um lugar que amava tanto, sem nunca ter conhecido.
Dizia sempre que eu tomasse cuidado com a saúde mas, que não me importasse tanto com as coisas desse mundo, porque havia conhecido lugares mais interessantes.
Falava da época em que éramos crianças e quanto lamentava não ter tido mais tempo para acompanhar o crescimento de cada um.
Com um fio de lágrima nos olhos, falou-me sobre a nossa irmãzinha que se foi tão precocemente. Na verdade, a tristeza que se lhe abatia era por nossa causa mesmo. Quanto sofrimento ela e nós passamos !!!
O tempo caminhava muito rápido.
Pediu, baixinho, que não comentasse com ninguém sobre suas visitas, porque elas não eram autorizadas. Como de outras vezes, quando percebeu lá fora os primeiros raios de sol, dirigiu-se à saída, disse-me que em breve voltaria e, dando uma irrefutável constatação de que era realmente ele quem estava ali, falou com uma voz irritada, demonstrando inusitada impaciência com alguém que parecia chamá-lo :
“ - Já vou Maria Isabel ...”

Era ele mesmo ...

Deus o abençoe meu querido e amado pai ... saudades.
 
Germano Ribeiro
Enviado por Germano Ribeiro em 05/11/2013
Reeditado em 10/11/2013
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