MINHA MÃE E EU, MINHA MÃE E NÓS – MOMENTOS ESPECIAIS

MINHA MÃE E EU, MINHA MÃE E NÓS – MOMENTOS ESPECIAIS

Deus sempre me deu a oportunidade de estar junto a minha mãe em quase todos os nossos momentos, bons, ótimos, de crise ou de qualquer conjuntura. Ela era muito ‘família’, ou seja, a família era a sua vida. Sempre houve um elo muito forte entre nós; éramos mais do que mãe e filhas, amigas.

Até o início da minha idade adulta, já concluído o curso profissional, via a nossa mãe como a heroína forte, a mulher batalhadora e alegre de sempre, independente das suas dificuldades... A mãe eterna.

Eu não imaginava, sequer de longe, que a minha mãe sempre tão cuidadosa, protetora, zelosa, carinhosa e sensível, que vivia a alegria como alguém que bebe com prazer um tônico da saúde, desenvolvera uma neoplasia que já começava o seu processo destruidor. Meu mundo desabou.

Lutamos todos juntos com as possibilidades disponíveis na época, mas em seis anos a minha mãe viajou para uma nova forma de vida, para um novo estágio mais pertinho de Deus.

No último Dia das Mães, três dias antes da sua partida, recebi do meu marido um buquê de flores vermelhas (Palmas de Santa Rita) e, estando distante da minha mãe, pedi que oferecessem, também, flores lindas a ela por mim. Ela gostou muito.

No dia seguinte ao Dia das Mães - para minha imensa surpresa - as flores das “Palmas de Santa Rita” apresentavam-se amolecidas, aguadas, desintegrando-se, e a tinta da sua cor escorrendo do caule para as pontas das pétalas que pingavam gotas vermelhas no nosso armário branco. Mostrei ao marido e comecei a me angustiar pois a minha sensação era de ver e sentir as gotas como sangue. O fato persistiu com mais intensidade no outro dia pela manhã, com as flores gotejando os pingos da tinta vermelha.

Logo recebemos um telefonema do meu pai e da minha irmã chamando-nos, pedindo-nos que não estranhássemos se não víssemos mais alegria no rosto da nossa mãe. Viajamos imediatamente.

Onde estava aquela minha mãe que me fortaleceu toda a vida? Encontrei-a quase sem conversar, os olhos meio vidrados – olhar de pena, de dor, de tristeza ou Deus sabia o quê – a nos fitar fixamente. Segurava e apertava a minha mão com firmeza e nos falava através do olhar; uma espécie de telepatia nem sempre bem captada. Num esforço maior ela nos disse: “Eu não posso falar o que eu quero”. Depois ficou recostada nos travesseiros e almofadas só a olhar. Passei a noite ao seu lado, com ela muito inquieta e sem dormir. Às vezes clamava: “Oh, Deus! Oh, meu Deus!”

Assim foi até a tarde do novo dia...

Nem a força da sua lucidez constante ajudava seus lábios a articular as palavras que esforçava-se para pronunciar. Na hora da Ave Maria começou o seu processo de viagem... Faltou-lhe ar para respirar ou pulmão para absorver o ar que existia.

Deve ter vindo uma gaivota branca bem bonita, igual à que apareceu a “Fernão Capelo Gaivota” e mostrado à minha mãe que, embora ali ela não pudesse fazer o que desejava, em um lugar mais distante para onde ela a levaria, a minha mãe faria tudo que desejasse e ainda descobriria coisas maiores a serem feitas, sempre com apoio de outras ‘gaivotas’. Ela se sentiu tentada e voou, com a leveza de uma vela que se apaga naturalmente, para um mundo que ainda não conhecemos.

Deixou-nos junto ao seu corpo a rezar e chorar baixinho, sentindo muita dor por não podermos evitar e nem saber se tínhamos ainda condição de evitar o seu voo para esse mundo que desejamos seja de muita paz e amor, em troca de todo amor que ela nos deu.

Deus a protege e eu sei que ela nunca nos abandonará; vai estar conosco, em sua essência espiritual em todos os momentos da nossa vida, até, quem sabe, no mesmo mundo que as gaivotas nos mostrarão um dia.

Amo muito você, minha mãe. Deus recompense a senhora por tudo que fez por mim e por todos nós! Um carinhoso beijo.

Mais de vinte anos se passaram... Minha mãe sabe como tudo isto é verdadeiro.

Dalva da Trindade S. Oliveira

(Dalva Trindade)

24.05.1983/23.08.2013