peneirando meu eu...

Ela precisava escrever sua monografia e estava, como sempre, atrasada. O ano estava terminando e as horas voavam de asas abertas. Em geral, era ligeira no pensar mas, haviam...Os Dias Dela!

Tudo parecia ter a mesma importância! Sua maquininha de equivalências emperrava, de tal modo, que o essencial e o acessório já não tinham qualquer diferença.

procurando seus escritos, abriu a gaveta e diante de um papel de cor azul carbono se deteve...

lembrou, tive um tênis All Star na cor azul carbono, exatamente dessa cor...foi meu até o fim... caminhamos muitos anos, juntos! Eu o levava para todos os lugares ...da faculdade ao aniversário de 80 anos de minha avó, ...para o desespero de minha mãe e gargalhadas de tia Zulmira... rs...

Minha mãe, minha avó e tia Zulmira... como elas eram barulhentas! Todas as tardes, se juntavam, na varanda para bordar e conversar...

minha avó muito vaidosa, pedia que lhe colocassem os brincos de esmeralda para sair à varanda .

Tinham sempre, entre elas, uma mesinha onde apoiavam a cesta de linhas de bordar. Só a elas era dado o direito de mexer naquela cesta...

o que mais me encantava eram as sobras de linhas que iam se misturando, formando um novelo que mudava de cores a cada semana, embrulhado em papel de celofane azul carbono...

acho que, pela cor ...era pra mim um objeto de fascínio e beleza!

não demorou aprendi que, não podia mexer nas linhas eram, proibidas e, sempre me lembravam : "aqui não se toca"

Obedeci, até o dia que descobri, por mim mesma, o encantamento de tocar as coisas proibidas!

Como assim, coisas proibidas... ?

sim..,elas foram, sim... fonte do despertar do meu corpo de menina para o meu corpo de mulher...

nunca teriam sido tão reveladoras se não tivessem dado à elas um estatuto de mistério...sobre o qual, nada podia ser dito.

Hoje, sei... foi justamente esse cuidado silencioso que, me permitiu descobrir, à minha maneira, o meu modo femininamente autêntico de ser...

Vanova