Sonetos, a eterna alvorada de um poeta

Como uma andorinha ou branca pombinha, eis que entra em minha casa a obra Sonetos, de Wagner Ribeiro, ricamente ornada com a capa de autoria de Bené Santana e contracapa de Ivana Ribeiro, sob orientação de Deolando Vieira da Silva. A obra é dividida em três blocos: Piracema e outros sonetos; Sonetos de amor; Navegações; e Ocaso.

Para não continuar o texto com a frieza de uma resenha, devo dizer que chama especial atenção o terceiro bloco de sonetos: Ocaso. Então, Wagner Ribeiro nos diz do ocaso de um poeta. Fiquei pensando. Todos os poetas têm uma especial preocupação com essa penumbra que de algum modo chegará ao físico, mas jamais ao transcendental, jamais ao corpo da obra.

“O poeta entardecia. A voz das coisas/ sussurrava-lhe versos inaudíveis,/na penumbra palavras se esgueiravam/em roupagem de versos fugidios”. E não se haveria de meditar profundamente sobre este início de soneto? E não se haveria de perceber que entardecemos e nos sentimos na pungência desta afirmação sobre o fim da metafórica tarde? E mesmo quem não é poeta ouve, digamos que não propriamente os versos, mas alguns recados que vêm não se sabe de onde. Essas palavras magras se esgueirando esquálidas são uma figura de contundência que aniquila. Posso garantir que vi tais palavras fugidias em pele, ossos e profundos olhos de clamor.

Mas Wagner é um poeta “que da planície fita o cimo”. Dali ele vivifica aquelas palavras quase mortas e as transforma num canto de ensandecer as musas, de atraí-las curiosas, enquanto o poeta canta: “Não declino teu nome no meu verso/nem bosquejo teu rosto no meu traço./Porque seja só meu...nosso universo,/no desenho e no poema te refaço”. Uma cena que eterniza o poeta e de tanta beleza quanto se supõe nos jardins onde habitam as deidades.

Não serei eu a dizer da gramática poética, da rima, do metro, da melodiosidade dos sonetos wagnerianos. Não serei eu a conferir cada item da difícil arte dos sonetos que a poucos se entrega. Mas sou eu a sentir em cada verso o que eles carregam de vida. Sou eu a dizer que, sem os sonetos de Wagner, algo estaria fora dos eixos no Universo do Soneto azul: “Um pedaço de azul. _ De céu? _ Talvez”. Do céu particular e, ao mesmo tempo, geral. O céu dos versos de um poeta refinado, culto e o céu dos comuns mortais.

Tão refinado que, da mesma excelência com a qual lavra as peças em língua portuguesa, as faz cintilar na língua de Verlaine e de Mallarmé. Wagner é o poeta a quem coube dizer em poesia: “Il y a toujours le mot qu’on ne dit pás,”.

Voltando ao tema do ocaso, encontramos o poeta n’O amor no outono rememorando os dias de juventude e glória, os dias do Belo material que amareleceu e caiu como uma etérea folha no chão da poesia.

O Amor é tema da composição wagneriana, pois “Males de amor, quem pode compreendê-los?”. Não um verbo intransitivo, mas um “Intransitivo amor que não se peja/de se fazer tão só... e entremostrar-se”.

Entrega-se à nau do destino o poeta em Fuga. Cultua o silêncio das coisas findas e o “silêncio que apagou/a memória da origem”. Para recuperar a memória do que se perdeu, assim como na Grécia Antiga, de Horácio, as musas escolheram o predestinado Wagner Ribeiro. E ele faz a revelação dos princípios e corta o peito do seu leitor. Tomemos do vate a palavra poética e afirmemos que “A nau dos sonhos lépida desliza/Sobre plácidas águas. A enfunada/Vela recolhe as luzes da alvorada/E de vívidas cores se matiza”.