De Londres para o Céu
Ivan Lessa disse uma vez: De 15 em 15 anos o Brasil se esquece o que aconteceu nos últimos 15 anos.
Não tinham passado nem quinze anos quando Lessa foi se auto-exilar em Londres e muito pouca gente já não sabia quem diabos era Ivan Lessa. A não ser os leitores do Pasquim, claro!
Ele foi, mas não se calou. Continuava falando do Brasil. Do Brasil e do mundo. Ele tinha uma facilidade para começar um assunto na Somália devastada pela guerra civil e terminar lá em Pirapora de Jesus com alguma procissão bizarra.
Mau humorado, ranzinza, rabugento. São adjetivos que vêem a cabeça quando se lê alguns de seus artigos. Esses e aqueles outros: irônico, sábio, brilhante e genial.
Isso porque Lessa era um homem que tinha coragem de dizer o que queria sem muitos rodeios. No dizer sucupirense, ele pulava os entretantos e ia logo para os finalmentes. Detonava tudo o que lhe deixava cabreiro (o que era praticamente quase tudo mesmo).
Mas um assunto lhe enchia os olhos de água: o Rio de Janeiro. Não o Rio de Janeiro atual, com favelas e tráfico. Mas o Rio antigo, aquele que ele conheceu nos anos 50. O Rio de Janeiro dos bares e botecos, da boemia intelectual, do samba, da bossa nova, da alegria.
Era esse Rio de Janeiro tão aconchegante que o aquecia no frio de Londres. Era a lembrança desse Rio utópico, idílico, que o acompanhava por onde fosse. Até mesmo nas letras. Não há como escapar: em seus artigos sempre há uma pitada de carioquismo. Ou seja, aquele misto de informalidade com simpatia - mesmo durante as mais mortais alfinetadas.
Enfim, Ivan Lessa nos abandonou, aliás, ultimamente uma galera muito gente boa tem nos abandonado. Todos artistas de gabarito, que pensaram e repensaram o Brasil enquanto nos divertiam. O problema é que não ganharam nos últimos tempos o reconhecimento que mereciam. Talvez por isso estejam nos abandonando. Para que tomemos noção da sua importância. Tomara que não nos esqueçamos disso daqui a 15 anos...