Mário de Sá Carneiro suas buscas e sua morte trágica...
Ele, se denominava a "Esfinge Gorda", e, carregava um trauma com a sua aparência que o fazia infeliz, e, outro pela perda da mãe aos 2 anos, por isso, a solidão o acompanhava. Vivia o mesmo dilema de Cesário Verde: queria ser poeta e o seu pai o queria nos negócios da família. Pertencia a geração de poetas inquietos por ver Lisboa encapsulada num tempo remoto!
Mário de Sá-Carneiro (Lisboa, 19 de Maio de 1890 — Paris, 26 de Abril de 1916) foi um poeta, contista e ficcionista português, um dos grandes expoentes do Modernismo em Portugal e um dos mais renomados membros da Geração d’Orpheu. Nasceu, no seio de uma abastada família alto-burguesa, sendo filho e neto de militares. Órfão de mãe com apenas dois anos (1892), ficou entregue ao cuidado dos avós, indo viver para a Quinta da Vitória, na freguesia de Camarate, às portas de Lisboa, aí passando grande parte da infância.
Inicia-se na poesia com doze anos, sendo que aos quinze já traduzia Victor Hugo, e com dezesseis, Goethe e Schiller. No liceu teve ainda algumas experiências episódicas como ator, e começa a escrever.
Em 1911, com dezenove anos, vai para Coimbra, onde se matricula na Faculdade de Direito, mas não conclui sequer o ano. Em 1912veio a conhecer aquele que foi, sem dúvida, o seu melhor amigo – Fernando Pessoa.
Desiludido com a «cidade dos estudantes», segue para Paris a fim de prosseguir os estudos superiores, com o auxílio financeiro do pai. Cedo, porém, deixou de frequentar as aulas na Sorbonne, dedicando-se a uma vida boémia, deambulando pelos cafés e salas de espectáculo, chegando a passar fome e debatendo-se com os seus desesperos, situação que culminou na ligação emocional a umaprostituta, a fim de combater as suas frustrações e desesperos.
Na capital francesa viria a conhecer Guilherme de Santa-Rita (Santa-Rita Pintor). Inadaptado socialmente e psicologicamente instável, foi neste ambiente que compôs grande parte da sua obra poética e a correspondência com o seu confidente Pessoa; é, pois, entre1912 e 1916 (o ano da sua morte), mas, a sua carreira literária rápida o marcou por um trabalho rico.
Ouça "O OUTRO" Mario de Sá Carneiro - Adriana Calcanhoto
http://www.youtube.com/watch?v=zRKVQNmXr0M
Em Julho de 1915 regressa a Paris, escrevendo a Pessoa cartas de uma crescente angústia, das quais ressalta não apenas a imagem lancinante de um homem perdido no «labirinto de si próprio», mas também a evolução e maturidade do processo de escrita de Sá-Carneiro.
Uma vez que a vida que trazia não lhe agradava, e aquela que idealizava tardava em se concretizar, Sá-Carneiro entrou numa cada vez maior angústia, que viria a conduzi-lo ao seu suicídio prematuro, perpetrado no Hôtel de Nice, no bairro de Montmartre em Paris, com o recurso a cinco frascos de arseniato de estricnina.
Vontade de dormir
Fios de oiro puxam por mim
a soerguer-me na poeira —
Cada um para seu fim,
— Ai que saudade da morte
Cada um para seu norte..
Quero dormir... ancorar...
Arranquem-me esta grandeza!
— P’ra que me sonha a beleza
Se a não posso transmigrar?...
Verdadeiro insatisfeito e inconformista (nunca se conseguiu entender com a maior parte dos que o rodeavam, nem tão pouco ajustar-se à vida prática, devido às suas dificuldades emocionais), mas também incompreendido (pelo modo com os contemporâneos olhavam o seu jeito poético), profetizou acertadamente que no futuro se faria jus à sua obra, no que não falhou.
Fim
Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!
Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro.
O narcisismo, motivado certamente pelas carências emocionais (era órfão de mãe desde a mais terna puerícia), levou-o ao sentimento da solidão, do abandono e da frustração, traduzível numa poesia onde surge o retrato de um inútil e inapto. A crise de personalidade levá-lo-ia, mais tarde, a abraçar uma poesia onde se nota o frenesi de experiências sensórias, pervertendo e subvertendo a ordem lógica das coisas, demonstrando a sua incapacidade de viver aquilo que sonhava – sonhando por isso cada vez mais com a aniquilação do eu, o que acabaria por o conduzir, em última análise, ao seu suicídio.
Epígrafe
A sala do castelo é deserta e espelhada.
Tenho medo de Mim. Quem sou? De onde cheguei?...
Aqui, tudo já foi... Em sombra estilizada,
A cor morreu --- e até o ar é uma ruína...
Vem de Outro tempo a luz que me ilumina ---
Um som opaco me dilui em Rei...
Bibliografia
BARREIRA, Cecília. Nacionalismo e modernismo: De Homem Cristo Filho a Almada Negreiros. Lisboa, Assírio e Alvim, 1981
BACARISSE, Pamela - A Alma Amortalhada - Mário de Sá-Carneiro's Use of Metaphor and Image, Londres, Tamesis Books Ltd., 1984.
BRITO, Mario da Silva. História do modernismo brasileiro. São Paulo, Editora Saraiva, 1958.
COLÓQUIO/LETRAS, nº117/118, Set.-Dez. 1990. Número dedicado a Sá-Carneiro
WOLL, Dieter - Realidade e Idealidade na Lírica de Sá-Carneiro, Lisboa, Delfos, 1968