MEMÓRIA DE UM VELHO PEIXEIRO




 
Três horas da manhã,
Mais um dia que vem...
Ela e meus filhos dormem,
Tomo um cafezinho requentado
E vou pegar o trem.


Ainda está escuro...
Muito tenho que caminhar,
No trajeto até a estação
Sob a garoa fina e fria
Me ponho a pensar...


Não quero isso para meus filhos,
Deles vou me orgulhar.
Quero vê-los formados,
Para que não precisem
Da Central do Brasil à Praça 15
Todos os dias caminhar.


As embarcações chegam com os peixes,
Ainda os vejo saltitar...
Faço meu pedido,
Embalo-os cautelosamente,
E retorno pelo mesmo lugar.


Cinco e meia da manhã,
Chego em Queimados, na estação,
Estou cansado e sonolento.
Em casa ainda todos dormem,
Mas não me esqueço do pão.


Não posso reclamar,
Sou movido pela fé,
Meu cachorro me recebe radiante.
Ela com o sorriso motivante,
Me recepciona com o café.


No velho carrinho de mão
Me ponho a refazer
O ritual de todos os dias.
Para educar meus filhos,
E por fim nos manter.


"- Peixeiro, me dá um peixe!"
Ouço o menino falar.
Respondo: "- Vivo ou morto?"
 " - Morto."
Só tem vivo, não vai ganhar...





Com a balança de mão aferida,
A freguesia nunca reclamou.
Nunca tenho, nem dou prejuízo.
E assim a freguesia do bairro Paraíso, 
Um bom peixe sempre degustou.
 

Corvina, sardinha e robalo...
Cavalinha, xalerete e xaréu...
São os peixes mais apreciados
Que o povo menos afortunado,
Compra sempre a granel.




Era assim todos os dias,
A sua rotina pra nos manter.
Foi cedo, muito cedo,
Às três e vinte da manhã,
O meu primeiro sofrer.


Eu tinha apenas 
14 anos
Quando fui acordado para socorrer.
O meu saudoso velho peixeiro,
Com a funesta notícia que seu Coração havia parado de bater.