Inspirado na psicóloga Fernanda Reis (Maringá), que acostumada a cuidar do coração dos outros, se desapercebeu do seu...

Eu já estava resignada:
Jogar o coração fora,
retirar todos os móveis,
fotos da parede,
entulho das gavetas,
teias de sonhos do teto,
tal qual novelos
de cachos de cabelos escondidos. 

Eu já estava conformada:
Entregar o âmago,
órgão bem antes inacessível,
doado ao esposo,
agora seria revolto
por um cardiologista estranho.

Com data marcada para o despejo,
fui encaminhada
à clínica do Senhor por um longo corredor. 

Ele há muito já sabia de minha dor.
Nos olhamos com os olhos de reencontro,
mas não foram necessárias palavras de conforto. 

Em meus despojos,
não encontrei sequer resquícios da tal felicidade.  
Aquele sentimento que eu procurava mostrar
no dicionário todos os dias,
para provar aos meus clientes,
que ela realmente existia. 

Conformada com meu passaporte findo,
encontrava-me desistida.
Foi então,
que após uma longa conversa com o olhar,
em pleno silêncio,
fui retirada do colo do Senhor
e para minha surpresa,
encaminhada
ao aconchego dos braços de minha família.

O documento de viagem de volta
havia sido carimbado
e rubricado por ELE mesmo.

Sou a prova viva disso...










 
Railda
Enviado por Railda em 23/03/2012
Reeditado em 08/10/2016
Código do texto: T3570753
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