Mulheres: A realidade de cada dia - Republicação e Atualização
“Sobre a mesa uma rosa meio amassada com um pequeno cartão escrito FELIZ DIA DAS MULHERES, na cadeira, sentada com as mãos cravadas no rosto ela chora, gotas de sangue misturam-se as lágrimas escorrendo pelo seu rosto. Mais uma vez, aconteceu...”.
(cena cotidiana)
Absolutamente nada tenho contra as flores, discursos emotivos, palavras doces proferidas num dia “Especial”. Mas também nada muito a favor, principalmente se ocultar ou tentar dissimular insatisfações, desejos e sonhos reprimidos pela grotesca violência, rito diário e sumário aqui e pelo mundo, praticada contra as mulheres. Escrevo hoje, as mesmas palavras que escreveria no dia 08, 09, ou qualquer dia de um mês qualquer.
Segundo informações elaboradas pelo Ministério do Trabalho e Emprego mulheres ganham em média 17,2% menos que os homens, e embora cada dia mais qualificadas, o percentual de cidadãs do sexo feminino ocupando cargos de chefia mesmo no serviço público ainda é inferior quando comparado ao de homens, apenas 11,7%. Quando se trata de mulher negra chega a perceber menos da metade do salário de um homem branco e se mulher portadora de alguma deficiência a diferença alcança 28,5% menos que os homens. É confirmado na estatística do MTE e IBGE que características como etnia, idade e/ou portar necessidades especiais influenciam diretamente nos salários e colocam a mulher em posição desfavorável no mercado de trabalho.
Verificando os dados do Portal Violência Contra a Mulher mesmo com o advento “Lei Maria da Penha” o número de mulheres agredidas, violentadas ainda é grande, a dominação masculina ainda trava um embate com a quebra do silêncio mesmo com o apoiamento as lutas dado pelas diversas legislações vigentes.
O Brasil é um dos países que mais abastece a rede internacional de prostituição através do tráfico e exploração de brasileiras (maiores e menores de idade) entre outros índices vergonhosos para todos nós.
Na China, os avanços sociais não acompanham os tecnológicos e o país carrega a marca constrangedora das práticas opressoras como bem retratou em seu livro “As boas mulheres da China” a jornalista Xinran, que através de um programa de rádio, penetra no universo das mulheres chinesas e obtêm relatos e constatações de atos como casamentos forçados, abusos sexuais, torturas físicas e psicológicas, miséria, preconceito e humilhação tudo parte de um contexto político-cultural da China do século 20.
Baseado no Alcorão os maridos devem bater nas suas esposas, é o tema do livro cuja venda foi proibida na Espanha “A mulher do Islamismo” do imâme de fuengirola Mohamad Kemal que entre outras coisas ensina a “bater nas mulheres sem deixar marcas”. Segundo a doutrina islâmica o marido primeiro deve castigar a esposa desobediente e rebelde deixando-a sem sexo, se ela persistir na rebeldia ai sim pode bater na esposa.
Destaque aqui para algumas das leis existentes no Irã com referência às mulheres:
- Em casos de depoimentos e indenizações em tribunais, uma mulher vale a metade do valor que vale um homem;
- Em divisões de heranças uma filha mulher sempre recebe a metade da quantia recebida pelos irmãos homens;
- Meninas são obrigadas a casar com menos de 10 anos (pequenas noivas) e sofrem regularmente atos violentos e abusos por parte dos maridos;
-Todos os anos milhões de meninas mulçumanas sofrem mutilações genitais (infibulação);
- Pequenas noivas não recebem permissão de seus maridos para estudar, trabalhar e mesmo quando adultas só podem viajar se tiverem autorizações por escrita dos mesmos;
- Quando há o divórcio os maridos ganham as custódias dos filhos com mais de 7 anos;
- São proibidas de ocupar cargos como ministras e magistradas e somente em 2009 puderam ser candidatas à presidência, mas tiveram todas as 42 candidaturas vetadas.
Na seara da brutalidade retorno ao grotesco tema: Circuncisão feminina /Infibulação. Apenas na África segundo a OMS em torno de 90 milhões de mulheres são vítimas da mutilação genital. A repugnante prática que se reveste de falso contexto religioso se dá em meninas de 5 a 7 anos que vivem em regiões da Somália, Egito, Sudão e alguns outros locais do oriente Médio. São três os tipos de mutilação:
O tipo I: remove apenas uma parte do clitóris;
O segundo: extirpa o clitóris e os pequenos lábios;
O terceiro e mais comum: retirados o clitóris e os pequenos lábios os grandes lábios são raspados até sumirem, ponteados até que a vagina feche quase que totalmente restando apenas um mínimo orifício para urina e menstruação.
O ápice da barbárie é que tais procedimentos ocorrem sem anestesia, sem higiene e qualquer cuidado básico, por curiosas tidas como mulheres experientes da região. Muitas morrem por infecções e as que conseguem chegar à vida adulta têm problemas sérios e diversos com os maridos e com gravidez de riscos.
Mulheres:
Universalmente privadas dos direitos a escolhas;
Retratos de maus tratos familiares;
Vidas ceifadas pela prática de crimes absolutamente passionais;
Carvoeiras, cortadoras de cana, vivendo muitas em condições análogas a escravidão;
Trabalhos degradantes e mulheres aviltadas por todo o imenso Brasil.
O avanço foi algo significativo, votar, ser alfabetizada, avançar nas carreiras eminentemente masculinas, símbolo de lutas e reivindicações. Ainda assim, por pressões sociais, culturais muitas são silenciadas, amordaçadas com ou sem mordaças. Acorrentadas com ou sem correntes.
Imagino o dia que não precisarmos mais de um dia de reflexão, lembranças, homenagens.
Imagino um dia de menos humilhação e mais respeito.
Todos os dias, cada dia precisa ser de luta, enfrentamentos pessoais, ação e encorajamento para que algumas realidades, alguns índices dignos de vergonha possam ser modificados.
O dia 08 de março, internacionalmente instituído deve ser para refletir, não foi um luxo ou um mimo que culminou com a criação da data. Foi uma tragédia.
Que todos os dias possamos erguer um pequeno tijolo de um muro que nos separe em definitivo dessas duras e cruas realidades. Que nos façamos fortes e estimuladas, conscientizadas para recusar cada assédio quer moral ou sexual, repudiar cada ofensa ou desrespeito. Aptas a construir efetivos degraus que nos conduzam a condições mais igualitárias, menos humilhantes, quer no trabalho, na política, no poder, em família, na vida como um todo!
Neste caso, agradecemos as flores, até gostamos muito, mas diante dessa realidade não fazem tanta diferença.
Roseane Ferreira, Em, 08/03/2010.
Adendo:
Publiquei este texto em março de 2010, e passado dois anos muitos dados mudaram, a diferença de salário entre homens e mulheres reduziu, mas muitas das situações citada ainda permanecem colocando a mulher em franca desvantagem em relação aos homens.
Segundo a analista de mercado de trabalho do Dieese Ana Belavenuto em entrevista recente, apesar do crescimento “Bom e Significativo” do rendimento médio das mulheres, equiparar as remunerações entre os gêneros ainda é o grande desafio. "As mulheres já estão indo para um mercado de trabalho mais estruturado, com carteira assinada e ocupações mais bem remuneradas", afirma. "Elas, porém ainda têm muito a percorrer." Ana Maria diz que, se a remuneração média das mulheres seguir no mesmo ritmo de crescimento e os salários dos homens continuarem sendo reajustados na mesma proporção de 2011, os vencimentos médios entre os gêneros, com inflação estável, podem se equiparar em uma década. "Mas para essa previsão se concretizar temos de levar em conta muitas outras condições", ressalva.
No Brasil:
Neste 06 de março de 2012, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado aprovou em caráter terminativo (sem necessidade de ir a plenário) o projeto de lei que prevê multa a empresa que pagar um salário menor a mulher quando ela realizar a mesma atividade que o homem. Um projeto que visa reduzir as diferenças entre homens e mulheres no mercado de trabalho. Caso nenhum senador solicite a votação do texto em plenário, o projeto, já aprovado na Câmara dos Deputados, vai à sanção presidencial.
Internacional:
O dia 06 de fevereiro, desde 2003 é a data internacionalmente consagrada como Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, pela Organização das Nações Unidas, com o objetivo de denunciar a prática, existente em cerca de 28 países africanos e do Médio Oriente, bem como na Ásia e em comunidades migrantes na Europa, América do Norte e Austrália.
Neste 06 de fevereiro de 2012, para assinalar o Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, realizou-se uma sessão evocativa, na Sala de Conferências do Hospital Garcia da Horta, em Almada, sendo uma das principais estratégias de ação do II Programa de Ação para a Eliminação da Mutilação Genital Feminina (MGF/C), integrado no IV Plano Nacional para a Igualdade - Gênero, Cidadania e Não Discriminação, para o período 2011-2013, que passa pela promoção de ações de informação/sensibilização, educação e prevenção dos riscos relacionados com a MGF/C, principalmente na área da saúde sexual e reprodutiva.
O II Programa de Ação para a Eliminação da MGF/C tem como objetivo promover os Direitos Humanos, o direito à saúde, o direito à integridade física, à não sujeição a nenhuma forma de tortura ou tratamento cruel, sob o imperativo do combate à violência de gênero e da concretização de uma plena igualdade, privilegiando a sensibilização das comunidades para o abandono da MGF/C enquanto convenção sociocultural.
No Brasil:
No Brasil, o Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra a Mulher foi lançado em agosto de 2007 pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como parte da Agenda Social do Governo Federal e consiste num acordo federativo entre o governo federal, os governos dos estados e dos municípios brasileiros para o planejamento de ações que visem à consolidação da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres por meio da implementação de políticas públicas integradas em todo território nacional.
Panorama atual:
07/03 - Ministra promete diálogo com parlamentares por direitos das mulheres
Data: 07/03/2012
da Agência Câmara
Há um mês à frente da Secretaria de Políticas para as Mulheres, a ministra Eleonora Menicucci, afirmou há pouco que irá trabalhar em permanente diálogo com deputadas e senadoras. “Venho da universidade e sei da importância do Parlamento para a construção de uma sociedade democrática com respeito a gênero, classe e etnia”, sustentou.
Segundo a ministra, a pauta da secretaria irá focar temas relacionados à autonomia das mulheres no que diz respeito a política, economia e cultura. Em sua opinião, "é fundamental que elas sejam detentoras de propriedades, que tenham contas bancarias, porque isso fortalece as mulheres brasileiras”.
Menicucci destacou que a Secretaria da Mulher tem empreendido ações para combater a violência contra a mulher. Ela acrescentou que ontem mesmo (05/03) o governo federal repassou ao Distrito Federal R$ 2,5 milhões para melhor qualificar a rede de atendimento a mulheres em situação de violência.
Nos próximos dias, adiantou, serão transferidos R$ 1,5 para o Piauí com a mesma finalidade. “As mulheres rurais sofrem todos os tipos de violência. Tanto em casa quanto no mundo do trabalho é necessário que a rede de acolhimento chegue ao campo”, destacou a ministra.
Eleonora Menicucci participa do Seminário em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, realizado pela Procuradoria Especial da Mulher da Câmara, no Auditório Nereu Ramos.
Comunicação Social SPM/PR
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Fontes:
http://www.sepm.gov.br/
http://www.dieese.org.br/anu/AnuSistPub2010/conteudo/1/livro/livro1/l1_c2_14.html
http://www.seade.gov.br/produtos/mulher/index.php?bole=13&tip=03
“Todas as mágoas são suportáveis
quando fazemos delas uma história
ou contamos uma história a seu respeito.”
Isak Dinesen, citado por Hannah Arendt
em A Condição Humana