ADEUS CESÁRIA ÉVORA...

Saudade! O sentimento deveria ser resumido apenas a comiseração de uma perda de vida, mas hoje, 17 de dezembro de 2011, os palcos do mundo ficarão ainda mais nostálgicos e o pesar circulará por entre as notas musicais. Morreu a diva mais linda da música africana, a pacífica e protetora de sua terra, Cesária Évora!

A Ilha de Cabo Verde acordou nesta manhã órfã de sua maior voz e terá que se contentar apenas com as boas lembranças da garotinha Cesária Évora quando viva. Mas nem a morte será capaz de fazê-la silenciar, porque tudo que ela compôs e cantou durante uma vida inteira permanecerá ecoando nos corações mais emocionados do planeta.

A diva dos pés descalços nasceu em Mindelo, segunda maior cidade de Cabo Verde, em agosto de 1941. O pai tocava vários instrumentos musicais e a mãe era doméstica. Ainda muito novinha foi morar com a avó para se livrar de problemas econômicos; educada por missionárias católicas, Cesária aprendeu muito cedo as tormentas de uma vida dura.

Ainda garota fazia apresentações em praça pública ao lado de amigos de seu irmão que a acompanhava no saxofone. A jovem Cesária aos 16 anos já se apresentava profissionalmente em bares e cabarés cabo-verdianos com sua rara entonação e seu português se sotaque forte, herança do domínio de Portugal ao seu país.

Aos 20 anos ela já era uma diva respeitada, mas os problemas de sua vida não cessariam tão facilmente apenas por possuir uma bela voz. Mergulhada em dívidas e com pouco incentivo cultural, Cesária deixou de cantar, porque precisou sustentar toda sua família. Por 10 anos ela mergulhou no mundo obscuro do alcoolismo e quase viu sua vida ser ceifada várias vezes em decorrência da doença.

Com poucos amigos verdadeiros, Cesária se viu diante de mais uma oportunidade na carreira musical em solo lisboeta. Ela aceitou um convite e de Portugal foi a Paris se apresentar. Em 1988 gravou um álbum na França e desde então a bela moça negra dos pés descalços ganhou o mundo com sua incomparável voz e presença de palco.

Radicada em Paris, Cesária se tornou uma estrela com quase 50 anos e jamais parou de brilhar. Em 2004 ganhou um Grammy por “melhor álbum de música do mundo contemporânea” e em 2009 o presidente Nicolas Sarkozy lhe agraciou com a Medalha da Legião de Honra. Em setembro último ela anunciou que colocaria um ponto final em sua carreira devido ao alto grau de debilidade na saúde.

Cesária Évora deixa um patrimônio cultural de 24 álbuns musicados, 01 DVD e centenas de participações em festivais e duetos com artistas renomados pelo mundo. No Brasil ela veio algumas vezes e fez par com Marisa Monte, dentre outros.

Em 2008 eu tive o raro e imenso prazer de prestigiar um dos shows da diva dos pés descalços em Lisboa. Minha imensa admiração pela música desta senhora belíssima vem desde o início de sua fama e naquele show ficou marcado em minha vida, porque foi a primeira e última vez que eu teria tamanho deleite.

O mundo já triste por tanta miséria agora sofre um pouco mais pela ausência terrena de Cesária Évora, a menina que sempre cantou cações fortes e que encantou o mundo. Sai de cena e entra agora para o panteão dos melhores e dos mais importantes seres humanos que nasceram para brilhar...

Carlos Henrique Mascarenhas Pires é autor do Blog www.irregular.com.br