SENTIMENTOS

ESTA É UMA HOMENAGEM QUE FAÇO A UM AMIGO DE INFÂNCIA, QUE REENCONTREI DEPOIS DE 40 ANOS. ESTE TEXTO FOI ESCRITO POR ELE, E RESOLVI, COM SUA AUTORIZAÇÃO, PUBLICAR AQUI NO RECANTO DAS LETRAS.

Sentimentos (para uma amiga)

Hoje eu acordei com vontade de escrever sobre o título. Pensando, pensando, fui identificando todas as expressões e manifestações dos nossos sentimentos e da nossa responsabilidade em saber administrá-los.

A minha primeira preocupação é não deixá-los amorfos no pântano da vida; peço a Deus todos os dias para manter o coração esperançoso e animado com os meus sentimentos. Meu maior temor é endurecer e insensibilizar a vida.

A vida é a própria manifestação dos nossos sentimentos: quando irados somos odiosos e rancorosos; se estamos em paz, exaltamos a alegria e a esperança; apaixonados, vem aquela coisa gostosa que se junta ao amor e a extravasamos à outra pessoa.

O músico consegue expressar o seu sentimento em notas melodiosas que invadem os nossos corações, sublimando os nossos desejos; o escritor transmite o seu sentimento numa idéia, reunindo o que sente num conto, uma aventura ou qualquer coisa que o identifique; há aquele que só escreve ficções, mas no fundo, no fundo, também é a forma que encontrou de idealizar a vida e seus sentimentos.

E o poeta? É aquele que mais divaga sobre os seus sentimentos, e se torna escravo deles: sente com tanta intensidade a vida e os seus caminhos, que põe o coração acima da razão para expressá-los em seus versos, e não consegue acrescentar mais palavras para explicá-los.

Eu poderia dissertar sobre outros perfis humanos, mas são apenas estes com que me identifico com mais conhecimento e experiências vividas.

Há quem disfarce os seus sentimentos em atividades do cotidiano, mas duvido que mesmo num lampejo da razão, ele não sinta algo que o diferencie, ou encontre alguém que o tenha manifestado à sua frente.

Um dia assistindo a um programa televisivo, desses sensacionalistas, o repórter foi entrevistar um viciado em crack. Com o consentimento do mesmo a câmera gravou o infeliz fumando um cachimbo da droga e acompanhou as suas reações. O indivíduo sentindo-se valorizado de início olhava para a câmera com desdém e ufanismo. Minutos após, ele manifesta o que talvez tenha sido o último resquício dos seus sentimentos: ele chora e diz que aquele não é o caminho, que ninguém o imitasse e não fizesse a bobagem que ele estava fazendo. Senti naquele caso que a pessoa, mesmo no último degrau da dignidade humana, ainda consegue expressar a razão em seus sentimentos.

A razão e os sentimentos... Algumas pessoas não sabem administrar essa relação e se perdem por aí. Basta pegar uma estrada para constatar essa infelicidade: andarilhos maltrapilhos seguindo o asfalto sabem Deus para onde! Acho que eles perderam tudo, família, emprego, casa e comida. Mas será que lá no fundo, no fundo mesmo, eles ainda têm sentimentos? Não duvido e toda vez que passo por um, dirijo-lhes em silêncio uma prece da lembrança de Deus.

Um dia eu escrevi que "apenas vivemos se lembrados somos..." e senti a importância dessas lembranças, acho que já disse. Procuro sempre me lembrar de todas as pessoas que já encontrei na vida, seja em passagens agradáveis ou não, contanto que não esqueça nunca de colocar os bons sentimentos nestas lembranças.

Ainda não sei se consegui expressar todos os meus sentimentos nesta mensagem. Nos últimos dias foi pior, eu quase não os tinha e daí, motivo de preocupação. Você poderá me dizer com a clareza dos seus conhecimentos, como está a minha razão.

Fica aqui um abraço carinhoso e um agradecimento em prece da sua amizade e lembrança.

Ludwig Franchon

(Novembro de 2003)

"Tem horas que a gente não consegue ser

Tudo o que os outros pensam que somos.

Tem horas que a gente não consegue ser apenas

Tudo o que os outros esperam da gente.

Tem horas, que a gente vai se perdendo por aí,

E precisa de um carinho, uma lembrança,

Apenas um gesto de amor."

LAF- 30/11/01