SARA – UMA GAROTA FELIZ
BRASÍLIA, 28/03/1987
Comecei a sentir-me qual sementinha minúscula que quisesse germinar.
Onde estou? Minha consciência tenta despertar e após navegar a esmo, sinto - me mais segura, notando estar eu guardada em um lugarzinho aquecido, confortável e aconchegante...
O tempo vai passando e meu crescimento se vai acentuando. Já começo a perceber ruídos externos, suspiros ao meu redor, sons longínquos; alguém cantando longe... longe...
Passam-se os meses... nove meses, para ser mais precisa...
Agora ouço rumores mais próximos e sou levada, no íntimo de alguém (minha mãe)?, a diversos hospitais, mas sempre recusam nosso acesso:
- Estamos em GREVE !. - não podemos atender...
E vamos andando, eu em total desconforto, minha mãe gemendo de leve, e a mesma resposta de sempre: GREVE!
No HOSPITAL DAS FORÇAS ARMADAS, fomos deixadas na portaria, apesar do risco de que meu nascimento ocorresse ali na sala de espera. Eu já começava a nascer, mas os médicos que atenderam minha mãe decidiram fazer-lhe uma cesariana. Eu sufocava, não suportava mais aquela agonia da espera e finalmente, trazem-me para fora. Todos por ali querem me ajudar, limpam-me, metem-me coisas na garganta e até me fazem chorar. Alguma coisa em mim não ia bem, sinto-me mal, tudo é tão esquisito...
Queria ficar apenas com os olhos fechados, não suportava tanta claridade.
Meu corpinho doía, sentia uma câimbra terrível e ninguém percebia, apesar do meu choro constante...
Quatro dias se passaram, quando ouvi alguém dizer que iria me levar dali.
Não ficaria com a mãe de cujo ventre nascera. Seríamos separadas, e eu não entendia por quê.
Apesar do susto, alguém me esperava com ansiedade e emoção. Era minha nova mãe, que eu ainda não conhecia, suas amigas que me levavam presentes e a felicitavam pela minha chegada, e a secretária de minha mãe que, ansiosa e comovida, também queria me ver.
A casa desta nova mãe era confortável, bem decorada, muito clara e alegre. Tudo já estava pronto a esperar-me. Meu quartinho todo enfeitado com muito bom gosto, roupinhas novas adquiridas às pressas e outras levadas pelas amigas, todas esperando pela minha chegada. As colegas queriam conhecer-me e felicitar minha mãe por sua coragem em adotar-me sendo solteira, sozinha, sem dispor de muito tempo, pois seu horário de trabalho na Telebrás era integral e bastante cansativo.
O zunzum provocado pela minha chegada era grande e eu estava ansiosa por descansar, doída de ficar de mão em mão como um brinquedo admirado... Quando finalmente tudo se acalmou, minha mãe, na semi-obscuridade do quarto, falou-me baixinho e carinhosamente. Contou-me que eu não nasci de sua barriga, (eu já sabia) mas naquele momento acabava de nascer em seu coração. Já escolhera até um nome para mim, do qual gostava muito: SARA. Jamais nos iríamos separar e juntinhas caminharíamos pela vida afora...
Ela estava muito emocionada, feliz e eu também...
(EXTRAÍDO DO MEU LIVRO - SARA - UMA GAROTA FELIZ)