Mas o meu segredo está guardado dentro de mim, meu nome ninguém saberá (Tradução da frase da imagem/Nessum Dorma)

 


Ele ouvia calado.
Não era dessas pessoas irriquietas, chegava de mansinho, fazia leve mesura com a cabeça, a todos, acomodava-se sempre no mesmo lugar, no canto direito da sala. Ali ficava observando o ambiente de forma calma e atenta.
Nunca se aproximava de mim, mas seus olhos seguiam-me sem parar e sempre foi assim nas audições em que não faltava. Nunca o haveria notado, não fosse uma pessoa chegar um dia e dizer-me: poderia tocar Nessum Dorma, pois alguém assim deseja e pediu . Referia-se à pessoa que ia a todos os eventos e ficava apenas ouvindo, sem nada mostrar de emoção ou outro sentimento.
Não é costume mudar nenhuma pasta de música, assim na hora, porém com com enfase, iniciei os acordes da melodia, que não constava naquela programação. E o som de Nessum Dorma invadiu o ambiente e meus olhos não se desgrudaram do senhor que ali estava.
Notei então, nos milésimos de segundos quando olhei para a platéia, que o senhor, imagem quase diáfana, de modos requintados, frágil talvez, de porte nobre, observava-me e ia solfejando junto a melodia, como se a cantasse a alguém que só ele via e até senti a força daquele olhar, empurrando-me a dançar com as lágrimas dos seus olhos.
Assim foi durante um certo tempo, ele sempre chegava da mesma forma, naqueles idos tempos, sábados musicais, no clube onde havia algumas tardes de Primavera Festiva .
Vinha sempre, ouvia e saía da mesma forma que havia chegado, mas antes de ir, aplaudia, acenava e sumia pela grande porta envidraçada.
Passei a tocar apenas a ele, a Nessum Dorma, devia ser a música de sua vida e assim fiz da melhor forma possível. Até que um dia  não apareceu mais, notei sua ausencia, entristeci, mesmo assim toquei a sua preferida canção. Alguns dias depois eu soube que falecera, estava já ao lado do grande amor que tivera, dançando com certeza, sobre as nuvens, felizes num só compasso, a melodia que certamente tanto apreciavam. 

Aúdio: NESSUM DORMA

Marilda Lavienrose
Enviado por Marilda Lavienrose em 11/11/2010
Reeditado em 15/09/2013
Código do texto: T2609353
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