O ÊXODO. O ÊXITO

Há mais de 30 anos ele mudou-se para a cidade grande levando consigo sua família e pertences. A situação na época não era das melhores, isso explica a necessidade dessa empreitada. Toda família mais pertences e utensílios coube perfeitamente numa caminhonete que foi dividida com outra família e seus pertences, sem colocar no balanço as galinhas, porcos, cães e outros animais de subsistência e estimação, de ambas as famílias.

Trabalhou em diversas empresas. Suas mãos sangravam pela dureza do trabalho: estrada de ferros, construções civil, vigilância. Suas noites mal-dormidas acumulavam com as trabalhadas. Acordava na madrugada, caminhava longa distância, corria risco de morte. Criou sua família. Com dignidade.

As casas em que morou eram, ora de alvenaria com chão de terra batida, ora de madeira, feita por suas próprias mãos. Na mesa, o básico para a sobrevivência.

A vida era dura, mas não se queixava dela. Marido de uma só mulher teve nove filhos, uma criança foi privada de seus carinhos e correções, pois se transformou em anjo com três meses de vida. Mãos calejadas pelo trabalho duro não economizava carinho nem correções, dois ou três de seus filhos conheceram o peso delas, justa ou injustamente. Não estou em condições de julgar. Essas mesmas mãos sustiveram a família unida, mesmo em meio à adversidade, se não foi, ou não é, mais unida a culpa não recairá sobre sua cabeça. Ele tentou até os últimos instantes em que viveu. Sou testemunha disso.

Partiu deixando saudades, mas com uma certeza: reencontrar-nos-emos. Durante 50 anos ensaiou para cantar junto ao coro angelical, e foi promovido para o coro principal. Possuidor de uma voz grave e cultivador de um “senhor” bigode, era conhecido por muitos e respeitado por todos. Não perdia a chance de, com simpatia, brincar com que lho permitissem. Sempre alegrava as reuniões de família, pai brincalhão, paizão, vozão. Sem saber ler ou escrever brincava com as palavras, foi dele que pela primeira vez ouvi dizer que Jesus chamou Pedro de garrafa térmica: “quando Ele disse: homem de poucafé”.

Faleceu, deixando amigos aos milhares, histórias incontáveis, oito filhos, doze netos nascidos e um por nascer, um bisneto nascido e um por nascer. Não deixou herança. DEIXOU LEGADO.

Hoje sou o que o ele foi para mim: PAI. Espero ser ao menos a metade de pai que fostes.

Saudades.