Eras enorme e estrondoso como um trovão
A assustar-nos em noites de tempestade.
Foste o Lobo-Mau dos meus bailes em Catalão.
Entravas em casa como um soldado a marchar,
Pisando as flores que cobriam nosso chão.
Eras herói a nos defender dos malvados parentes
Que, na tua ausência, decidiam corrigir-nos.
Foste a garantia de que não ficaríamos carentes
Dos mantimentos trazidos em sacos, caixas, tonéis,
Que entregavas à mamãe como se fossem presentes.
Eras temido por crianças, amigas, namorados.
Ao sinal da tua presença, todos desapareciam.
Foste o carrasco dos nossos programas animados,
Das nossas gargalhadas estridentes e espontâneas,
Que escondíamos para não ser castigados.
Eras mais forte e corajoso que um touro na arena.
Enfrentavas o tempo e peso, a distância, homens e feras.
Foste um semideus na nossa infância terrena.
A segurança da tua proteção nos encorajava
Às traquinagens, que agitavam a cidade serena.
Hoje te vejo assim miúdo, indefeso, fragilizado.
Dói-me a humildade que te desejava outrora.
Brotam-me lágrimas ao teu olhar molhado.
Cansam-me os braços amparar-te os passos.
Arde-me o desejo pelo teu jeito estourado.
Teus noventa anos te dão todo o direito:
Relata a qualquer um tuas vitórias e derrotas.
Teu futuro é a tua história contada do teu jeito.
Tuas testemunhas são os amigos que renascem nos sonhos
E te despertam, minimizando a dor que sentes no peito.
Doente, cansado...
01/09/2005 23:33
Sandra Fayad
Publicado no Recanto das Letras em 12/03/2006
A assustar-nos em noites de tempestade.
Foste o Lobo-Mau dos meus bailes em Catalão.
Entravas em casa como um soldado a marchar,
Pisando as flores que cobriam nosso chão.
Eras herói a nos defender dos malvados parentes
Que, na tua ausência, decidiam corrigir-nos.
Foste a garantia de que não ficaríamos carentes
Dos mantimentos trazidos em sacos, caixas, tonéis,
Que entregavas à mamãe como se fossem presentes.
Eras temido por crianças, amigas, namorados.
Ao sinal da tua presença, todos desapareciam.
Foste o carrasco dos nossos programas animados,
Das nossas gargalhadas estridentes e espontâneas,
Que escondíamos para não ser castigados.
Eras mais forte e corajoso que um touro na arena.
Enfrentavas o tempo e peso, a distância, homens e feras.
Foste um semideus na nossa infância terrena.
A segurança da tua proteção nos encorajava
Às traquinagens, que agitavam a cidade serena.
Hoje te vejo assim miúdo, indefeso, fragilizado.
Dói-me a humildade que te desejava outrora.
Brotam-me lágrimas ao teu olhar molhado.
Cansam-me os braços amparar-te os passos.
Arde-me o desejo pelo teu jeito estourado.
Teus noventa anos te dão todo o direito:
Relata a qualquer um tuas vitórias e derrotas.
Teu futuro é a tua história contada do teu jeito.
Tuas testemunhas são os amigos que renascem nos sonhos
E te despertam, minimizando a dor que sentes no peito.
Doente, cansado...
01/09/2005 23:33
Sandra Fayad
Publicado no Recanto das Letras em 12/03/2006