UM JESUÍTA VISITA SÃO PAULO NO DIA DE SEU 456o. ANIVERSÁRIO

São Paulo aniversaria hoje. 456 anos! Parabens!

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Como se sentiriam, os jesuítas se pudessem visitar, nos dias atuais a cidade que fundaram há quatrocentos e cinqüenta e quatro anos?

Envergando a batina preta, feições indefinidas daqueles que não têm idade por haver conquistado a imortalidade, o Jesuíta chega à grande cidade cuja semente, um dia, plantou no solo da, então selvagem, Terra de Santa Cruz.

Sucedem-se as surpresas.

A viagem de avião, confortável e rápida deixou-o num dos mais movimentados aeroportos do Mundo e ele, acompanhado de seu guia, misturou-se á multidão que se acotovelava, como se o espaço de cada um precisasse ser conquistado aos empurrões e houvesse sempre pressa, muita pressa, para chegar, fosse lá onde fosse..

Aturdido, ele indagou:

- Você tem certeza de que estamos em São Paulo? Não estaremos sendo joguetes de um brincalhão? Não será esta uma cidade fantástica, criada pela imaginação fértil de um ilusionista?

Nem mesmo a Lisboa que conheci tinha tanto movimento e tanta agitação!

O guia sorri complacente diante do seu assombro:

- Esta é a mesma S. Paulo que nasceu no vale, entre o Anhangabaú e o Tamanduateí, cujas primeiras casas, construídas a volta do Colégio, abrigaram numerosas famílias que, com o passar dos séculos, multiplicaram-se formando novos núcleos e hoje constituem a nata da sociedade paulistana, aqueles que se intitulam orgulhosamente “paulistas de quatrocentos anos”.

S. Paulo abriu os braços para receber em seu seio todos os imigrantes que aqui chegaram. Estrangeiros do Mundo todo; brasileiros oriundos das regiões mais pobres; descendentes de índios e de escravos; jovens do interior, ávidos de chances de progresso; todos aqui aportaram fascinados pelos atrativos da cidade grande, irmanaram-se trabalhando lado a lado, usufruindo da sua riqueza potencial, incorporando-se a empresas que surgiam, alguns se destacando, crescendo material e intelectualmente, conquistando mais alta posição social e econômica, outros, sobrevivendo em condições mais modestas, porém dignas.

O padre e seu acompanhante chegam ao Pátio do Colégio

- Mas isto é fantástico! Tudo que fizemos foi ensinar as primeiras letras e levar os conhecimentos básicos da religião para índios e filhos de colonos.

Uma vila se formou a volta do Colégio, e tudo que almejávamos nos nossos sonhos mais ousados, era vê-la, um dia, elevada a categoria de cidade.

- Mas, quatro séculos e meio se passaram e muita coisa mudou.

As choupanas foram substituídas por casinholas de terra socada e foram surgindo os primeiros sobradinhos de janelas largas com vistosos vitrais coloridos, luxo daquele tempo, privilégio dos poucos afortunados da época.

Com o aumento, cada vez maior da população, o espaço passou a ser insuficiente e, então, os primeiros prédios de apartamentos foram construídos. Com, no máximo dez andares, eram chamados de ”arranha-céus” e houve por parte da população certo receio de habitá-los, no começo. Seriam eles, suficientemente seguros?

Hoje os edifícios popularizaram-se. Dos mais simples aos mais luxuosos, são, os apartamentos, a moradia preferida pela grande maioria das pessoas de todas as classes sociais..

Só, relativamente, poucos, preferem as casas térreas dos locais mais afastados ou habitam as ricas mansões dos bairros residenciais de alto padrão.

Os enormes edifícios, abrigando milhares de famílias de todas as classes sociais, escritórios, repartições públicas, etc. construídos lado a lado na região central e nos bairros residenciais, invadem os ares como se buscassem realmente alcançar o infinito encobrindo parcialmente o firmamento.

Novas surpresas aguardavam o velho jesuíta na estação do metrô.

- Que é isso? Um parque de diversões? Vamos brincar de viajar debaixo da terra? Onde os bons coches puxados por cavalos cuidadosamente escolhidos?

- Os meios de transporte também evoluíram, adequando-se ao tamanho da cidade e a sua, sempre crescente, população.

Já vai muito longe o tempo em que veículos de tração animal cruzavam as ruas percorrendo os poucos quilômetros que separavam os vários pontos da cidade, transportando os moradores de locais mais afastados até o Centro ou até outros bairros.

Os bondes foram muito utilizados até o meado do século passado, mas foram substituídos por ônibus que transportavam mais passageiros, eram mais rápidos e ocupavam menos espaço no trânsito, e, finalmente, agora, nas últimas décadas, embora o carro particular tenha se popularizado, estando ao alcance de uma grande faixa da população, o metrô, veio resolver o problema do transporte coletivo urbano.

O religioso manifestou o desejo de conhecer o Ipiranga, o marco do mais expressivo episódio de nossa vida política, o riacho que ficou famoso por ter sido o primeiro a ouvir “de um povo heróico, o brado retumbante” na voz do inesquecível D. Pedro I.

- Este riozinho ficava tão longe! Era tão pouco importante que nunca o conheci, mal lhe sabia da existência! Nunca podia imaginar que ele seria o palco de tão auspicioso acontecimento.

- O episódio da nossa Independência tornou S. Paulo a mais conhecida cidade brasileira, ligada a este fato de repercussão internacional, fixada para sempre nos anais da História.

O Museu do Ipiranga, acervo de relíquias de nosso passado, é programa obrigatório de todo turista, uma das maravilhas brasileiras que todos deviam conhecer.

- E as escolas? Sei que muita coisa mudou desde o tempo em que eu ensinava as primeiras letras para crianças e adultos, sentados em rústicos bancos de madeira e lhes dava a conhecer o Cristo Redentor, simbolizado no Cruz de madeira que levantáramos no pátio.

- São Paulo é hoje um dos centros educacionais mais importantes do Brasil. Temos inúmeras e excelentes escolas particulares, do primeiro ao terceiro grau, e escolas públicas de ótimo padrão para crianças, jovens e adultos em todos os níveis de aprendizado.

E, assim, chegaram à USP, a Universidade de São Paulo, a Cidade Universitária, dentro da grande capital.

O antigo mestre se emociona.

- Nunca poderia imaginar tal grandiosidade, tanta escolha a disposição do jovem que dá o primeiro passo no caminho que irá percorrer profissionalmente. As opções são tantas que, muitas vezes, se torna até difícil fazer uma escolha

Mais uma vez o passado se insurge na memória do jesuíta. Lembrou-se da singeleza de seu Colégio, da simplicidade de seus alunos, consciente, porém, de que tão importante quanto ministrar elevados conhecimentos em sofisticada escola moderna, foi tomar a mão calejada de um indiozinho para ensinar-lhe o Sinal da Cruz.

- Mas, será esta uma cidade privilegiada por Deus, onde só existem o bem e o belo e onde os vícios e as torpezas não chegaram?

- Muito pelo contrário! São muitos os problemas que ainda temos. Há multidões de “sem teto” habitando as ruas da cidade; existem desajustados de toda espécie, a violência é muito grande e são ineficazes os meios que temos para contê-la. . .

José de Anchieta, o religioso, o mestre, o filósofo, com seu entender de sábio e de santo, apenas comentou:

- Estes problemas, certamente, serão sanados pelas próximas gerações nos séculos vindouros!

Maith
Enviado por Maith em 25/01/2010
Reeditado em 25/01/2010
Código do texto: T2049996