UMA GRANDE MULHER, UMA GRANDE ESCRITORA E UMA GRANDE AMIGA!
CARO LEITOR,
ACABO DE RELER OS ÚLTIMOS E-MAILS QUE TROQUEI COM A MARGARIDA.ENTRE ELES, HÁ ESSAS TRÊS BELAS POESIAS!
AINDA DIZEM QUE EU SOU ESCRITORA, A CADA DIA QUE PASSA, ME CONVENÇO QUE SOU APENAS UMA APRENDIZ.
CÁRMEN NEVES.
JÁ ERA TARDE
Na primeira noite, bebi tua boca
para não te fazer perguntas
e afaguei teu corpo numa sofreguidão incomum.
Era tarde!
A lua aparecia na parede de minha vida,
querendo lisonja de momentos apaixonados.
Comi tua fome, abrindo minha mágica de espera conflitante.
Não fui ao jardim das minhas esperanças,
colher o fruto da minha sanha incontida
mas, levei minha voz de louca
e minhas crateras de anseios delicados.
Extasiei-me com a lembrança do meu
sonho juvenil para não deixar
minha aliciante vaidade fenecer
e foi por isto que desapareci de novo
para não te fazer perguntas,
não te cobrar espaço,
nem conquistar teu império.
Já era tarde!
A lua da minha vida sorria miúda
entre as paredes e eu queria salvar minhas metades.
Por isto, deixei ir-se...
Tenho insucesso com a realidade e não
queria estandarte para avisar-te de que eu estaria partindo
Por isso, deixei ir-se...
Margarida Reimão
NOITE INSONE!
Noite insone!
Os vaga-lumes de minha imaginação
fazem um luzir perpendicular aos sentidos
Sentidos meus que me embaraçam a fazer poesia de madrugada,
na quietude de minha casa quadriculada,
porque meus grilos cantam alto e atiçam esse meu poetizar.
E a noite prolonga-se para fazer poesia para você,
que dorme, do outro lado da selva urbana
e me faz gritar, desesperada para ouvir vozes no ventre
nesta noite de pedra fria que me persegue, silenciosa
e eu, poeta louca, enfrento novamente o espelho do meu eu,
de volta, na contramão, na contramão da vida,
no silêncio do ócio, no meu simiótico estado fantasmático.
No meu regaço quente como bigornas onde se funde ouro.
Onde tenho arrebatações, tochas ardendo pelo pescoço e peito,
E meu tempo, nada aliado, corre célere diante dos meus pedidos,
da minha voz ofegante, fazendo um colar de desejo,
de comando às minhas misteriosas frestras,
consumidas, anunciadas, abrasadas, interditadas
e manejadas por seus cordéis.
Noite insone, sem guarda noturno para apitar
Sem o colarinho do sol nascendo antes da hora para me conformar.
Apenas o silêncio, o inquietante silêncio que levou meu pensamento
a alongar-se numa rede de coisa oculta, incandescente e inesperada.
Coisa vadia, sem vigia, a decantar na noite de breu
soluçando a acomodação do meu espírito
como uma carta marcada, açoitada e deliberada a não se soltar de mim.
Noite insone, longa e perpendicular,
com assombrações notívagas,
Destarte pudesse encobrir-me em teu leito,
para me proteger do meu feitiço.
Margarida Reimão
01/12/2004 - 02h46
MINHA CABEÇA NUA
Minha cabeça está nua, qual o ventre do mundo,
suando, transpirando o calor, num jeito insólito de parir
molhando meu tempo, sacudindo minhas ânsias.
Nua, pendular, esquisita, adentrando outro mundo.
Um mundo que desconheço, que volteio, que abdico, e retomo, cheia de medos.
Saio e entro na mesma porta dessa minha tola cabeça.
Penetro, vejo o que tem por lá, num passeio perpendicular, salivar e sem gosto.
Saio e entro e retorno, busco uma explicação séria, ou boba.
Nada me vem, nada me faz mirar o espelho sem me ver um menino com cara de abandonado.
Traço um destino lúgubre e um desatino entra.
Fecho a porta, não deixo entrar essa selvageria,
Alcanço a cabeça nua, despida, singular, onde meus olhos passeiam com brilho fosco.
A minha cabeça num cenário de tonteiras, num suspense interminável.
Basta! Molho-a, despida, suada e chego a me ver, dolente,
entre as vagas deste mundo perdido, deste desconhecido ventre.
E lá estou eu, mecânica, temporal, disponível, com minha cabeça nua.
Margarida Reimão