A visão da alma (Minha homenagem aos meus amigos deficientes visuais)

Pela vidraça ‘avisto’ uma praça, crianças correndo, saltando, vivendo. Em sintonia, os pássaros gorjeiam e as folhas num bailado perfeito festejam a vida. Uma voz me trás à realidade. Respondo pra não ser indelicada. Percebo que a pessoa fica sem ação. Seu silêncio é uma pergunta: “Como ela pode olhar para fora se não tem visão? Acho graça, nesse modo de pensar. É que ela ainda não percebeu que uso outra visão, a visão da alma.

Há muita gente que tem olhos, pode contemplar a imensidão do céu e do mar, o sorriso de uma criança, um semblante marcado pelo tempo... Mas essas imagens nada lhe dizem. Olhar assim, não é olhar. Viver assim, não é viver. Porque o olhar do coração não pode ser privado da beleza que precisa ser descoberta, observada, tocada, sentida.

É por isso que ainda posso ver o que muitos não vêem: a criança com seus passos vacilantes, indo ao encontro do seu animalzinho. A relva úmida do orvalho da noite, uma bola de gude perdida, mãos gorduchas e pequeninas, a procura da bolinha amiga. É o olhar vigilante da mãe que cuida, e que se orgulha do fruto do seu ventre.

É o casal de namorado indiferente à platéia. Onde o sol não é causticante; a lua é espelho do amado, e as nuvens, mensagens de amor. Num banco de uma praça, um casal de velhinhos, mãos dadas pra toda vida. Venceram no dia a dia. Choraram e riram juntos. Num dividir, num somar. Almas entrelaçadas.

Nessas viagens entro, saio, corro e salto. Navego e vôo. Num despertar para a vida, realizo a maior viagem, cujo meio de transporte é a alma.

Ione Sak
Enviado por Ione Sak em 30/11/2009
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