PAI

De minha infância, retirei lições que me acompanharam por toda vida e uma delas, creio que a mais importante, refere-se ao amor. Meu pai foi um homem simples e por ter nascido no meio rural, poucas chances teve de dedicar-se aos estudos, mas para mim foi um sábio, um grande homem. Por ter contraído uma grave doença, ainda jovem aposentou-se e para sustentar os filhos, vendia doces e amendoins pelas ruas do bairro. Chuva ou sol, lá estava meu pai, percorrendo as ruas por horas e horas, carregando o velho balaio, que aos meus olhos eram repleto de sonhos. Eu o aguardava no portão e saía correndo atrás dele, ansiosa por sua companhia. Ele chegava na cozinha e retirava um punhado de amendoins do balaio, descascava-os, espalhando-os sobre um pedaço de papel de pão que colocava sobre a mesa, onde eram moídos com uma garrafa de vidro.

Eu, criança curiosa que era, acompanhava fascinada aquele processo como se fosse uma experiência de alta tecnologia. Enquanto meu pai esmerava-se em transformar aquele punhado de grãos em uma farofa bem fininha, meu único pensamento era o resultado final daquilo tudo, quando ele cuidadosamente retirava a farofa , colocando-a num pote, onde acrescentava o açúcar para, em seguida nos ofertar. Apenas hoje percebo a grandiosidade daquele gesto, o amor que ele colocava naquela tarefa. O cuidado, o zelo com os detalhes daquele processo até o resultado final, que era a nossa satisfação, era a forma concreta que ele encontrava para nos dizer de seu amor, visto que talvez fosse difícil para ele expressar o amor em palavras.

Assim, acredito que por menores que sejam nossas ações em relação aos que nos rodeiam, elas devem ser feitas com todo nosso amor e dedicação, com zelo mesmo, pois se alguns poucos perceberem o sentido destas ações e sentirem-se tocados por nossos gestos e palavras, se mantiverem em seu olhar o brilho e a pureza dos olhos de uma criança curiosa, saberemos que nossa vida valeu à pena.