Ode ao Violonista

A Luiz Francisco Pires

I

Como se fosse um rito,

mística mágica lírica,

(Transmutação do corpo em alma)

sacrilégio abençoado:

Ao colo aconchega o relicário,

realejo concebido pelas musas...

E brinca de Deus fazendo arte.

II

Senhor das chaves que são seis,

abre as sete portas do oráculo

para falar com Deus, num diálogo sem voz...

E, assim como Moisés dançou para o Senhor...

As mãos bailam pelos degraus do templo

e os dedos vazam acordes com olor de rosas,

acordes com matiz de salmos

num idioma de cristais que se agregam

ordenando o silêncio que era caos.

III

Êxtase:

Ternura de pássaro no ninho

à espera da febre da aurora:

Tradução da luz em som.

Encanto:

Arrebatamento sonoro,

levitação de acordes

em prece digital

no oratório de madeira

quando o universo se revela

na secreta equação de sete símbolos,

(Cabala)

em seis linhas revelada.

IV

Desígnio de mago

o sortilégio nos dedos,

as veias arpejadas

em tessitura febril,

os olhos marejados em clave de maré,

alma aérea e musical

subordinada à regência

do dom elaborado

com insônia e teorema.

V

O homem se diviniza

ao traduzir o espírito,

conspira com os anjos

manipulando cristais,

tornando audível aos humanos

a pulsação das estrelas,

(Matemática sonora)

a respiração de Deus.

(Música)

O homem é um ser celeste

quando exercita o infinito.

VI

Um homem só

e uma orquestra de duendes

em único instrumento.

Fidelidade de sino,

devoção de campanário...

E, como se as cordas

fossem os nervos de seu corpo,

o homem tange a si mesmo

para expor-se ao inverso.

VII

Ser e objeto já não são

mas unidade de harmonia

em perfeita integração.

O homem reza sem saber

que tem ao colo

a alma transmutada em violão.

E, já sem corpo,

levita com os anjos

no invisível do azul.