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Ah, deveria constituir delito com dolo alguém exalar um cheiro tão perturbador; essa mistura de virilidade que as narinas de fêmea captam de forma espontânea misturada ao aroma dos requintados salões só frequentados pela elite, dantes denominada burguesa, hoje, yuppie e tantas outras conceituações que acabam no mesmo vácuo.
Os abissais olhos azuis que me encararam por breves segundos pareciam afirmar: "vou te reencontrar, donzela fugidia e assustada, entre tantos jalecos brancos, perdida por corredores fétidos onde a dor e a miséria humana se amontoam feito lixo, ignoradas, gritantes ou silenciosas. E a vida é decidida na fração do segundo coercitivo e esvai-se sem sentido em nome dum trago negado, numa traição descoberta, no sinal vermelho avançado, no descaso nas portas das instituições e becos."
Fugi das profundezas que a mim sugavam para o conforto e a falsa segurança daquilo conhecido por lar. Fugi rumo à solidão acompanhada. Escondi-me sob corpos na esperança de experimentar o preenchimento jamais alcançado. Servindo-me e servindo à lasciva que oculta fantasmas, fragilidades, remorsos e perdas irreparáveis. Fugi da contradição a fim de poder mais facilmente ser conjugada. Fugi de ti quando, em verdade, era a própria existência insossa, fútil e longe de perspectivas o meu real temor!
Mas, naquele outubro, finalmente vislumbrei sem reservas ou recriminações teus encantadores olhos azuis. Os mesmos que descobriram as noites parisienses e californianas; assistiram o fenecer de vidas na periferia desse recôndito esquecido pelo restante do mundo e que se embriagaram na tentativa de mitigar a impotência e a amargura de quem tendo a tudo nada possui.
Infeliz quem tenta mudar o mundo, pois, o mundo dentro de nós é estranhamente mais complexo do que a realidade a nos cercar. É a loucura a ser compensada; a emoção sublimada; o potencial por comodidade omitido; a visão desviada e comprometida com a mera evidência que acoberta a transparência e nos verga até o lodo.
Foi a imensidão azul o último resquício de lucidez eternizado na minha memória e compensaram todos os anos que, sorrateiramente, qual criminosos, nos entregamos aos intensos momentos de paixão, às juras consoladoras e mentirosas; porém, necessárias no trôpego prosseguir. Necessárias? A quem?
Longe das cobranças e incompreensões; e, especialmente, longe das noites insones de pecados imaginados ou concretos, eu pude, no aconchego das mãos brancas e profissionais, adormecer.
A liberdade que chega no adeus inesperado.
Estás sem grilhões, olhos azuis... Sigas agora na certeza de que o nosso encontro num corredor fétido não foi mero acaso ou destino.
Maktoub.
Até mais.
Com amor,
Mumtaz
Há tantas formas de se homenagear quem amamos. Tentar escrever desajeitamente um conto foi a minha para alguém super importante. Feliz Aniversário, Jorge! Achei que esta seria a demonstração mais eloquente do quanto fazes diferença!