28 - TODO MENINO É UM REI...
28 - TODO MENINO É UM REI...
Nos primeiros quinze minutos a partida já estava 2 X 0 para o time dos meninos da Rua do Ouro. Até parecia que os moleques que jogavam atrás do Grupo Mestre Emílio Pereira ganhariam fácil fácil aquela partida e, por consequência, o torneio. Não me lembro o nome exato do torneio, acho que era “Lopardi”. Se não houvesse troféu ou taça, disputaríamos até mesmo um queijo, “coisa que mineiros e italianos gostam demais”. Seu Lopardi era uma destas pessoas bastante controversa nas suas atitudes. Quando a maioria dos pais achava que já estava na hora dos meninos arranjarem algum serviço ele, com seu sotaque de italiano da Calábria ou sei lá de onde na Itália (mas agora já misturado com espanhol lá do sul do Brasil onde morara antes de vir para este porto seguro que é Itabira), resmungava:
- “Quieta, cada coisa na sua hora ou há seu tempo, ô pouca miséria!
Outra faceta peculiar é que ele não gostava que os meninos proferissem palavrões enquanto estivessem jogando futebol no campinho defronte sua casa. Não ali no campinho... (não as pessoas, mas, já ele!)
Ás vezes comprava sacos de esterco para horta mesmo sem precisar só para nos ajudar. Outro aspecto interessante era que, uma vez trabalhando na Empresa, o jovem já teria atravessado o marco divisório entre a juventude e a maioridade, no entender de seu Lopardi. Á partir deste momento, ainda que menino do SENAI, ele cobrava atitudes de homem feito e ponto final, não importando quão jovem a pessoa ainda fosse, não importando mesmo que ele o vira crescer.
Transcorridos trinta minutos do primeiro tempo sem que o placar fosse alterado para o nosso lado, já estávamos perdendo mesmo por dois à zero. Chegou o intervalo a partida era de queda ou tempo corrido. A virada acontecia com o que chegasse primeiro. Seu Amaral chamou o Taco e disse: - Vocês precisam tirar aquele ruço do time!
Parecia claro que ele estivesse se referindo ao Topa-Tudo, que tinha o cabelo amarelado como sei lá o quê!
Taco não disse nem sim nem não. Recomeçamos a partida e num desses lances impossíveis o Topa-Tudo fez tabela com Luiz Timbé (irmão de Lúcio Bidóga) e marcou um golaço! Com certeza foi o mais lindo que fizera pro resto de sua vida como peladeiro.
O pior para o time adversário é que o cabelo amarelo pegou para Cristo a defesa do time da Rua do Ouro e tome gozação. Com o Topa-Tudo era assim: deu margem, sai de baixo! Enquanto não fizesse o cara perder a boa, não dava paz. Nem assim parava dizendo: - Você apelou? Apelôooso!
Em um lance mais forte o Mauricio deu “um rapa” no Luiz Timbé, como dizia Sô Bernardo quando o Jair Gitano mandava um ponta-esquerda lá no alambrado. Assim, jogando o Timbé lá para fora do campo no meio do canavial e das bananeiras, ainda disse apontando o dedo no nariz do Timbé: - Seu coisa, além de ser da nossa rua, ainda está jogando contra nós! Aqui na nossa área, eu sou o Rei!
Sô Amaral não se conteve e gritou:- Não falei que vocês tinham que dar um jeito e tirar esse Ruço filho do Sô Tatão?! Com ele é uma entrada e promessa de estaleiro!
Mauricio, o Ruço, era bem assim: camisa aberta, braços separados e peito estufado como um “galo índio”, como definiria mais tarde o Nahor Rocha a respeito dos Filhos de Sô Tatão.
Acho até que é por esta singular identificação de galo que o Mauricio hoje é torcedor fanático do tal Atlético Mineiro.
Foi uma bela confusão! Tínhamos dois Ruços jogando uma mesma partida além do mais os dois se chamavam Mauricio... Os dois com cabelos amarelados e ainda um terceiro assistindo com o pé coçando de vontade de jogar que era o filho adotivo (afilhado) do seu Amaral, que também se chamava Mauricio.
Falta assinalada, bola na marca. Cobrador de faltas dos melhores que já vi, Taco colocou a bola carinhosamente e como estivesse cobrando a falta com as mãos tal perfeição, deixou o Wilson Tavares correndo atrás da sombra da bola, porque esta já estava no fundo das redes, digo, lá nomeio do canavial que existia naquela área atrás do gol.
Cobrar faltas com aquela perfeição, só veríamos bem mais tarde com o “Figênio” do Senhor Bernardo e Zico do glorioso Flamengo! Na verdade veríamos também o Claudio Cabral e o Chirim (Raimundo de Brito), do Campestre e Pedrinho, Papita e Benitez do Brasileirinho! Era falta cobrada e o placar movimentado, como diria o Jairo Anatólio Lima na sua coluna e nos comentários no Rádio “falta cobrada e o véu da noiva balançando.”
Até aqui, jogo empatado e vantagem nossa que tínhamos saído perdendo. Agora vinha a disputa nos pênaltis. Vitória garantida! Além da vitória o Troféu que era na verdade um pedestal feito lá na carpintaria da Vale, com uma base de madeira torneada e uma pedra de minério incrustada, como alusão ao feito (torneio “tal”; uma placa gravada e já estava bom demais).
Mauricio o Rei da área, era como ele queria já para o Senhor Amaral “o Ruço” para sempre incorporaria. Ao longo de nossa convivência fosse na Farmácia do Metabase, na Escola ou na Vale do Rio Doce, Mauricio sempre afirmava: - tá Russo! Só que agora dentro de outro contexto.
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Com toda essa marra de malvado, na verdade, ninguém apostaria que os “meninos” de Dona Dorvalina e Seu Tatão (cabeça de algodão) são gente boa pra valer!
Ah! Antes que eu me esqueça, não vou deixar que se apaguem nas nossas mentes os peladeiros deste jogo inesquecível!
Os peladeiros da Rua do Ouro: Wilson Tavares, Lúcio (Fábio), Darci (Major), Ferreira (de Marcolino), Mauricio (o Russo/Ruço), Miltinho (do José Rosa) Heli (Corujão), Cláudio Cabral.
Os craques do dia: Catatau, Zé da Paz, Uilo, Taco, Claudionor, Tatão Miranda, Luiz Timbé, Topa-Tudo, Noel, Setembrino, Coordenador: Efigênio do Sô Bernardo.
Nesta época ainda não tínhamos os registros do Tião na Resenha Esportiva, mas ficam agora para sempre nos anais da história.