AUGUSTO BOAL
Carmen L. Fossari

 
Algumas perdas são tão dolorosas, que tentamos ao longe amainar, até que a ficha da memória emotiva filtre os ruídos e sem saída nos demos por vencida!
Augusto Boal partiu, atravessou o umbral do portal, aonde viajante algum jamais retornou, como descreve a imagem da morte Shakespeare em versos de HAMLET.
E me lembro de Boal , falando de Shakespeare, em uma das vezes que tive a oportunidade de estar perto e o escutar avidamente, falava do equívoco das pessoas em considerar Romeu e Julieta um drama sobre o amor, ao contrário, é a história dos rancores, dos ódios, da posse , do ódio entre famílias. Creio que muito desta visão deve-se em parte a convivência com a esposa psicanalista e no mais ao seu privilegiado cérebro que era irradiado por um coração repleto de sonhos da NÃO OPRESSÃO NO MUNDO.
Conheci junto com um trabalho com o Grupo Citée (PENSO SER ESTE O NOME FAZEM MAIS DE 20 ANOS) da França, num espetáculo que levava 10 horas, sendo que às duas horas iniciais o grupo preparava o elenco através de jogos para serem co-atores e co-autores da obra, sempre que alguma situação incomodasse o espectador, ele podia bater num prato de metal, efeito de som de um bumbo e entrar no local da personagem e propor outro destino d
aquelas personagens.
A proposição de seu Método, e do sistema Coringa de interpretação, e a radicalização em relação ao TEATRO INVISÍVEL, deram notoriedade internacional, sem dúvidas o Boal é respeitado no mundo todo e muito amado.
Sua dramaturgia é ferina ao sistema e uma poesia aos sonhos socialistas.
Boal , muito pouco se interessou ao Teatro dito comercial , embora fosse um diretor
espetacular a direção que fez do espetáculo FEDRA, com Fernanda Montenegro e
Edson Celulari (nas mãos de Boal , foi excelente ator), antológica, bela, ritmada, trágica ao sentido mais profundo.
Muito s exercícios do universo teatral Boal copilou-os e acrescentou inúmeros outros num livro habitue , dos estudantes de teatro e professores :100 EXERCÍCOS PARA OS ATORES E NÃO ATORES, depois vieram às obras mais reflexivas , seus textos e suas andanças mundo afora pregando o Teatro como uma possibilidade de mudar e romper situações.
No ano de 1997 na Universidade de Cayey, em Porto Rico lecionei uma Oficina
ao GRUPO TEATRO DEMUS e atores convidados de Porto Rico e EEUU.
O tema da Oficina? AUGUSTO BOAL, "além das TÉCNICAS LATINO AMERICANS DE TEATRO POPULAR”, e com os alunos preparamos a versão de ROMEU e JULIETA, na luta entre a possessão norte americana (que mais tarde infelizmente ocorreu) por aquela Ilha, como diz o maravilhoso musico Cubano Pablo Milanês: Cuba e Porto Rico son dos alas del mismo pájaro.. que quieren volar..."
Lembrar de Boal é lembrar das lutas populares , tocar os olhos nos humildes, nos desprovidos mas também naqueles que em outra situação sofrem os mecanismos da Opressão.
Algumas ressalvas mantenho, e são profundas, relacionadas especialmente ao TEATRO INVISÍVEL, não concordo que um jogo se estabeleça sem que ambos os jogadores estejam conscientes da trama armada e outra é que Bertolt Brecht, poderia muitas vezes ter sido citado como fonte de inspiração. Toda esta fonte de inquietação até o contemporâneo TEATRO Pós DRAMÁTICO, tem sua cama feita pelo poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht.

Boal, um arguto construtor da paz, te aplaudimos , enquanto ainda soluçamos nossa saudades.
Com amor
Carmen Fossari