Consciência Negra - Parabéns a quem a possui.
Na infancia me deparei com alguns fatos que não entendia muito bem naquela época, mas a medida que o tempo passava e ficava mais madura , compreendia a extensão daquilo tudo.
Nasci numa fazenda, em pleno sertão da Minas Gerais, onde quem mandava é quem possuía posses e obedecia quem tinha juízo ( os albergados, agregados, empregados que trabalhavam duro, em troca de teto para morar e comida para todos os dias. Em sua maioria eram negros.
Ainda criança, não entendia algumas ‘’coisas ruins’’ que presenciava contra esses empregados que, abaixavam a cabeça, chegando tocar o queixo no peito, tal era o constrangimento e vergonha, e eu, dentro da minha insignificância, nem sabia direito o que pensar, apenas queria tomar aquelas pessoas pelas mãos e oferecer algo que devolvesse o sorriso tão bonito, com aqueles dentes tão perfeitos, mas qual nada ! uma formiguinha nada vale, sozinha, inda mais contra os formigões.
Amava quando traziam as pequenas, da minha idade, pois enquanto as mães trabalhavam, eu brincava o quanto podia com elas. Meu encanto maior, era tentar descobrir o porque eu era ‘’desbotada’’ e elas, tão coradinhas. Pedia o braço delas e esfregava-os no meu e esperava que passasse a cor pra mim, mas nada. Coitada !!! com 4, 5 , 6.. anos, ainda era por demais boba, aquele mundo de antes não oferecia tanta informação como hoje (graças a Deus). Desde pequena, amava mexer nos cabelos das meninas e fazia ‘’lindas’’ tranças neles.
Aos 12 anos, já estudava na cidade e continuava desejando ser escurinha. Na escola, falaram-me que havia uma mistura que era ‘’tiro e queda’’ para ‘’corar’’enquanto tomava sol. Aproveitando as férias, quando sempre ia pra fazenda, levei o óleo que indicaram e, ansiosa, esperei todos se ocuparem e fui pra cozinha preparar aquilo que mudaria minha vida: Despejei um vidro de óleo jhonsons num outro pote, onde já havia quatro colheres de pó de café e quatro colheres de corante de urucum (usado para corar os alimentos) claro que dobrei a quantidade de tudo por garantia. Peguei meu biquíni e lá fui eu pro açude. Já de biquíni , espalhei tudo aquilo no corpo e fiquei das 09:00 ás 14:00 horas a assar feito churrasco, ora a frente, hora as costas. De vez em quando dava uma olhada por baixo pra ver como tava.
De repente ouço tropel de cavalos, afinei os ouvidos e lá vinham, meu pai e meus irmãos, mergulhei feito doida no mato e esperei que passassem, voltando em seguida para o sol, mas pensando melhor , tava na hora de sair dali, eles voltariam e se me pegassem daquele jeito a coisa ia ‘’esquentar’’ pra valer !
Cheguei em casa, tomei um bom banho... bem, nem sei o quanto foi bom, pois eu nem podia passar a mão na pele, aquilo doía pra danar, mas claro que eu pensava que era normal. Fui dormir mais cedo que todos e na manhã seguinte, ninguém entendia o motivo de tantos gemidos. Ao chegar na cozinha para o café da manhã, fui a maior atração daquele dia e de todos, enquanto durou as conseqüências daquela façanha .
Fiquei coradinha ??? claro que fiquei...é só lembrarem de um tomate bem maduro...e depois aquilo descascou tudo...nesse meio tempo as dores eram um castigo pra uma pobre branquela que sempre quis ser escurinha. Além de não conseguir ficar morena, ganhei primeiro o nome de ‘’pimentão’’ e depois, ‘’barata descascada’’. Fazer o que ???
* Minha carinhosa homenagem a raça negra, que não caberia aqui, se eu resolvesse escrever ‘’alguns nomes’’de alguns que ajudaram-me a escrever a minha história de vida e estão registrados em minha saudade.
Pra todos, trago flores virtuais e meu sentimento muito real.