MINHA PRIMEIRA NAMORADA  (Parte I)

 

 

Advertência: Este é um trabalho longo que escrevo como uma homenagem as nossas vidas, eu não sei se vale a pena ser lido, mas eu o publico como uma forma de gratidão ao primeiro e grande amor da minha vida.

 

 

 

Dedicatória

 

 

Rosarita da Silva

 

 

 

Senhora minha que foi muito amada, eu confesso que tive grande padecimento ao te escrever esta mal chamada história.

E bastante me doeram e custaram, mas a alegria e a coragem de oferecê-la a ti são maiores que uma campina sideral.

Tu e eu caminhamos por bosques e areais, por lagos perdidos e por primitivas praias, onde recolhemos fragmentos de madeira pura, verdadeiros lenhos que foram submetidos ao vaivém das águas e das intempéries.

Com os quais eu edifiquei esta pequena e mal chamada história, com o machado da minha modesta sabedoria, para que nela vivam os teus olhos que adoro e canto.

Assim ficam estabelecidas as minhas razões de amor, com o auxilio de Pablo Neruda nessa história, que humildemente eu te dedico, na verdade, a nossa história.

 

 

VERÃO DE 1960

 

 

Um amor revolucionário

 

 

Nessa época Cuba vivia uma guerra civil sem precedentes, e Havana acabava de ser tomada pelos revolucionários barbudos.

Esses guerrilheiros barbudos estavam sob o comando do caudilho da Sierra Maestra de nome Fidel Castro que, com a bandeira socialista, destronou o capitalista Fulgêncio Batista do poder, tendo este fugido às pressas para os Estados Unidos da América.

Nessa época nós também éramos revolucionários de Fidel Castro, quando a sua gesta revolucionária se espalhou pelo mundo, incendiando as cabeças jovens de todas as classes.

O desejo da juventude daquela época era o de socializar toda a América Latina, esse objetivo era bem claro nos discursos de Fidel Castro e de Che Guevara.

Depois de vencida a revolução, eles se transformaram em líderes incontestes da juventude e, por conseqüência, nossos líderes também.

Pois nessa época, estudávamos no Colégio Catarinense que era dirigido pelos padres Jesuítas, que eram fãs ardorosos de Fidel.

Pois o mesmo era um ex-aluno Jesuíta, resultando daí a nossa admiração por Fidel Castro e por Che Guevara.

E assim, eles se tornaram ídolos da juventude da época, verdadeiros libertadores da tirania capitalista yanque, exercida pelos Estados Unidos com o seu imperialismo desumano e cruel.

Foram os anos sessenta o portal para a politização da juventude que, até então, não participava politicamente dos movimentos reivindicatórios, pois essa juventude havia sido obliterada por Getúlio Vargas.

Essa foi uma das conseqüências dessa ditadura fascista que, politicamente, castrou gerações, alcançando até aos nossos dias.

Éramos uma juventude sem líderes, e agora surgia na América Latina, um revolucionário que traduzia todos os anseios dessa mesma juventude em efervescência.

Bom, nessa época em que se vivia uma enchente revolucionária socialista e, por contingências do destino, na mesma época eu também passei a viver uma revolução.

Não uma revolução armada ou uma revolução política, mas sim uma revolução interna, uma revolução emocional em que, todo o meu ser passou a lutar com uma tocaia grande, a tocaia do amor e da paixão.

Bom, eis a seguir a história:

Foi no princípio do verão de 1960 que, eu me apaixonei pela primeira vez na minha vida.

Tanto era o amor vivenciado nessa juventude atormentada que se poderia dizer, foi um romance na sua mais alta concepção do termo, um verdadeiro idílio de fazer inveja a Romeu e Julieta.

Nesse verão, eu conheci uma menina que na época contava com apenas doze ou treze anos de idade, era uma menina graciosa de cabelos pretos, portava um penteado que hoje poderia ser chamado de um “tipo Chanel”, ela era possuidora de um olhar inconfundível e penetrante, às vezes, me parecia ser falsamente estrábica e eu acho que me apaixonei pelo seu lindo olhar.

Como a conheci eu não lembro muito bem como foi, entretanto eu lembro que estávamos sentados numa praia, embaixo de uma grande figueira velha, a espera da emenda de bagres que não demoraria a chegar, eu acho que foi esse o momento do nosso primeiro embate íntimo.

Ali sentados e já emocionalmente envolvidos um pelo outro, travávamos timidamente o nosso primeiro encontro, e as nossas primeiras conversações eram um misto de nervosismo e expectativa.

Tudo era feito com a maior discrição, pois ao nosso redor estavam dezenas de pessoas (senhoras), que também esperavam a chegada da emenda com os peixes.

Como se diz hoje em dia foi uma paixão a primeira vista; verdadeiros relâmpagos rebeldes de verão ou relâmpagos novos em corações jovens, uma tempestade de amor que viria a varrer nossas vidas e as nossas almas.

Ficamos conversando em torno de umas três horas, quando relatávamos fatos e acontecimentos corriqueiros das nossas vidas de estudante.

Nesses momentos, eu bebia avidamente cada palavra sua, pois ela era mansa e suave como o cantar do rouxinol.

Lembro-me muito bem de estar rabiscando muito na areia com uma varinha, fato que ela também passou a fazer a mesma coisa, eram desenhos abstratos, riscos sem sentido e confusos, talvez a projeção inconsciente dos nossos destinos, entretanto e de vez em quando ensaiávamos o desenho de uns corações.

Aqueles corações que foram desenhados sem muito jeito na areia, eram os nossos primeiros gritos emocionais, pois ali estavam sendo expostos todos os nossos desejos e os fortes anseios mais do que ocultos.

Talvez Jung explicasse esse comportamento do ser humano, diante e quando se depara com a sua alma gêmea, vivendo os frêmitos no inesperado embate anímico.

Os nossos desejos vagavam velozmente e, a cada risco na areia, eu tenho a impressão que, ficavam perpetuados os nossos caminhos para o futuro.

Eu realmente me apaixonei por ela, isso era visível em mim mesmo, e ela também se apaixonara por mim.

Tudo aconteceu num lance mágico do destino, esse caminho incompreensível dos humanos que, não há força humana que o detenha e nem diz o que realmente vai acontecer dali para frente.

No fundo, no fundo da minha existencialidade como ser humano sensível, ainda sou apaixonado por aquela menina de cabelos tipo Chanel.

Digo isto sem constrangimento nenhum, pois ela permanece dormitando com todo o seu encanto em meu coração, eu creio que é um sentimento que vive num passado longínquo e cheio de saudades.

Ah, se eu pudesse voltar e viajar no tempo, isso seria um reencontro sublime, seria a ressurreição de todos os sonhos que foram soterrados pelo próprio tempo, seria indizível a sublimação do amor, agora mesmo já com os meus cabelos prateados.

Não posso simplesmente apagar o passado, pois ele é indestrutível, e o meu presente se transformou num fardo pesado, que eu carrego calado e triste.

Assim vivo ensimesmado com este carma que tento expurgá-lo, a fim de merecer uma reciclagem menos severa em outra vida, se houver outra vida após essa minha vida.

Eu sei que hoje não é mais possível ressuscitar aquele amor que, de tão bom e puro, eu fiz naufragar em sofrimentos, mas permanece em mim a figura irremovível daquela criatura linda, brejeira e doce que, com o passar do tempo, se transformou na mãe dos meus três primeiros filhos.

Fato esse que, até hoje, eu agradeço a Deus por ser ela a mãe devotada dos meus filhos.

Ah, se houvesse divindade em minhas mãos, por certo, eu a transformaria na minha deusa, uma deusa floral ou uma rosa sideral que desabrochasse em meu coração, e que preenchesse os meus últimos dias e afastasse de mim todas as amarguras, todas as saudades e todos os sofrimentos que acumulei.

Voltemos à história...

Feitas as iniciais apresentações, agora cuidávamos para que pudéssemos nos encontrar nos dias de férias que ainda restavam.

Num certo domingo nos encontramos na casa de Dona Amália, mãe de uma amiga nossa, a Neuza.

Lá ficamos uma tarde inteira, sedo que essa mesma tarde foi a mais promissora, pois naquele momento já fazíamos juras e promessa de amor eterno.

Lembro-me muito bem de ter feito uma besteira com a jovem Rosarita (Zeta), da qual até hoje me arrependo.

Num desses lances incompreensíveis, com os fósforos, eu queimei os seus lindos dedinhos, uma brincadeira de mau gosto, pois talvez quisesse inconscientemente marcá-la de modo indelével para mim.

Depois, eu me arrependi amargamente dessa brincadeira infantil e sem sentido.

Foi uma tarde inenarrável, pois comungávamos em silêncio aquele amor adolescente, dávamos a impressão de ter descoberto a porta do paraíso e o mundo nos sorria a todo o instante.

Vivíamos a aurora radiante da juventude, cheia de sonhos, desejos e anseios contidos.

Depois desse domingo, nós tivemos mais alguns encontros.

Certa noite eu a encontrei em frente à casa da Sílvia, uma amiga nossa, eu com a minha bicicleta verde de pneu balão fazia-me presente todo orgulhoso, pois já tinha uma bicicleta e uma namorada linda.

Nessa noite, a lua cheia esparramava a sua luz leitosa pelas montanhas e pela lagoa nas adjacências, era realmente um cenário de magia e encantamento e, a cada dia, ficávamos mais apaixonados um pelo outro.

Mas a sombra de uma partida iminente, já se fazia sentir a dor incompreensível das saudades antecipadamente sentidas.

Era indizível e mais do que lírico o nosso novo amor, pois sentíamos uma grande afeição amorosa sem comparação.

Terminado as férias ela foi embora e na sua partida chorei as minhas saudades antecipadas, pois sentia que iria perdê-la para sempre.

Eráclito Alírio da silveira
Enviado por Eráclito Alírio da silveira em 25/09/2008
Reeditado em 26/09/2008
Código do texto: T1195470