Antonio Malheiros da Cruz

Antonio Malheiros da Cruz, 76 anos, destes, 31 vividos no Parque das Emas, reserva ecológica situada em Mineiros-GO. Eis o homem que começa a falar para mais ou menos 40 pessoas, entre jovens e adultos, durante a Caminhada Cultural e Ambiental Antonio Malheiros. Idéia gerada a partir de um grupo de discussão: Fórum de Tradições Populares do Cerrado, do qual fazem parte organizações teatrais, grupos militantes e pessoas afins.

Às 21h30min., o 3884 dá sinais de sua passagem, sente-se o pulsar no chão e o barulho inconfundível de trem. Através de imagens projetadas, Sr. Antonio nos descreve um pouco da “fisionomia do cerrado”: campo limpo, campo sujo, de altitude, cerradão, matas. Quando o solo é fértil, mata exuberante. A mata seca fica vulnerável ao fogo “se o fogo tá queimando é pro cerrado renová” canta Alba Franco, do Sons do Cerrado. Os olhos passeiam pelas paisagens: buritirama, pindaíba, veredas (varjões e buritizais), matas especializadas nas margens dos rios.

Dezenove de agosto 1978, Sr. Antonio relembra a maior queimada que seus olhos já viram, 95% da área do parque em cinzas. Fogo que queima contra o vento, ficam os talos. Fumaça branca é menos nociva, ao contrário da negra que se veste dos nutrientes do solo, empobrecendo-o. A luta do homem contra as queimadas: manejo do fogo de dois em dois anos. Os galhos tortos das árvores são guerreiros, queimada a parte de baixo, o novo galho continua em outra direção. Cena triste de se ver: os bichos judiados pela seca tendo de correr da morte quase certa. Tamanduá em chama viva! Abençoa Senhor, a dura semente caída no solo, latente, que com o fogo germina, promessa de vida nova.

Relações de cooperação: o lobo-guará come a lobeira, pois esta o defende de um tipo de verme fatal para o mesmo e este, acaba se tornando um dispersor da semente. O urutau (um pássaro que se parece muito com troncos de árvore) usa de camuflagem e de seu famoso mau-hálito para atrair moscas e outros insetos.

O nobre Sr. Antonio Malheiros da Cruz nos apresenta a “beleza da fisionomia do cerrado e seus ricursos” – mutamba, pequi, cagaita, barbatimão e outra que ele não se lembra o nome. “Araticum é madeira branca, não vira cadeira de rei”... A música nos acalanta, um estandarte é oferecido para coroar a sapiência do grande homem, que nos abençoa com uma última imagem – o crepúsculo de um entardecer e diz: “o sol que está se pondo vai aparecer amanhã na caminhada, aprende com as pessoas simples do interior, percebe na riqueza de uns, a miséria de outros, não faça nada esperando reconhecimento, faça porque você acredita”.

“A vida toda eu vou falar uai, uai,

a vida toda eu vou falar ocê,

assim falava meu avô, meu pai,

sou caipira logo já se vê”.

Lígia Martins
Enviado por Lígia Martins em 21/09/2008
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