ARACY GUIMARÃES ROSA

Não é surpresa nenhuma para nós brasileiros vermos estampado em páginas de jornal, revistas ou nas manchetes das televisões, os canalhas e embusteiros que dilapidam o patrimônio físico e o erário; não é surpresa para os sensatos e estudiosos, saber da falta de caráter que a história impôs a alguns povos através de déspotas como Mussolini e Adolf Hitler, onde o ódio e a descriminação fascista mandaram para o túmulo, milhares de centenas de seres humanos trabalhadores; que o digam os judeus.

Estamos acostumados a ver e ouvir falar de monstros, ladrões, crápulas, assassinos; e isso é tão forte que a nossa cultura de formação de caráter já dá sinais de enraizamento destes traços na nossa juventude; o que não estamos acostumados a ver e ouvir falar são dos heróis, os verdadeiros heróis que poderiam ter livros, filmes, revistas, bustos em jardins em suas homenagens, mas que insistem em permanecer anônimos, pelo menos para a maioria; caso concreto de Aracy Guimarães Rosa, uma mulher de fibra e valor inestimável; brasileira natural que possui destaque até nas Nações Unidas, mas que a maioria de nosso povo sequer ouviu falar.

Aracy Guimarães Rosa foi à segunda esposa de João Guimarães Rosa, escritor famoso; mas que não fez sua fama através do marido e sim por causa de seus atos notórios de humanidade em favor de uma causa, de um povo; os judeus perseguidos durante a 2ª Grande Guerra.

Aracy Moebius de Carvalho é seu nome de batismo, nasceu no Paraná em 1908, filha de um brasileiro com uma alemã. Casou-se cedo e também se separou do primeiro marido, quando foi morar na Alemanha com uma tia; falava quatro idiomas e por este fato inusitado, conseguiu uma colocação por nomeação no Consulado do Brasil em Hamburgo, na seção de vistos. Em 1938, quando entrou em vigor a Circular 1.127 por Decreto, que proibia a entrada de Judeus no Brasil, Aracy ignorou o documento e não parou de preparar vistos para judeus perseguidos. Quem conseguia o visto de entrada no Brasil estava praticamente salvo das atrocidades que ainda viriam a acontecer.

A própria história não conta ao certo, mas algumas pessoas que conviveram com esta verdadeira heroína brasileira afirmam que ela própria ajudou a mais de 100 pessoas de origem semita a se livrarem do horror da morte. A biografia desta brasileira já lhe rendeu menções honrosas nos quatro cantos do planeta, inclusive nos Jardins dos Justos entre as Nações, no Museu do Holocausto em Israel. Eu só não tenho conhecimento de seu valor perante seu próprio povo, nós brasileiros. A história de Aracy Guimarães Rosa é comparada a de Oskar Schindler, famoso, sobretudo após virar tema do premiado filme, A Lista de Schindler.

A lista de heroísmo de Aracy, segundo relatos históricos, não parou por aí; não foram somente os judeus que ela heroicamente arriscou a pele para salvar “a dos outros”; ela e João Guimarães Rosa (já casados), ajudaram outros personagens da história do Brasil a se verem livres das garras da ditadura, como o jornalista Franklin de Oliveira e o cantor Geraldo Vandré.

Se alguém pensar que Aracy é judia, estará enganado; Aracy Guimarães Rosa é um dos nomes não judeus que consta da lista de heróis de Israel, que eles chamam carinhosamente de “góim”; além dela, apenas outro brasileiro recebeu esta mesma honraria, que foi o Embaixador Luiz de Souza Dantas, falecido em 1954.

Esta mulher de aço, que desafiou várias vezes o seu tempo, ainda é viva, mora em São Paulo e prestes há completar 100 anos, vive em total esquecimento; não quis se promover pelo fato inusitado e não fosse o rótulo de ter sido esposa de um vulto da literatura brasileira, um revolucionário que mantém sua obra viva, com certeza estaria ainda pior; coisas de brasileiro, que enaltece os imundos e esquece os verdadeiros heróis.

Apenas para refrescar a memória e informar aos ignaros, o nazismo matou sem piedade milhares de pessoas ao longo de sua história de terror; era comandado por Hitler, sem dúvida alguma, um dos mais bárbaros sanguinários que o inferno já pariu e Aracy Guimarães Rosa desafiou em solo alemão a Gestapo de Hitler, temida polícia nazista que matava e não perguntava quem era. Dizem os que conviveram com ela na Alemanha que por várias vezes a moça brasileira foi vista aos berros com os assassinos nazistas, sendo que ela, sempre de dedo em riste para defender algumas de suas teorias ou para defender seus amigos judeus. Não se sabe ao certo por que, mas a heroína brasileira jamais teve problemas maiores com os homens de Hitler, muito menos com Getúlio Vargas, que era uma espécie de “nem morde, nem assopra” com relação aos Aliados e os Nazistas.

Falam de uma pesquisa que está sendo feita na Alemanha e no Brasil que retratará a história de Aracy; eu descobri Aracy através de Henry Soltz, um amigo judeu; mas e o Brasil? Será que a história ignorará mais uma vez uma história verdadeiramente de heroísmo? Seria bom que pudéssemos homenageá-la ainda em vida, ao invés de flores sórdidas e mentirosas numa lápide fria e esquecida em um cemitério qualquer.

Fica aqui a minha singela contribuição!

Carlos Henrique Mascarenhas Pires

Site do Autor: www.irregular.com.br