HAIKAIS IMPERFEITOS (192): Florbela Espanca ou Galiza...

De Florbela Espanca copio este soneto, tendo presente as mensagens estranhas de uma (?) Flor Bela Spanca, não autenticada, visitante do “Recanto das Letras”. Mas sobretudo entendendo que Florbela pode ser estimada símbolo ardente (e triste) da Galiza, a Spanca parece desconhecer.

Diz o soneto da poeta portuguesa intitulado "Alma perdida":

Toda esta noite o rouxinol chorou,

Gemeu, rezou, gritou perdidamente!

Alma de rouxinol, alma da gente,

Tu és, talvez, alguém que se finou!

Tu és, talvez, um sonho que passou,

Que se fundiu na Dor, suavemente...

Talvez sejas a alma, a alma doente

Dalguém que quis amar e nunca amou!

Toda a noite choraste... e eu chorei

Talvez porque, ao ouvir-te, adivinhei

Que ninguém é mais triste do que nós!

Contaste tanta coisa à noite calma,

Que eu pensei que tu eras a minh'alma

Que chorasse perdida em tua voz!...

Pela Wikipédia pode conhecer-se de que Florbela Espanca nasceu em Vila Viçosa, em 8 de dezembro de 1894, e morreu em Matosinhos, em 8 de dezembro de 1930. Esta poeta portuguesa foi batizada com os nomes de Flor Bela de Alma da Conceição Espanca. A sua vida, de apenas trinta e seis anos, foi plena, embora tumultuosa, inquieta e cheia de sofrimentos íntimos que a autora soube transformar em poesia da mais alta qualidade, carregada de erotização, feminilidade e panteísmo.

Com certeza, não sei por que a Spanca tomou tal pseudónimo... Poderia singelamente alargar o comentário da Poeta Galega: "Curiosa Spanca não autenticada que não distingue a meixela do galego..." Talvez não distinga quase nada de nada... Ou sim é capaz de distinguir e procura esconder essa capacidade.

Por isso agradeço e consinto com Kathleen: "Aqui POESIA, AULA e DEBATE. Manhã cultural para mim."

Agora apenas vou mal redigir algum haikai ao caso (ou ao descaso, quem sabe...). Mas antes, olhem o que João Vicente Biqueira, filósofo e ativista cívico, escrevia antes de 1924, ano a sua morte, sobre a situação político-cultural da Galiza, da sua Galiza, da nossa Galiza, "nossa" por ter sido mãe e senhora da Lusofonia, hoje agonizante lá, aqui, na Galiza:

Autonomia

I

Quando se coloca, no nosso país, o problema da autonomia, as vozes dos representantes da velha e decadente Espanha, da Espanha de Filipe II [I de Portugal], que não sabe olhar por riba das fronteiras, dizem: “As pretensões autonómicas são inauditas, nunca se viram”. Entrementes,

florescem os Estados Unidos de [Norte] América, Inglaterra, e Suíça no meio da Europa, incólume e misturada, ilha de paz. E Inglaterra, os Estados Unidos, Suíça devem o seu poder e florescimento, a sua grandeza, a sua importância, aos princípios autonomistas.

II

Estes representantes dos ruinosos tempos que não voltarão, dizem também que o nosso movimento é anti-espanholista. Eu pergunto: “Que mais anti-espanhol e estrangeiro que o centralismo realizado pelas dinastias alemã e francesa dos Áustrias e Bourbões, que destrui a essência de Hespanha, que é ser uma admirável confederação de nações? Hespanhol sou eu, mas duma Hespanha grande, futura, ainda por fazer, onde a suprema lei seja a liberdade; onde sejam livres as nações que a formam, livres os municípios ou concelhos, eminentemente livres os cidadãos, e que se amplie duma Ibéria que com novos factos assombre o mundo.

III

Mas agora que o problema é rude e áspero já, às vezes, não se fala contra a autonomia. O que se quer é não combatê-la, mas fazer dela (fonte de liberdade que é) arma para assovalhar-nos novamente.

Estamos fartos de escravidão. A Galiza, do fundo do seu ser, exige a autonomia integral, condição para ela ser grande, mas uma autonomia radicalmente democrática. Treme a nossa raça como um gigante dorminhento e ameaça com um medonho despertar!

IV

Galegos, sede dignos de vossos avôs, os Irmandinos, que há cinco séculos se ergueram na Galiza procurando reger-se por si mesmos e não terem donos. Galegos, sede dignos de viver entre as

novas democracias do mundo. Arda nos vossos peitos lume santo de amor pelas cousas nobres e saia só dos vossos lábios o clamor dos povos grandes: Liberdade ou morte!

Por fim, "hakaieio" liricamente:

Liberdade ou morte!

Mas nem liberdade livre:

Só morte, só morte...

Morrem-nos num reino

De escravidão rude e áspera:

Só morte, só morte...

Galiza “heterónoma”:

Rendida, medonha, triste:

Só morte,só morte...

Desperta já e ergue-te:

Torna-te mãe e senhora:

Liberdade e Vida!