Dia do Saci - 05 haicais

Dia do Saci - 05 haicais

01. no tão sertão

vale a lei do murici --

dia do Saci

02. ventou no bambú

e tinha um saci lá dentro

assobiando agourento

03. vem pé de vento

pé de pinto, pé de pato --

Saci vaga no mato*

04. das grimpas do pequi

cai botão, cai fruta verde --

o Saci faz suas artes!

05. saltando num pé só

sempre cheio de trê-lê-lê --

Saci Pe-re-rê

Tempos atrás, alguém encasquetou com a introdução do Halloween no Brasil e tocou uma campanha para a criação do "Dia do Saci", como forma de preservação e prestígio das coisas da nossa cultura e do nosso folclore. Deu certo e pode acabar virando lei. Assim, no dia em que muitas escolas promovem a tal festa, também conhecida lá fora como "Dia dos Mortos", foi estabelecido como o dia do símbolo máximo do folclore brasileiro.

O deputado Chico Alencar (PSOL - RJ) é quem patrocina o projeto de a respeito, que levou o nº 2.762, de 2003. Mas, informalmente, ele já é celebrado no dia 31 de Outubro.

E, a figura do Saci Pererê - figura sincrética que tem características de diferentes culturas e povos, reune em si, quase todas aquelas características encontráveis indivualmente nas figuras presentes na festa estrangeira. Ele é inteligente, belicoso, matreiro, inconsequente e um tanto imprevisível. Mas, ao lado disso tem interessantes qualidades da irresistível simpatia e alma brasileira.

A título de comemoração (ou, como queiram, alguma resistência) do "Dia do Saci", compus uns haicais onde o personagem é retratado, tendo muito há ver com a imagem do Saci do tempo da infâncias, dos clássicos livros de Monteiro Lobato, do simpático Pererê - a criatura mais ativa e simpática da "mata do fundão", criado pelo cartunista Ziraldo e, o personagem de uma música de Jorge Ben Jor, feita para um programa de TV, exibido tempos atrás.

Mas, a figura do Saci, para mim tem algo de força e imagem profundamente enraizada na memória: nasci e vivi na zona rural do município de Turvânia - Goiás, até os nove anos de idade. Se havia uma entidade que eu e a minha turma respeitava, na época, era o Saci Pererê (muito embora eu, como toda a meninada, também andasse precavido quanto às aparições do "pai do mato (conhecido em outras regiões por caipora)", a mula sem cabeça, o boi tatá e misterioso "pé de garrafa", que, eu creio, era uma figura conhecida somente numa região entre o vale do Rio Turvo e o Rio dos Bois. Era um misto de temor e fascínio, o que movia a nossa imaginação em torno de sua figura curiosa, mítica e, livre.*

Se estivéssemos numa caçada de estilingue e algo assoviasse tão alto e forte que nos assustasse no mato ou na capoeira, aquele fato era logo colocado na conta do Saci arteiro. Se o estilingue estourasse uma goma, na hora de atirar contra um passarinho, se fossemos surpreendidos por um estouro de boiada, ou pegos uma ventania inesperada, sempre atribuíamos a culpa ao malandro do Pererê – que coincidia com a prática dos mais velhos, que também gostavam de dizer (talvez para nos meter mais curiosidade ou medo) que muitos eventos eram da iniciativa do coisinha ruim: cercas de divisa abertas, nós nos pelos das montarias, ninhadas de ovos perdidas e, assim, ia...

Aventura pelas matas e regiões distantes, só em grupo: ninguém queria topar com o Saci pelo caminho, para ser interpelado por fumo para seu cachimbo, pois a negativa poderia render um troco terrível.

Mas, é claro: quem pegasse um Saci e o colocasse na garrafa, poderia virar seu mestre, e exigir dele o que ele pudesse fazer. Por isso, não foram poucas, as vezes em que eu e meus primos fizemos vigília diurna à porta da casa, esperando a passagem dos redemoinhos de agosto, com a peneira (cruzeta de taquara de cor diferente ao centro), para nos atirar contra ele e tentar atingir seu epicentro, onde dizia as lendas estar abrigado a danado.

Mas, por falta de possibilidade prática ou receio de não possuir destreza suficiente para controlar o danado depois de pego, a turma dava sempre um jeito de fracassar no intento, muito embora, voltássemos pra dentro de casa em bando e cheios de bravata, ressalvando nossa destreza e coragem, na caça do buliçoso e traquina Saci Pererê, aquele tipo risonho, esperto, poderoso e ameaçador, que fazia parte de nosso imaginário e dia a dia...

........................................

* Existe hoje uma associação nacional de observadores do Saci Pererê - cujo objetivo principal, naturalmente, é a preservação de sua figura mítica e do folclore.. Aqui está o link do site dela:

http://www.sosaci.org/