HAICAIS DA CONTEMPLAÇÃO DA PRIMEIRA LUA CHEIA DO OUTONO
Amado meu: hoje estive reunida, no Templo Busshinji, budista, com os membros do Grêmio Haicai Ipê, ao qual tenho a honra de pertencer, para realizarmos a atividade da contemplação da primeira Lua do outono, atividade que tem um significado simbólico muito importante para os haicaístas, no Japão e onde quer que se pratique o haicai na sua vertente tradicional.
O céu esteve nublado na maior parte do tempo, mas, em certo momento, a Lua houve por bem transpor a barreira das nuvens e dos prédios e se mostrar inteira para nós, em toda a sua magnificência. Conseguimos, então, escrever nossos haicais em homenagem a ela, Lua, que até então vínhamos escrevendo apenas sobre a sua ausência, sua invisibilidade.
Tens andado demasiado triste, amor. Estás magro demais, vens de muitas perdas, não tenho como ressarcir-te de nenhuma delas; essa impotência dói fundo em mim, dói além de toda medida, então permite que eu te ofereça os três modestíssimos haicais que lá escrevi, os dois primeiros antes da aparição da Lua, o terceiro após tal aparição. No primeiro destes haicais eu me refiro aos degraus que tive que vencer para chegar ao terraço do Templo (tu sabes o quanto subir e descer escadas se me tornou ato de grande heroísmo)
Depois que fizemos nossos haicais, tomamos suco, comemos sushis e salmão, lemos uns para os outros nossa escrita e, por fim, escolhemos os poemas de que gostamos mais.
Eis os meus, que te ofereço, amor meu:
São muitos degraus
e nuvens demais no céu.
Saudade da Lua.
Terraço do templo.
Quantos mais estão à espera
da Lua-desta-noite?
A Lua entre os prédios
vai-e-vem, vem-e-vai.
É noite de abril.
No início da madrugada de 19 de abril de 2011.