HAICAIS DAS QUATRO ESTAÇÕES

DE PRIMAVERA

Chega a primavera.

Perfumes transpõem muros

destes casarões.

Os guris perseguem

breves bolhas de sabão.

Ah! Vida translúcida.

As flores do ipê.

Até o cachorro cego

parece feliz.

Da página aberta

salta a pétala seca.

Primavera antiga.

DE VERÃO

Os trovões ribombam.

O pequeno cão Valente

treme no meu colo.

Cartão de Natal.

Jesus ainda está dormindo

no colo de Maria.

Vejo, do sombral,

o rendilhado das folhas.

Ah! Sol tecelão.

Saída da feira

pausa na primeira banca:

Pastel e água de coco.

DE OUTONO

Dia da Paixão.

Mãe com o filho, na calçada,

e uma cruz no olhar.

Boca cheia d’água.

A trouxinha de pamonha

sendo desatada.

Relâmpago azul.

Crescem os olhos da criança

no colo da mãe.

Pelas alamedas

o falatório dos grilos.

Segredos nas árvores.

DE INVERNO

A garoa cai.

Cintilam poças na rua

À luz dos faróis.

Velho de bengala.

Mesmo frágil, o sol de inverno

aquece-lhe as mãos.

Fogos de artifício.

As crianças batem palmas

ao voo de estrelas.

Os pés dos passantes

marcam as folhas caídas.

Assim, certas vidas.