Período tenso e período frouxo

Existe uma discussão pedagógica sobre o ensino de análise sintática nos ensinos fundamental e médio. De nossa parte, não temos dúvida: desde que não se faça uma análise apenas pela análise, o estudo de sintaxe – se bem-orientado – tem sua inquestionável serventia no aprendizado da língua, no seu uso com mais segurança, no seu emprego com mais elegância.

Querem um exemplo que põe certa luz sobre a questão? Falemos de orações adverbiais. Se o aluno apenas classifica as orações, é possível que ele se desgoste do assunto. Que serventia teria saber que uma oração é classificada como subordinada adverbial temporal reduzida de gerúndio, por exemplo? Certamente nada mais que o conhecimento de nominar, de classificar – importante, naturalmente, para os especialistas no assunto, mas o usuário comum viveria (e muito bem!), sem declinar um nome tão comprido, que estaria, inclusive, a sobrecarregar-lhe a memória. Agora, convenhamos, se o estudo das orações levasse à compreensão da pontuação, já estaríamos falando de algo muito relevante. E para isso nossos professores e nossos estudiosos têm ficado atentos, desde muito tempo. Felizmente!

Falemos mais um pouco das orações adverbais. Vou me ater a exemplos com duas delas: as temporais e as condicionais. Observem: ‘QUANDO UM NÃO QUER, dois não brigam’ e ‘SE LÚCIA PUSER OS PÉS AQUI EM CASA, ela será muito bem-vinda’. Nesses períodos compostos, as orações em destaque classificam-se, respectivamente, como subordinada adverbial temporal e subordinada adverbial condicional, e, obviamente, a outra oração, em cada um dos períodos, é classificada como principal. Até aqui, caminhamos bem?

Continuemos. Em princípio, a oração principal contém o sentido mais importante do enunciado, quando se agrega a ela uma subordinada adverbial. Assim considerando, ‘dois não brigam’ e ‘ela será muito bem-vinda’ trazem a informação mais relevante, em seus respectivos períodos.

Como veem, a ideia central encontra-se no final dos períodos. O que se quer dizer é que, do ponto de vista estilístico, deixar a ideia mais importante para o final torna a construção mais expressiva, mais enfática – cria uma expectativa no leitor. Além do mais, como a oração subordinada, isoladamente, não possui sentido completo, o simples fato de dizê-la cria um suspense, que é desfeito na sequência. Concordam? Nesse caso, estamos nos valendo de um período tenso – terminologia usada pelo professor Othon Moacyr Garcia, no livro ‘Comunicação em prosa moderna’ (diga-se de passagem, um clássico sobre a língua portuguesa).

Vamos então reescrever os períodos, usando as orações principais no início: ‘Dois não brigam,/ quando um não quer’ e ‘Lúcia será muito bem-vinda,/ se ela puser os pés aqui em casa’. Nesses casos, percebam que, quando o leitor termina a primeira a oração, a sua expectativa é bem menor, porque o principal já foi dito. A esses períodos sem ênfase, pouco expressivos, o professor Garcia chamou-os de períodos frouxos ou lassos.

Cabe dizer que uma outra forma de redigir período tenso consiste em deixar a ideia principal nos extremos, ficando no meio a ideia secundária. Vejam os exemplos, com as respectivas classificações estilísticas:

Os funcionários conseguiriam melhores salários,/ se fizessem greve. (período frouxo, ideia central no início)

Se fizessem greve/, os funcionários conseguiriam melhores salários. (período tenso, ideia central no fim)

Os funcionários, [se fizessem greve], conseguiriam melhores salários. (período tenso, ideia central nas extremidades)

Como veem, repito, a sintaxe pode estar a serviço do estilo, da expressividade, da ênfase. E, nesse sentido, é importantíssimo conhecê-la.

Não seria à toa que Roberto e Erasmo começam uma de suas canções assim: “QUANDO EU ESTOU AQUI, eu vivo esse momento lindo”. Também não seria à toa que Drummond inicia assim o seu famoso Poema de sete faces: ‘QUANDO EU NASCI, / um anjo torto [...] disse...”.

Os mais antigos certamente se lembram de um comercial de desodorante que dizia isto: ‘[...] SE, DE REPENTE, UM DESCONHECIDO LHE OFERECER FLORES, isso é… Impulse’. Comecem com ‘Isso é ...Impulse’ e avaliem o desastre publicitário.