VERSIFICAÇÃO
 
    Versificação é a técnica de fazer versos.
    Verso é a linha poética, com número determinado de sílabas e agradável movimento rítmico.
    Os elementos principais do verso são: metro, ritmo e rima.
       
      Metro — é a extensão da linha poética. Metrificar ou escandir significa    decompor o verso em sílabas métricas. As sílabas mé­tricas são, muitas vezes, diferentes das sílabas gramaticais. 

Princípios da Metrificação
1. Quando há vogal no final de uma palavra e vogal no início da palavra seguinte, conta-se apenas uma síla­ba:
      gran / de a / mor
Observações:
a. as vogais que formam uma sílaba métrica devem ser átonas e não devem passar de três:     
      be / la au / ro / ra
b. o “a” craseado não é considerado sílaba átona:
      Em / al / gum / lu /gar / teus / o/ lhos / se/ fe / cham / à / i / de / ia / dos / meus/. 
                                       (Vinicius de Moraes)
2. A contagem de sílabas métricas faz-se somente até a sílaba tônica da última palavra:
      Can / ção / à / vi / da / por / te / ver / sor / rin / do.
                                       (Jorge Armenio)
3. Os ditongos, geralmente, formam uma só sílaba métri­ca:
      pá / tria / ge / ne / ro / sa
4. Os hiatos mantêm, em geral, as vogais separadas:
      O / pen / sa / men / to / ru / im / que / a / ca / be / ça en / tra / nha
                                       (Peninha)

      Existem alguns processos fonéticos aos quais os poe­tas recorrem para que o metro seja perfeito:
1. Sinalefa — é a união de duas sílabas através de:
a. crase — fusão de duas vogais iguais em uma só:
      minha alma = mi / nh'al / ma
b. elisão — queda da vogal átona final de urna palavra quando a palavra, seguinte   começa por vogal:
      minha infância = mi / nh’ in / fân / cia
2. Diérese — transformação de ditongo em hiato:
      sa / u / da / de
3. Sinérese — transformação de hiato em ditongo:
      vio / le / ta
4. Aférese — queda de fonema ou sílaba inicial:
      'Sta / mos / em / ple / no / mar/.                                      
                                       (Castro Alves)
5. Ectilipse — queda do M final de uma palavra, quando a palavra seguinte começa por vogal:
      com a =  co’a
      com um =  co’um  ou c'um
6. Paragoge ( = Epítese) — acréscimo de fonema no final da palavra:
      mártire (por mártir)

      Ritmo — é a musicalidade do verso. Quanto ao número de sílabas métricas, o verso pode ser:
 
1. Monossílabo — com uma sílaba:
      Quem /
      não /
      tem /
      seu /
      bem /
                                       (Cassiano  Ricardo)
2. Dissílabo — com duas sílabas:
      Um / rai / o
      ful / gu / ra
                                       (Gonçalves Dias)
3. Trissílabo — com três  sílabas:
      Vou / de / pres / sa
      vou / cor / ren / do           
                                       (Manuel Bandeira)
4. Tetrassílabo — com quatro sílabas:
      Que / quer / o / vem / to
                                       (Ribeiro Couto)
5. Pentassílabo ( = Redondilha Menor) — com cinco sílabas:
      A / noi / te / pa / ra / da...
                                       (Mário Quintana)
6. Hexassílabo — com seis sílabas:
      Vi / da / te / nho / uma / só /
                                       (Ferreira Gullar)
7. Heptassílabo ( = Redondilha Maior) — com sete sílabas:
      Com / as / lá / gri / mas / do / tem / po
                                       (Vinícius de Moraes)
8. Octossílabo — com oito sílabas:
      O / bran / co / não / é / u / ma / cor /
                                       (João Cabral de Melo Neto)
9. Eneassílabo — com nove sílabas:
      O / ven / to / brin / ca / va / tra / ves / su / ras...
                                       (Ciça Dutra)
10. Decassílabo — com dez sílabas. Ele pode ser:
a. heroico — com acento na sexta e na décima sílabas:
      Pas / sa / ra  a / vi / da in / tei / ra a / com / tem / plar / te
                                       (Gonçalves Dias)
b. sáfico — com acento na quarta, na oitava e na décima sílabas:
      Al / ma / de / fo / go / co / ra / ção / de / la / vas
                                       (Álvares de  Azevedo)
11. Endecassílabo — com onze sílabas:
      A / mo  a a / ven / ca / de / li / ca / da / que / re / nas / ce
                                       (Cora Coralina)
12. Dodecassílabo ( = Alexandrino) — com doze sílabas:
      O ou / ro / ful / vo / do o / ca / so as / ve / lhas / ca / sas / co / bre
                                       (Olavo Bilac)
Observações:
a. chama-se ―Verso Bárbaro o que possui mais de doze sílabas:
      Que / har / mo / nia / pa / ra / di / sí / a / ca / na / dan / ça / dos / pa / ra / nás /
                                       (Pereira da Silva)
b. chama-se Verso de Ritmo Livre o que não tem o número e a disposição das sílabas átonas e tônicas uniformes e coincidentes:
     
      O poeta
      declina de toda responsabilidade
      na marcha do mundo capitalista
      e com suas palavras, intuições, símbolos e outras armas
      promete ajudar a destruí-lo
      como uma pedreira, uma floresta
      um verme.
                                       (Carlos Drummond de Andrade)
c. chama-se Cesura a pausa interna, que possuem os versos longos (geralmente com dez ou mais sílabas); ela divide o verso em duas partes, que se chamam “hemistíquios”, acen­tuando o movimento rítmico:
      Consola aquela dor, naquela angústia chora.
                                       (Castro Alves)

      Rima — é a correspondência de sons. Podemos classificar as rimas: 
    Quanto ao som em:
1. Perfeitas ou Imperfeitas:
a. perfeitas — quando existe identidade completa dos sons finais:
      Partituras imensas são os nossos dias,
      nem sempre entoando doces melodias.
                                       (Léa Amazonas)
b. imperfeitas — quando a identidade dos sons finais é incompleta:
      Teu perfil tem a linha imaginária
      das mais felizes frases literárias.
                                       (Paulo Mendes Campos)
2. Consoantes ou Toantes:
a. consoantes ( = soantes) — as  que têm os mesmos sons a partir da última vogal  tônica:
      Iremos assim vivendo,
      Com sucesso neste mundo,
      Vamos sempre aprendendo
      com um saber mais profundo.
                                       (Orpheu Luz Leal)
b. toantes ( = assoantes) — as que são feitas somente com as vogais tônicas:
      Serás um dia
      vago retrato
      de quem se diga
      o antepassado.
                                       (Cecília Meireles)
3. Agudas, Graves ou Esdrúxulas:
a. agudas ( = masculinas) — as que são feitas entre palavras oxítonas ou mo­nossílabos  tônicos:
      No seu  coração
      dorme um leão.
                                       (Murilo Mendes)
b. graves ( = femininas) — as que são feitas entre palavras paroxítonas:
      Ela é toda candura,
      Desmancha-se em doçura.
                                       (Elzio Luz Leal)
c. esdrúxulas — as que são feitas entre palavras entre palavras proparoxítonas:
  Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
  bebeu e soluçou como se fosse máquina
  dançou e gargalhou como se fosse o próximo.
                                       (Chico Buarque)
      Quanto à maneira por que se dispõem nos versos em:
1. Emparelhadas ( = Paralelas) — as que se sucedem duas a duas (a-a-b-b):
Quando o espectro da Cruz, braços na noite abertos,
      fez tremer de aflição os sinistros desertos
      da Vida, onde chorava a Humanidade, — um grito
      tombou de treva em treva, assombrando o Infinito.
                                     (Moacyr de Almeida)
2. Alternadas ( = cruzadas) — as que se alternam rimando o primeiro verso com o  terceiro, o segundo verso com o quarto e assim por diante (a-b-a-b):
      Ó pérola nitente
      ó pérola do amor
      ó ímã redolente
      das pétalas da flor.
                                       (Cruz e Sousa)
3. Opostas ( = Enlaçadas ou Interpoladas) — as que são feitas entre o primeiro e o quarto versos e entre o segundo e o terceiro versos (a-b-b-a):
      Vem me dizer
      que a dor da saudade
      é a marca da felicidade
      que eu não consigo esquecer.
                                       (Conceição Santos)
4. Encadeadas ( = Internas) — as que são feitas entre a última palavra de um verso e uma palavra do meio do verso seguinte:
      de jejuar os boatos
      mais gratos ao paladar?
                                       (Fernando Fortes)
5. Iteradas ( = Coroadas) — as que são feitas no mesmo verso:
      a terra está nova: devemos olhar o sol se elevar.
                                       (Jorge de Lima)
6. Misturadas — são as que têm distribuição livre:
      Unidas... Ai quem pudera
      n' uma eterna primavera
      viver, qual vive esta flor.
      Juntar as rosas da vida
      na rama verde e florida,
      na verde rama do amor.
                                       (Castro Alves)       
Nota — chama-se Oitava Rima a que é feita com versos que obedecem ao esquema a-b-a-b-a-b-c-c. Ocorre a oitava rima quando as estrofes são “oitavas”, isto é, compostas por oito versos; se os versos forem decassílabos, serão oitavas reais:
      As armas e os barões assinalados
      Que da ocidental praia Lusitana,
      Por mares nunca dantes navegados,
      Passaram ainda além da Taprobana,
      E em perigos e guerras esforçados
      Mais do que prometia a força humana
      Entre gente remota edificarão
      Novo reino que tanto sublimarão.
                                       (Camões)
  Quanto ao valor em:
1. Pobres — entre palavras que pertencem à mesma classe:
      Sem que eu volte para ;
      sem que eu desfrute os primores
      que não encontro por .
                                       (Gonçalves Dias)
2. Ricas — entre palavras de classes diferentes:
      Eu tenho a minha Loucura!
      Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura.
                                       (José Régio)
3. Preciosas — formadas por três palavras:
      Quisera ser a serpe venenosa
      para enroscar-me em múltiplos novelos,
      para saltar-te aos seios cor-de-rosa.
      E babujá-los e depois mordê-los.         
                                       (Cruz e Sousa)
4. Raras — entre palavras de terminação incomum:
      Destruiu-me todo o orgânico fastígio...
      Dai-me asas, pois, para o último remígio.
                                       (Augusto dos Anjos)
 
Versos Brancos
      Versos brancos ou soltos são aqueles que não têm ri­ma:
    Se eu morrer muito novo oiçam isto:
    nunca fui senão uma criança que brincava.
    Fui gentio como o sol e a água,
    de uma religião universal que só os homens não têm.
    Fui feliz porque não pedi cousa nenhuma,
    nem procurei achar nada,
    nem achei que houvesse mais explicação
    que a palavra explicação não ter sentido nenhum.
                                 (Fernando Pessoa)

Encadeamento
        O encadeamento ou "enjambement" ocorre quando a pau­sa do verso não coincide com a pausa respiratória:
    Hei de chorar por lembrar as caídas
    lágrimas que caíam de teus olhos,
    de teu olhar.
                                 (Luiz Carlos Alves Bastos)
Estrofe
        Estrofe ou “estância” é o nome que tem cada grupo de versos de um poema. De acordo com o número de versos, a estrofe classifica-se como:
    Dístico: com dois versos
    Terceto: com três versos
    Quadra: com quatro versos
    Quintilha: com cinco versos
    Sextilha: com seis versos
    Oitava: com oito versos
    Décima: com dez versos
Observação — as estrofes compostas de sete, de nove ou de mais de dez versos não têm designação especial.
      Leia o poema “Andorinha”, formado de dois dísticos:
        Andorinha lá fora está dizendo:
        — Passei o dia à toa, à toa!
        Andorinha, andorinha, minha cantiga é mais triste!
        Passei a vida à toa, à toa...
                                 (Manuel Bandeira)
 
Soneto
      O soneto é um poema com forma fixa. É formado de quatorze versos e cada verso possui, geralmente, dez sílabas poéticas.
      Pode ser apresentado em três formas de distribuição dos versos, todos com:
Soneto Italiano ou Petrarquiano: com duas 
estrofes de quatro versos (quartetos) e duas de três versos (tercetos);
Soneto Inglês ou Shakespeariano: com três quartetos e um dístico;
Soneto Monostrófico: com uma única estrofe de 14 versos.
 
                      Soneto da Felicidade
    De tudo, ao meu amor serei atento          
    antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
    que mesmo em face do maior encanto                        
    dele se encante mais meu pensamento.           
     
    Quero vivê-lo em cada vão momento          
    e em seu louvor hei de espalhar meu canto
    e rir meu riso e derramar meu pranto
    ao seu pesar ou seu contentamento.
 
    E assim, quando mais tarde me procure
    quem sabe a morte, angústia de quem vive
    quem sabe a solidão, fim de quem ama
 
    Eu possa me dizer do amor (que tive):
    que não seja imortal posto que é chama
    Mas que seja infinito enquanto dure.
                                 (Vinicius de Moraes)
 
Observação: O mais comum é o Soneto Italiano, com os quatorze versos agrupados em dois quartetos e dois tercetos; geralmente os quartetos têm rimas ABBA /ABBA e os tercetos CDC / CDC.
 
Estribilho
      Estribilho é o verso que se repete no final das es­trofes:
          Os favos, as pedras, as conchinhas
          dentro do cuieté, por tuas mãos pintado,
          são o teu tesouro.
          Os discos, os quadros, os livros
          nas estantes empilhados,
          são o teu tesouro.
          A chuva, o sol, os pés no chão;
          a sina do verso, o rumor da tarde
          são o teu tesouro.
                                 (Ciça Dutra)
LuciaArmenioLeal
Enviado por LuciaArmenioLeal em 12/07/2020
Reeditado em 12/07/2020
Código do texto: T7004004
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