PERGUNTA DE UMA LEITORA

Obs.: Este conteúdo está classificado na categoria certa. As gramáticas também apresentam o que é poesia.

A recantista Aldemira Aguiar, maranhense, há 38 anos morando no Pará, através de um e-mail, pede que eu explique sobre “o emprego da vírgula no final de versos”. Ela diz que tem “muitas dúvidas sobre poesia”.

Caríssima poetisa, o emprego da vírgula no final de versos é, atualmente, uma opção. Nesse caso, o poeta escolhe usar, ou não usar a vírgula. Além disso, se for a sua preferência, você pode até dispensar o ponto no final de versos ou estrofes. Veja, por exemplo, o poema “Vou-me embora pra Pasárgada”, de Manuel Bandeira. Nessa obra, o poeta não usa vírgula, nem ponto. Manuel Bandeira empregou apenas um ponto de exclamação, o ponto final na última estrofe, além de usar duas vezes o travessão. Você pode conferir através do Google.

Eis um exemplo de poema sem vírgula. É a obra poética “Canto de regresso à pátria”, de Oswald de Andrade. Veja a ausência da vírgula nesta obra. E ponto só no fim da última estrofe:

Minha terra tem palmares

Onde gorjeia o mar

Os passarinhos daqui

Não cantam como os de lá

Minha terra tem mais rosas

E quase que mais amores

Minha terra tem mais ouro

Minha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosas

Eu quero tudo de lá

Não permita Deus que eu morra

Sem que volte para lá

Não permita Deus que eu morra

Sem que volte pra São Paulo

Sem que veja a Rua 15

E o progresso de São Paulo.

Entre nós, esse modo de escrever poemas teve início na Semana de Arte Moderna, em que a nossa literatura buscava uma identidade nacional. “O imperativo é o da liberdade, da quebra de todos os padrões que determinavam, no passado, o que era poesia”, como é destacado por um livro de Língua Portuguesa da Editora Positivo.

No entanto, quem preferir pode continuar usando a forma tradicional na construção de suas obras poéticas, fazendo, pois, o emprego da pontuação como se faz na prosa. Eu, por exemplo, nas minhas obras poéticas, só uso a vírgula quando ela é absolutamente necessária.

Imaginemos, pois, este verso: Vida, amor e liberdade. A vírgula, neste caso, é necessária. Entretanto, há quem dispense essa vírgula. Veja, por exemplo, o POEMA OBSCENO, de Ferreira Gullar. Nessa obra, a ausência de vírgula é muito interessante. Caso queira conferir, veja no Google.

Para finalizar esta explicação, que não é tudo sobre poesia, eu deixo fragmentos de poemas. Peço aos leitores que observem a letra inicial minúscula ou maiúscula no início de versos e a vírgula nestes fragmentos.

Luís de Camões:

42

Amor que o gesto humano na alma escreve,

vivas faíscas me mostrou um dia,

donde um puro cristal se derretia

por entre vivas rosas e alva neve.

[...]

Castro Alves:

A canção do africano

Lá na úmida senzala,

Sentado na estreita sala,

Junto ao braseiro, no chão,

Entoa o escravo o seu canto,

E ao cantar correm-lhe em pranto

Saudades do seu torrão...

[...]

Olavo Bilac:

Sonho

Quantas vezes, em sonho, as asas da saudade

Solto para onde estás, e fico de ti perto!

Como, depois do sonho, é triste a realidade!

Como tudo, sem ti, fica depois deserto!

[...]

Eis um poema da grande poetisa Cecília Meireles. Veja a inicial minúscula no início de versos. Veja a vírgula. Veja o ponto no final das estrofes.

Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,

assim calmo, assim triste, assim magro,

nem estes olhos tão vazios,

nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,

tão paradas e frias e mortas;

eu não tinha este coração

que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,

tão simples, tão certa, tão fácil:

- Em que espelho ficou perdida

a minha face?

É isso! Você escolhe a sua forma de escrever poemas! Você pode escolher seguir a tradição ou escrever de forma livre.

Muito obrigado pela deferência!

Um abraço!

Domingos Ivan Barbosa
Enviado por Domingos Ivan Barbosa em 25/10/2014
Código do texto: T5011860
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