Dúvidas de Português – 2ª Fase

Prólogo

Por que o idioma Português não é fácil? Para dar essa resposta vamos tomar como exemplos as palavras “pitu” e “pitú”. Observamos que a primeira não contém acentuação gráfica, mas a segunda (pitú) é acentuada. Pitu (sem acento gráfico) tem dois significados:

1. Macrobrachium carcinus — crustáceo de água doce, também chamado de lagostim;

2. Metanephrops rubellus — crustáceo de água salgada, também chamado de lagostim.

Já a palavra pitú — é uma marca de aguardente de cana-de-açúcar (tipo de cachaça). A Pitú, empresa de mesmo nome, foi fundada no ano de 1938 (inicialmente sob o nome de S.Cândido e Cia), no Estado de Pernambuco. Inicialmente, além de fabricar a aguardente, também trabalhava com vinagre e bebidas derivadas do Maracujá e do Jenipapo. Ora, por que isso acontece? Refiro-me às divergências nos significados e nas grafias de uma simples palavra composta de quatro letras: Pitu!

A Pitú — aguardente de cana-de-açúcar (tipo de cachaça) teve o apoio da Lei de Registros Públicos, nos termos da Lei no 6.015/73. Trata-se de um nome de fantasia! Se você quiser registrar um filho seu com o nome de Phillipe, em vez de Filipe ou Felipe é um direito seu que o tabelião ou tabelioa haverá de respeitar porque a Lei de Registros Públicos dá esse aval. É por esse mesmo motivo que encontramos por esse Brasil afora: Cardoso e Cardozo, Cavalcante e Cavalcanti, Henrique e Enrique, Luís e Luiz, Meneses e Menezes, Teresa e Tereza, Isabel e Izabel, Carmem e Carmen, Sousa e Souza, Wilson e Uilson etc.

Em Campina Grande/PB, na Av. Juscelino Kubitschek, nº 2550, há uma casa comercial com o nome: “Supermercado A Pexinxa”. As letras são enormes e toma toda a fachada do prédio que mede de 15 a 20 metros de largura. Ora, pechincha (grande vantagem ou lucro surpreendente ou qualquer coisa muito mais barata que habitualmente (feira de pechinchas)) é com “ch”, mas a supracitada Lei de Registros Públicos permite essa ignomínia (infâmia) de nosso idioma pátrio para induzir crianças, adolescentes e adultos (pouco esclarecidos) a erros crassos.

DÚVIDAS FREQUENTES

"A moral" ou "O moral"?

A moral é o conjunto das normas de conduta, os princípios que regem os bons costumes de uma sociedade e que são convencionados como válidos. Por exemplo: Respeite a moral de nossa cidade. A moral também pode significar a conclusão ou o propósito de algum fato. Por exemplo: Qual foi a moral da piada que ele contou? O moral diz respeito ao ânimo, à disposição e ao estado de espírito das pessoas. Por exemplo: O moral da classe estava baixo depois da prova de português. O técnico melhorou o moral do time.

"1,5 milhão" ou "1,5 milhões"?

A unidade “milhão” só vai para o plural a partir do segundo milhão, ou seja, a partir de 2 milhões. Em caso de dúvida, portanto, observe o número que antecede a vírgula e lembre-se que numerais como “milhão”, “bilhão” e “trilhão” devem concordar com esse número. Exemplos: 1,5 milhão, 1,9 milhão, 2,25 milhões, 5,1 bilhões etc.

"A nível" ou "Em nível"?

Essa expressão requer a preposição "em", portanto a forma correta e a única que deve ser usada é "em nível". O mais interessante dessa expressão é que ela não é necessária e pode ser suprimida, pois não acrescenta nada ao que se escreve ou se diz. Por exemplo:

O assunto deve ser tratado em nível de família. (O assunto deve ser tratado em família.). Isso possibilita analisar o problema em nível de múltiplas soluções. (Isso possibilita analisar o problema em múltiplas soluções.) O tema foi decidido numa reunião em nível de juízes. (O tema foi decidido numa reunião de juízes.). Sua tarefa é desenvolver um trabalho em nível de exercícios para pessoas idosas. (Sua tarefa é desenvolver um trabalho de exercícios para pessoas idosas.) A campanha será feita em nível mundial. (A campanha será mundial.).

Nossos iluminados (alguns nem tanto) políticos adoram a expressão errada e detestável “A nível”. Eles dizem estalando a língua: “O PT, a nível nacional, faz uma excelente campanha.”. Ora, ora, ora, com isso os boçais cometem um erro crasso e falam uma mentira deslavada!

ATENÇÃO: É correto o emprego da expressão "ao nível de" quando se quer dizer que algo está na mesma altura em relação a outra coisa, seja com sentido próprio (denotativo) ou sentido figurado (conotativo). Por exemplo: Ubatuba está ao nível do mar. (Ubatuba está na mesma altura do mar.).

"Afim" ou "A fim"?

1 - "Afim" é um adjetivo e significa igual, semelhante, parecido. Exemplos: Suas ideias são afins. Possuem temperamentos afins; por isso se relacionam tão bem.

2 - "A fim" faz parte da locução "a fim de", que significa para, com o propósito, com o intuito e indica finalidade. Exemplo: Wilson fez tudo aquilo a fim de nos convencer da inocência de seu cliente. Henrique apresentou-nos todas as propostas de pagamento a fim de vender os produtos.

"Acerca de", "A cerca de" ou "Há cerca de"?

1 - "Acerca de" é uma locução prepositiva e equivale a "sobre", "a respeito de". Por exemplo: Estávamos conversando acerca de educação. Eles falavam acerca de política.

2 - "A cerca de" indica aproximação. Por exemplo: Minha família mora a cerca de 2 Km daqui.

3 - "Há cerca de" indica tempo decorrido. Por exemplo: Compraram aquela casa há cerca de três anos. Maria Antônia e Eu não nos falamos há cerca de dois meses.

"Ao encontro de" ou "De encontro a"?

1 - "Ao encontro de" significa "ser favorável a", "aproximar-se de". Por exemplo: A opinião dos estudantes ia ao encontro das nossas. Logo que a vi fui ao seu encontro para recepcioná-la. Wilson foi ao encontro das amigas.

2 - "De encontro a" indica oposição, colisão. Exemplos: Não concordo com suas atitudes. Sua maneira de agir sempre veio de encontro a minha. O caminhão foi de encontro ao carro que estava parado. O que ele fez foi de encontro ao que eu tinha dito.

"Aterrisar" ou "Aterrissar"?

Quanto a essas formas, a única correta é "aterrissar", "aterrissagem". Esta palavra deriva-se do vocábulo francês "aterrissage". Veja os exemplos: O avião aterrissou ontem à noite. O piloto fez uma aterrissagem muito brusca.

"Bem" e o hífen

"Bem" é seguido de hífen quando o vocábulo seguinte possui vida autônoma. Por exemplo: bem-vindo, bem-criado, bem-casado, bem-falante, bem-humorado, bem-nascido, bem-posto, bem-querer.

ATENÇÃO: os compostos em que o termo "bem" vier seguido de vogal devem ser grafados com hífen. Por exemplo: bem-estar, bem-aventurado, bem-afortunado, bem-ouvido, bem-amada, bem-arrumado. Exemplo em que não há hífen: benquisto.

"Bemvindo" ou "bem-vindo"?

"Bem-vindo" é um adjetivo composto. Nesse caso, é sempre grafado com hífen. Os dicionários brasileiros mostram a forma com hífen quando o sentido é de saudação. No entanto, indicam que existe também a forma "Benvindo" (com "n" e sem hífen), que atua como nome de pessoa e em respeito à Lei de Registros Públicos: "Benvindo" para homens e "Benvinda" para mulheres.

"Bi-campeão" ou "Bicampeão"?

Os prefixos: uni, bi, tri etc. NUNCA provocam hífen. Exemplos: unilateral, bicampeão, tricampeão, tetracampeão etc.

"Circuíto" ou "Circuito"?

A maneira correta, gramaticalmente, é cir-cui-to. Não se deve destacar a letra "i" da letra "u" ao pronunciar essa palavra. Assim, estende-se também essa regra aos vocábulos: "gratuito", "intuito" e fortuito".

"De sopetão" ou "De supetão"?

A forma correta é "de supetão", com "u". A palavra ‘supetão’ pertence à mesma família da palavra ‘súbito’ e significa ‘de súbito’, ‘de repente’.

"Distratar" ou "Destratar"?

1 - "Distratar" significa não cumprir o trato, desfazer o que havia sido combinado. Por exemplo: Luzia distratou o que havia combinado com seu amigo Henrique.

2 - "Destratar" significa insultar, ofender, maltratar. Por exemplo: Ele destratou os colegas porque havia sido enganado por todos. Quer ser meu amigo? Não destrate idosos, mulheres, crianças e os animais.

"Em vez de" ou "Ao invés de"?

1 - "Em vez de" indica substituição, troca. Por exemplo: Em vez de estudar, ficou brincando com os amigos. Em vez de ir ao cinema, fui ao teatro.

2 - "Ao invés de" indica algo inverso, contrário. Essa expressão supõe uma "oposição". Por exemplo: Ao invés de ligar os fios na tomada, desligou-os. Descemos, ao invés de subir.

"Empecilho" ou "Impecilho"?

A forma correta é empecilho, impecilho não existe. Por exemplo: Ao longo do caminho alguns empecilhos impediram que Wilson chegasse no horário marcado.

"Espectador" ou "Expectador"?

Espectador com "s" é aquele que assiste a um espetáculo. Por exemplo: Os espectadores da peça de teatro ficaram sentados o tempo todo a pedido dos atores.

Expectador com "x" é aquele que está na expectativa de alguma coisa; é aquele que alimenta a esperança ou a probabilidade de conseguir algo. Por exemplo: Os expectadores estavam ansiosos para o início do sorteio dos carros.

O MAIS NOVO ACORDO ORTOGRÁFICO DA LÍNGUA PORTUGUESA

Em 16 de dezembro de 1990, foi assinado, em Lisboa, o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Além de Portugal, também Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe assinaram o Acordo, tendo Timor-Leste a ele aderido em 2004, após se ter tornado independente.

De acordo com a Deliberação n.º 3-PL/2010, de 15 de dezembro a Assembleia da República, a partir de 1 de janeiro de 2012, passou a aplicar a ortografia constante do Acordo Ortográfico em todos os seus atos legislativos e não legislativos, bem como nas suas publicações oficiais e instrumentos de comunicação com o exterior (Diário da Assembleia da República I e II Séries, Canal Parlamento, edições e portal da Internet).

O presente texto tem também como objetivo descrever e apresentar as novas regras da grafia portuguesa – as alterações mais emblemáticas – previstas no Acordo.

HIFENIZAÇÃO

SUPRESSÃO DO HÍFEN

O hífen é eliminado nos seguintes casos:

— Quando as palavras formadas por prefixos ou falsos prefixos terminam em vogal e o segundo elemento começa por «r» ou «s», duplicando-se a consoante: Exemplos: antirrevolucionário, ultrassecreto, contrarreação, corréu;

— Quando as palavras formadas por prefixos ou falsos prefixos terminam em vogal e o segundo elemento começa por vogal diferente: Exemplos: extraescolar, autoestrada, autoescola, agroindustrial;

— Quando as palavras são formadas pelo prefixo «co», mesmo nos casos em que o segundo elemento começa por «o»: Exemplos: coadministração, codireção, coocorrência;

— Com as formas monossilábicas do verbo «haver» seguidas da preposição «de»: Exemplos: hei de, hás de, há de, heis de, hão de;

— Em compostos em que se perde a noção de composição. Exemplos: paraquedas, mandachuva;

— Em locuções de uso geral. Exemplos: cartão de visita, fim de semana.

USO DO HÍFEN

Algumas regras do uso do hífen são sistematizadas. O hífen é usado nos seguintes casos:

— Quando as palavras formadas por prefixos ou falsos prefixos terminam em vogal e o segundo elemento começa pela mesma vogal. Exemplos: anti-inflamatório, auto-observação, contra-almirante, micro-ondas;

— Quando as palavras são formadas pelos prefixos «hiper», «inter» e «super» no caso em que o segundo elemento começa por «r». Exemplos: hiper-realista, inter-regional, super-revista;

— Quando as palavras são formadas por prefixos ou falsos prefixos e osegundo elemento começa por «h». Exemplos: super-homem, neo-helénico;

— Quando as palavras são formadas pelos prefixos «ex», «pós», «pré», «pró» e «vice». Exemplos: ex-deputado, pós-graduação, pré-escolar, pró-europeu,vice-presidente;

— Quando as palavras são formadas pelos prefixos «circum» e «pan» e o segundo elemento começa por vogal, «h», «m» ou «n». Exemplos: circum-hospitalar, circum-navegação, pan-africano, pan-helénico;

— Em topónimos iniciados pelos adjetivos «grã» e «grão» ou cujos elementos estejam ligados por artigo. Exemplos: Grã-Bretanha, Grão-Pará, Albergaria-a-Velha, Montemor-o-Novo, Trás-os-Montes;

— Em palavras compostas que designam espécies botânicas e zoológicas. Exemplos: feijão-verde, ervilha-de-cheiro, andorinha-do-mar, cobra-coral;

— Em palavras compostas formadas por elementos de natureza nominal, adjetival, numeral ou verbal. Exemplos: decreto-lei, azul-escuro, primeiro-ministro, conta-gotas.

OBSERVAÇÃO OPORTUNA E PERTINENTE

Em relação ao uso do hífen, aconselha-se também a consulta de Vocabulário Ortográfico do Português (vide Recursos para aplicação do Acordo Ortográfico).

CONCLUSÃO

“O homem deve seguramente acreditar que o incompreensível se tornará compreensível, ou então ele deixará de procurar.” – (Goethe).

“Comparo o Professor a um abnegado pelo ardor da esperança. Um ser em chamas aquecidas e renovadas pela confiança no progresso de si mesmo e dos alunos. Um profissional que acredita na conquista do porvir.” – (Wilson Muniz Pereira).

Estou ciente de que este trabalho NÃO ESGOTA o assunto, não há esta pretensão! Tampouco constitui um “manual” perfeito e acabado, pois procura só dar uma visão rápida da temática, aguçando a curiosidade dos interessados no aperfeiçoamento do idioma pátrio.

Ufana-me, entretanto, saber que se trata de um precioso instrumento de lavor, por conter diretrizes certas e seguras para a solução das dúvidas mais frequentes suscitadas no dia a dia de todos nós leitores, professores e eternos aprendizes (Eu mais do que ninguém).

Observação: Para não me tornar cansativo e enfadonho vou interromper estes ensinamentos prometendo voltar, mais cedo do que se imagina, com a última fase.

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NOTAS REFERENCIADAS

— Help – Sistema de Consulta Interativa;

— Novíssima Gramática da Língua Portuguesa - Domingos Paschoal Cegalla;

— Portal da Língua Portuguesa. www.portaldalinguaportuguesa.org;

— Vocabulário Ortográfico do Português;

— Lince – conversor para a nova ortografia;

— CASTELEIRO, João Malaca, Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, Porto Editora, 2010;

— BERGSTRÖM, Magnus e REIS, Neves, Prontuário Ortográfico e Guia da Língua Portuguesa, Casa das Letras, 2011

— Prontuário da Língua Portuguesa, Acordo Ortográfico, Porto Editora, 2010;

— Site Só Português: http://www.soportugues.com.br/

— Papéis avulsos, rabiscos, fragmentos e outros textos do Autor.