Eis Um Dedo de Maturidade Gramatical
Said Ali (Gramática Histórica da Língua Portuguesa): ".... Origem e emprego do interrogativo o que. - Esta forma foi a princípio estranha à língua, mesmo nas interrogações indiretas onde mais tarde se generalizou........ EM MUITOS CASOS O SENTIDO ERA DÚBIO, OU PELO MENOS CONFUSO, porque a palavra que, além de pronome, também pode ser partícula (conjunção); ..... o confronto de não sei o que é com as frases paralelas não sei quem é, não sei qual é, DETERMINOU O ESCURECIMENTO DA NOÇÃO demonstrativo no vocábulo o, passando ele a funcionar, nas interrogações indiretas, como reforço do pronome que.
Admitida a forma o que na interrogação indireta, estava dado o primeiro passo para a sua admissão nas perguntas diretas......... A NECESSIDADE DESSE RELEVO NO COMEÇO DE PERGUNTA NÃO SE ANIMARAM OS ESCRITORES A MANIFESTAR SENÃO MODERNAMENTE.
Ao senso comum parece tão legítimo dizes o quê? Como o que dizes? A gramática, reconhecendo interrogativo acentuado no primeiro caso, reconhece-o também no segundo........ -O que é que eu vejo? (Castilho).... -O que foi isto? (Castilho) ....-O que é o livro? (Herculano).
POSTO QUE OS SUPRACITADOS EXEMPLOS DE O QUE A PAR DO SIMPLES QUE SEJAM DE AUTORES DO SÉCULO XIX, NÃO SE CONHECENDO EXEMPLOS ANÁLOGOS EM SEISCENTISTAS NEM NA LINGUAGEM GRAVE DOS QUINHENTISTAS, é certo entretanto que o emprego do interrogativo o que na linguagem falada remonta pelo menos ao século XVI. Houve, neste longo período, da parte dos escritores o receio de afastar-se da tradição, não ousando eles [os escritores antigos] admitir em suas obras uma expressão já sancionada pelo falar usual......"
Quid novi? =Que há de novo? Era o que corretamente tínhamos, uma expressão sancionada [= aprovada, ratificada] pelo falar usual: Que há? ( E não: "O" que há? )
Dic.Caldas Aulete, 5a ed.,pág. 2748: " Necessidade, s.f. O que tem de ser; o que não pode ser de modo diverso do que é. É de necessidade que duas proposições contrárias não possam ser simultaneamente verdadeiras...."
Em outras palavras, o que é não pode ser e não ser ao mesmo tempo:Quid novi? =Que há de novo? ( E não: "O" que há de novo?) Nada justifica o emprego do artigo o antes do interrogativo que genuíno, castiço, exceto o escurecimento da noção, a confusão, conforme historicamente aponta Said e tantos outros.
João Ribeiro: " Omite-se ( o artigo o ) antes do que interrogativo. Que é isto? Que é ciência? -e não - o que é isto? O que é a ciência?
É uso clássico, mas não o de hoje em Portugal nem no Brasil." (Gramática Portuguesa: Curso Superior. 22a edição..., 1933.)
E quem é João Ribeiro? (Juntamente com Júlio Ribeiro) João Ribeiro é apontado como um dos melhores gramáticos pelo dr.Napoleão Mendes de Almeida, qualquer um pode confirmar isso lendo atentamente a Gramática Metódica do dr.Napoleão.
Porém não estamos medindo nem avaliando competências ou quaisquer outras coisas de quem quer que seja, mas tão somente analisando o real sentido de se empregar "o" antes de "que", quando este é INTERROGATIVO: Que é isto? Que há de novo? São interrogações corretas e fortes por si mesmas. Persistindo a dúvida, no entanto, basta se interrogar: -Quais são os interrogativos da língua portuguesa? -Que função exerce o artigo o nesta oração: "O" que há de novo? -Desde quando nos veio isso? .... Quid novi? =Que há de novo?
-Vitório Bergo (Erros e Dúvidas de Linguagem): "Em frases interrogativas, justifica-se às vezes aquele o antes do que; mas também é certo que ele se dispensa em todas elas".
-Prof. Leo Ricino (no Google): ".... E aqui poderíamos ficar transcrevendo as várias opiniões, como a de Aires da Matta Machado Filho, que aceita o o antes do que, mas diz ser deselegante; Vasco Botelho do Amaral é favorável ao uso do o; Silveira Bueno não só é favorável como também condena os contrários e aponta vários exemplos de autores consagrados, baseando-se em Rui Barbosa (contrário) e Ernesto Carneiro Ribeiro (favorável); Evanildo Bechara aceita o emprego de o que; Rocha Lima também; Celso Cunha e Lindley Cintra aceitam e dão exemplos, destacando que o emprego do o que dá mais ênfase à interrogação, e, finalmente, Said Ali cita como pronomes interrogativos, dentre outros, que ou o que, equivalentes de 'que coisa.'...."
Dic.Michaelis on: "que 2 pron interrog subst (lat quid) 1 Qual coisa? Quais coisas?: Que quer o senhor? De que precisa? (Pode vir acompanhado do pronome expletivo o: O que é? O que tem você?)...."
Que significa a palavra expletivo? " Expletivo (conforme o próprio Michaelis) adj (lat expletivu) 1. Redundante 2. Que serve para preencher ou completar. 3 Gram Diz-se das palavras que se empregam para dar mais força, mais realce ou energia à expressão, mas que se podem suprimir sem alterar o sentido. sm O mesmo que expletiva."
E que significa redundante? Dic.Michaelis: " Redundante
adj m+f (de redundar) 1 Que redunda. 2 Em que há redundância. 3 Superabundante, supérfluo, excessivo. 4 Pleonástico. Antôn (acepção 4): conciso."
" SUPÉRFLUO, EXCESSIVO," logo " SINTÁTICA E EUFONICAMENTE INÚTIL." Ensinar como faz o Michaelis on "...(Pode vir acompanhado do pronome expletivo o: O que é? O que tem você?) ..." é totalmente nocivo. " Expletivo ....3 Gram Diz-se das palavras que se empregam para dar mais força, mais realce ou energia à expressão, mas que se podem suprimir sem alterar o sentido " (Dic.Michaelis).
Expletivo temos nestas expressões: Manhã clara! Que manhã clara! Vida amarga! Que vida amarga! Aqui temos o emprego expletivo deste "que" dando real força, realçando mais e dando mais energia à expressão: Que manhã clara! Que vida amarga! "..., mas que podem ser supridos sem alterar o sentido."
Já o artigo "o" antes do interrogativo "que" trabalha exatamente ao contrário, pois, além de "SUPÉRFLUO,EXCESSIVO,INÚTIL," tira a beleza e a força da expressão.E o que é pior,realça apenas o erro da sintaxe. Eis um dedo de maturidade gramatical, no Brasil e no mundo:
Doutor Napoleão Mendes de Almeida, Gramática Metódica da Língua Portuguesa: -"Interrogativos: São assim chamados que, quem,qual e quanto, quando participantes de orações interrogativas: 'Que horas são?' -'Que hora é?' -'Quem disse?' -'Qual homem isso conseguirá?' -'Quantos soldados devemos mandar?' -'Quanto queres?'.....................................
NÃO CONSTITUI CONSTRUÇÃO SINTATICAMENTE LEGÍTIMA O EMPREGO DA FORMA 'o que' COMO PRONOME INTERROGATIVO, embora comum no linguajar do povo e, mais ainda,encontrado em bons escritores. O que sois? (Gonç, Dias) -O que será padre? (Garrett) -O que te fez, meu filho? (Odorico Mendes) -O que será feito de frei Timóteo? (Alex. Herculano) -O que fariam eles? (Latino Coelho) -O que era isto? (Castilho) -O que são sílabas? (Aulete).
Também o espanhol luta com o popular interrogativo 'el que'.
Não é construção legítima, porque o 'o' ( ou o 'el' espanhol) NENHUMA FUNÇÃO SINTÁTICA FICA EXERCENDO NA ORAÇÃO, emprega-se somente quando estritamente necessário para a eufonia, o que se dá quando o 'que' vem depois do verbo: 'Fez ele o quê?' -'Mandarias o quê?'
INICIANDO a oração o 'que', mais castiçamente, deverá vir desacompanhado do 'o', porque neste caso é sintática e eufonicamente inútil: 'Que queres?' -'Que há?' -'Que?!' "
Dicionário de Questões Vernáculas,Ed.Caminho Suave,1981: "Com função pronominal, o pronome que NÃO deve vir precedido de o no início de uma interrogação; o CERTO é perguntar: Que quer você? Que há? Que é que você está pensando? Mas que querem eles? (e não: O que quer você?) etc" (Doutor Napoleão Mendes de Almeida).