“CHAMÁ-LO” x “CHAMAR-LHE”

Um respeitado e digno comentarista, em nosso texto intitulado “LÓGICA x GRAMÁTICA” [Código do Texto T3493043], de 11-2-2012, fez-nos uma interessante advertência sobre a construção do verbo CHAMAR na sentença “E quem teria coragem de ‘chamar-lhe’ solecista?”. Diz o ilustre comentarista: “O certo ‘chamá-lo’: – E o aluno solecista? (interroga a diretora) Ninguém foi ‘CHAMÁ-LO’? – Sim (responde a secretária); o professor já foi ‘CHAMÁ-LO’ (v. tr. dir. = chamar o aluno.).”

Com todo respeito e admiração, ousamos discordar do ilustre comentarista, uma vez que, em se tratando da particular transitividade do verbo CHAMAR, há de se observar o seguinte:

EDUARDO CARLOS PEREIRA, muito embora reconheça ser mais frequente uma construção como “Chamei-o sábio”, observa ser comum entre os clássicos a construção “Chamei-lhe sábio”. (Gramática Expositiva para o Curso Superior, Monteiro Lobato & Cia, 15ª ed., 1924, p. 210).

EVANILDO BECHARA, numa extensa relação de regências de alguns verbos e nomes, acerca do verbo CHAMAR, sentencia: “No sentido de ‘mandar vir’ é transitivo direto; no de ‘dar nome’ é transitivo indireto...” (Moderna Gramática Portuguesa, Editora Lucerna, 37ª ed., 2004, p. 573).

“CHAMAR — Este verbo no sentido de dar nome, admite três construções: Exs.: Chamei-lhe ignorante; chamei-o ignorante; chamei-o de ignorante.” (LUIZ A. P. VICTÓRIA, Tira-Dúvidas de Português, Edições de Ouro, s/d, p. 36).

“CHAMAR-LHE — No sentido de dar nome a alguém o verbo ‘chamar’ se usa geralmente, na linguagem literária, com objeto indireto e predicativo: “Dito isto, ele pediu perdão por demais, ‘chamou-lhe criança’ e má cabeça, abraçou-a por força, chamou o cocheiro e partiu.” (CCB, Fani, 104). — Não é raro todavia o emprego com objeto direto, vindo geralmente o predicativo precedido da preposição ‘de’: “E se ‘o chamo de’ filho, perdoe: é balda de gente madura. Poderia ‘chamar-lhe irmão’, de tal maneira somos semelhantes, sem embargo do tempo e do pormenor físico.” (CDA, Bolsa e Vida, 114).” (VITTÓRIO BERGO, Erros e Dúvidas de Linguagem, Livraria Francisco Alves Editora, 7ª ed., 1988, p. 90).

Pelo encimado, pensamos estar perfeitamente correta a sentença “E quem teria coragem de ‘chamar-lhe’ solecista?”

Entretanto, jamais nos esqueceremos de que “As razões da divergência são mais úteis do que as da concordância, porque suscitam reflexão e o reexame de nossas opiniões.” – B. CALHEIROS BOMFIM.

A Língua Portuguesa — sempre o sustentamos — tem lá seus mistérios e caprichos...

David Fares
Enviado por David Fares em 17/03/2012
Reeditado em 31/03/2012
Código do texto: T3560003
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