Desculpar ou não? Eis a questão!
DESCULPAR OU NÃO? EIS A QUESTÃO!
Mesmo que não estejamos em vigilância constante, até porque nossos erros e deslizes são tão ou mais graves que os praticados pelo comum dos mortais, não podemos nos furtar de fazer alguns comentários, em se considerando a dedicação que nutrimos pelo pátrio idioma, sobre uma mensagem exposta no centro de nossa cidade.
Examinemos: “DESCULPEM O TRANSTORNO, ESTAMOS TRABALHANDO PARA O SEU BENEFÍCIO!” Inicialmente atentemos ao fato que a estrutura linguística compõe-se de duas orações. A primeira oração, e a ordem pode ser alterada, apresenta o verbo no imperativo afirmativo, ou seja, “desculpem” (vocês). Ainda que o pronome pessoal esteja omisso, o sujeito não é classificado como “oculto”, já que está intrínseco no verbo e, portanto, as mais conceituadas gramáticas o classificam como elíptico.
As formas imperativas – afirmativas ou negativas – podem ou não ser cumpridas, dependendo de nossas condições, conveniências e uma multiplicidade de fatores. Na situação em pauta, não vemos por que não o fazer, já que afasta a ordem imperativa em nome da apelativa.
Como se sabe, quem desculpa, o faz, eximindo alguém. Destarte, somos levados a personificar o transtorno. Onde encontrá-lo? Talvez bem à frente – como entulho, caliça, tapumes. Como ele reagirá ante nossas desculpas? Difícil, não? Pois quem deve ser desculpado “somos nós”, causadores do transtorno.
Corrijamos então o deslize: “DESCULPEM-NOS”. Já melhorou, ainda que estejamos sendo induzidos à prática da aceitabilidade. O sujeito continua sendo “vocês”, e deixamos de desculpar o transtorno. Com a colocação do pronome “nos” e a consequente correção (desculpem a nós), exige-se a presença de uma preposição, ou seja, “DESCULPEM-NOS PELO TRANSTORNO”. Percebe-se, agora, que estamos, sob forma imperativa, solicitando que sejamos desculpados por termos realizado ou ainda operacionalizando, quem sabe obras, que estão causando transtorno. É latente, mesmo ao leigo, que a linguagem está se tornando, menos complexa e adequada aos padrões gramaticais. Ao menos, é nossa pretensão. E se desejássemos, poderíamos ficar cingidos a essa oração, que, por ser una, torna-se absoluta.
Temos por vezo explicar ou apresentar a causa de ações que transgridam a regularidade. Por vezes o motivo é plenamente dispensável, podendo gerar, em face de incorreções gramaticais, distorções interpretativas. Diferenciar-se-á uma estrutura que exija complemento, isto porque a oração principal não se completa e a segunda, subordinada, com ou sem conjunção, expõe o fator determinante.
Continuemos. Quando se lê “TRABALHANDO PARA SEU BENEFÍCIO!”
Incorre-se noutra infração linguística que nos leva a perguntar – benefício de quem? É óbvio que se objetiva o nosso benefício. Quem sabe aí esteja o porquê de sermos compelidos a desculpar. Entretanto, mesmo os mais incautos no idioma que Camões chorou no exílio, reconhecem, de imediato, que o pronome “seu” leva-nos a uma figura de linguagem que denota ambiguidade.
Logo, conforme o registro, se o benefício for para acentuar os inconvenientes do transtorno, não nos parece recomendável que o façamos. Deixaremos, dessa forma, de cumprir com o pedido, isto porque queremos para nós o benefício e não para o transtorno.
A ambiguidade poderia e deveria ser desfeita, ainda que seja foneticamente menos receptiva, ao usarmos ‘TRABALHANDO PARA O BENEFÍCIO DE VOCÊ”.
Como vêem, estamos num impasse “shakespereano”, desculpar ou não o transtorno, “eis a questão”, e se o fizermos, quem sabe, ele se avolume com o benefício.
Embora devam ser respeitadas as liberdades usuais, praticadas na linguagem coloquial, referendadas pelo Ministério da Educação, em nome da liberdade de expressão, preconizando quem sabe quanto “pior”, “melhor”, não nos cabe o direito de com as Universidades, Faculdades e intelectuais que tornam insigne a “Atenas Rio-grandense”, dar mostras de nossa incúria.
Jorge Moraes – jorgemoraes_pel@hotmail.com setembro/2011