O PRÍNCIPE PERPÉTUO DOS POETAS DA LÍNGUA PORTUGUESA
Sérgio Martins Pandolfo*
A 10 de junho comemora-se, em todo o mundo lusófono, o Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades Portuguesas, dia consabido da morte do grande poeta, cuja feita natalícia até hoje se ignora.
Quando se fala em Camões logo vem à tona, ou à mente, seu opus magnum “Os Lusíadas”, épico inexcedível sobre a saga das conquistas lusitanas de ultramar. Mas Camões não foi somente isso. A lírica camoniana está composta de numerosas outras formas de versejar, tais qual o soneto. O sôbolo bardo lusitano foi, a nosso ver, o maior de todos ao longo dos tempos, fato, aliás, reconhecido por ninguém menos que o idiocêntrico Bocage, um sonetista virtuoso e primoroso, que a ele assim se refere em sentidos versos seus: “Modelo meu tu és... Mas, ó tristeza!.../ Se te imito nos transes da ventura,/ Não te imito nos dons da natureza”.
Inobstante a vasta e variada coletânea poética que deixou, sua segunda obra de primeira grandeza, segundo o próprio vate – Parnaso Lusitano –, lhe fora furtada e nunca encontrada, o que deu azo a que numerosas composições lhe tenham sido atribuídas postumamente, sem comprovação, bem como poesias reivindicadas por outros poetas, coevos ou pósteros, lhe terem sido deferidas, também “post mortem”, pelo estilo e linguagem, posto que dominava como ninguém o idioma, valendo-se à farta, e com perfeição, de figuras tais o hipérbato, a silepse..., e vocabulário personalista que chegava a quase configurar um idioleto.
Veja-se a satiridade, a mordacidade, a jorrar em bicas, “pari passu” com a “aula filosófica” neste improviso do aedo, no qual se vale da figura metafórica de uma ave, o perdigão (macho da perdiz), a estigmatizar um alguém de seu meio, para tal cometimento:
Perdigão perdeu a pena,
Não há mal que lhe não venha.
VOLTAS
Perdigão, que o pensamento
subiu em alto lugar,
perde a pena do voar,
ganha a pena do tormento.
Não tem no ar nem no vento
asas com que se sustenha:
não há mal que lhe não venha.
Quis voar a ûa alta torre
mas achou-se desasado;
e, vendo-se depenado,
de puro penado morre.
Se a queixumes se socorre,
lança no fogo mais lenha:
não há mal que lhe não venha.
(Moral da história: se a gente está na pior e se lamenta, aumenta mais o sofrimento)
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(*) Médico e escritor. ABRAMES/SOBRAMES
E-mails: sergio.serpan@gmail.com - serpan@amazon.com.br
Site: www.sergiopandolfo.com
Sérgio Martins Pandolfo*
A 10 de junho comemora-se, em todo o mundo lusófono, o Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades Portuguesas, dia consabido da morte do grande poeta, cuja feita natalícia até hoje se ignora.
Quando se fala em Camões logo vem à tona, ou à mente, seu opus magnum “Os Lusíadas”, épico inexcedível sobre a saga das conquistas lusitanas de ultramar. Mas Camões não foi somente isso. A lírica camoniana está composta de numerosas outras formas de versejar, tais qual o soneto. O sôbolo bardo lusitano foi, a nosso ver, o maior de todos ao longo dos tempos, fato, aliás, reconhecido por ninguém menos que o idiocêntrico Bocage, um sonetista virtuoso e primoroso, que a ele assim se refere em sentidos versos seus: “Modelo meu tu és... Mas, ó tristeza!.../ Se te imito nos transes da ventura,/ Não te imito nos dons da natureza”.
Inobstante a vasta e variada coletânea poética que deixou, sua segunda obra de primeira grandeza, segundo o próprio vate – Parnaso Lusitano –, lhe fora furtada e nunca encontrada, o que deu azo a que numerosas composições lhe tenham sido atribuídas postumamente, sem comprovação, bem como poesias reivindicadas por outros poetas, coevos ou pósteros, lhe terem sido deferidas, também “post mortem”, pelo estilo e linguagem, posto que dominava como ninguém o idioma, valendo-se à farta, e com perfeição, de figuras tais o hipérbato, a silepse..., e vocabulário personalista que chegava a quase configurar um idioleto.
Veja-se a satiridade, a mordacidade, a jorrar em bicas, “pari passu” com a “aula filosófica” neste improviso do aedo, no qual se vale da figura metafórica de uma ave, o perdigão (macho da perdiz), a estigmatizar um alguém de seu meio, para tal cometimento:
Perdigão perdeu a pena,
Não há mal que lhe não venha.
VOLTAS
Perdigão, que o pensamento
subiu em alto lugar,
perde a pena do voar,
ganha a pena do tormento.
Não tem no ar nem no vento
asas com que se sustenha:
não há mal que lhe não venha.
Quis voar a ûa alta torre
mas achou-se desasado;
e, vendo-se depenado,
de puro penado morre.
Se a queixumes se socorre,
lança no fogo mais lenha:
não há mal que lhe não venha.
(Moral da história: se a gente está na pior e se lamenta, aumenta mais o sofrimento)
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(*) Médico e escritor. ABRAMES/SOBRAMES
E-mails: sergio.serpan@gmail.com - serpan@amazon.com.br
Site: www.sergiopandolfo.com