TIVEMOS “MUITA” OU “MUITO” DÓ DAQUELA CRIANÇA?
No sentido de “consideração”, “compaixão”, “luto”, “tristeza”, esse vocábulo, por mais estranho que pareça, sempre foi MASCULINO.
Exemplo:
“É de saber que frei Jacinto de Deus tinha dó sincero do colegial.” (Camilo Castelo Branco, Bruxa, p. 37).
Entretanto, como primeira nota da escala musical, esse vocábulo é FEMININO.
Exemplo:
DÓ – RÉ – MI – FÁ – SOL – LÁ – SI
Ensina, a propósito do tema, DOMINGOS PASCHOAL CEGALLA:
“dó. S.m. Compaixão, pena. É subst. masc.: Ela tem muito dó desses infelizes. — ‘O vocábulo dó é masculino, mas na linguagem popular passa frequentemente como feminino.’ (Evanildo Bechara, MGP, p. 30).” (Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa, Editora Nova Fronteira, 2ª ed., 1999, p. 126).
*OBSERVAÇÃO: Em razão das lúcidas e muito bem lançadas ponderações feitas pelo ilustre recantista AMÉRICO PAZ, trazemos à baila os doutos ensinamentos do renomado gramático EVANILDO BECHARA:
“Inconsistência do gênero gramatical – A distinção do gênero nos substantivos não tem fundamentos racionais, exceto a tradição fixada pelo uso e pela norma; nada justifica serem, em português, masculinos lápis, papel, tinteiro e femininos caneta, folha e tinta.
A inconsistência do gênero gramatical fica patente quando se compara a distribuição de gênero em duas ou mais línguas, e até no âmbito de uma mesma língua histórica na sua diversidade temporal, regional, social e estilística. Assim é que para nós o sol é masculino e para os alemães é feminino die Sonne, a lua é feminino e para eles masculino der Mond; enquanto o português mulher é feminino, em alemão é neutro das Weib. Sal e leite são masculinos em português e femininos em espanhol: la sal e la leche. Sangue é masculino em português e francês e feminino em espanhol: le sang (fr.) e la sangre (esp.).” (Moderna Gramática Portuguesa, Editora Lucerna, 37ª ed., 2004, p. 133)