A PARENTA DA SERVENTA CHEGARÁ A PRESIDENTA?
Sérgio Martins Pandolfo*
“Língua Portuguesa, majestoso monumento imperecível da humana criação”
Na campanha eleitoral desta temporada, de desenfreada caça aos eleitores, se ouviu, aqui, ali, acolá, a solicitação de votos para a eleição, “logo de uma vez”, da primeira “presidenta” da República.
O ex-presidente Sarney, também escritor e membro da Academia Brasileira de Letras, fez escola nem um pouco edificante no Brasil. Em suas comunicações “via Embratel” iniciava sua fala com a conclamação: brasileiros e brasileiras! Foi o ponto de partida, acicatando o ego das brasileiras, e adensado pela incitação dos brasileiros, para uma verdadeira enxurrada de feminizações de cargos e funções até então pacificamente havidos como comuns de dois gêneros. E foram surgindo, ou melhor, se insurgindo, parenta (dianteiro do descaminho), serventa... presidenta, o que soa mal e dissonante.
Os brasileiros queixam-se amiúde, pra não dizer quase sempre e acerbamente, de que a língua portuguesa é muito difícil porque todas as regras gramaticais têm exceção – até se costumava dizer que “a exceção confirma a regra” -, olvidando que, na maioria das vezes, as exceções são criadas pelo uso constante, popular, equivocado, de palavras ou expressões que fogem ao que preceituam as regras da gramática, virando “coisa assentada pelo uso” ou variações diacrônicas.
O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, há pouco posto a viger, conquanto não tenha sido perfeito e ainda dê guarida a muitas imperfeições, conseguiu corrigir grande parte dessas excepcionalidades. Fez-se o que era possível, pois pressões e divergências eram tantas e tamanhas (a modo das "forças ocultas" de Jânio Quadros), a impossibilitar a obtenção do diploma ideal - “túrbidas águas de tempesta fúria”. Mas chegaremos lá! A obediência às regras da gramática é importante, para não dizer imperiosa, imprescindível à perpetuação do idioma, para que o não se desprimore ou amesquinhe.
O feminino de cargos e funções é regido, em nosso País, pela Lei nº 2.749, de 2 de abril de 1956, a qual dispõe que os nomes designativos de cargos e funções do funcionalismo público devem ter flexão para o feminino. Assim: acadêmico/a; advogado/a; curador/a; médico/a; oficial/a; bacharel/a; notário/a; tabelião/a etc. Entretanto, os nomes terminados em ente são comuns de dois gêneros. E isso vale tanto para adjetivos como para substantivos. Exemplos: superintendente, gerente, suplente, intendente (antigo prefeito), presidente, docente, servente, assistente. E mais: parente, aderente, escrevente, adolescente, dissidente, indecente, adquirente, inconsequente.
Dessa forma, flexionar parente, servente, presidente é fugir à regra geral, é, simplesmente, apor exceções ao que lá se preceitua, o que deve ser evitado, conquanto, a revel, alguns léxicos o acolham. A redizer o Professor Ernani Pimentel: “O mundo hoje não tem mais tempo para essas bobagens de exceções. (...). Isso é ilógico e a sociedade hoje não aceita mais isso. (...). As regras têm que partir de um princípio único.”
Uma boa, competente e, mais que tudo, honesta presidente será tão lembrada e celebrada quanto um presidente com iguais atributos.
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(*) Médico e Escritor. ABRAMES/SOBRAMES
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