Substantivo Concreto x Substantivo Abstrato
Texto originalmente publicado em: http://minhalinguaeeu.blogspot.com/ em 15 de Setembro de 2009
Diogo Xavier
Esta é uma pesquisa que tenta, através da comparação de quatro gramáticas, obter um conceito consistente de diferenciação entre os substantivos concretos e os abstratos.
Em muitos casos, algo explicado de forma muito simples acaba complicando mais as coisas. Quando ensinamos Língua Portuguesa, muitas vezes nos deparamos, em livros de gramática ou didáticos, com conceitos da gramática normativa vagos, mal-explicados e, quando comparamos autores, até contraditórios. Acredito que o ato de pesquisar deve ser inerente à profissão docente. Essa pesquisa se faz necessária, entre outros momentos, quando nos deparamos com esses conceitos vagos, mal-explicados. Se explicarmos aos alunos da forma simplista que alguns livros trazem, corremos o risco de perder nosso tempo, caso os estudantes não compreendam. Quem está sintonizado com as novas tendências do ensino de Língua Portuguesa sabe que o ideal é que partamos do texto e a ele voltemos para explicar os aspectos gramaticais de nossa riquíssima língua. Não irei me ater a esse ponto. O que pretendo hoje é fazer uma pesquisa comparativa para ver se consigo encontrar alguma explicação inteligível, concreta (perdoe o trocadilho) acerca da diferença entre o substantivo concreto e o substantivo abstrato. Cansei daquela explicação de que concreto é aquilo que pode ser tocado ou sentido...
Tenho aqui comigo quatro livros que consultarei:
* Gramática de Hoje, de Ernani & Nicola. São Paulo: Scipione, 1999.
* Gramática do Português Contemporâneo - edição de bolso, de Celso Cunha. Porto Alegre: Lexikon, 2008.
* Gramática Houaiss da Língua Portuguesa, de José Carlos de Azeredo. São Paulo: Publifolha, 2008.
* Moderna Gramática Portuguesa, de Evanildo Bechara. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.
Ernani e Nicola conceituam substantivo concreto como aquele que "designa os seres reais ou imaginários que têm existência própria." (p.88). Substantivo abstrato, segundo os mesmos autores, é o que "designa as qualidades ou ações tomadas como seres. Os substantivos abstratos, por não terem existência própria, sempre estão apoiados em algo para serem percebidos." (p.88).
Segundo Cunha, contretos são "os substantivos que designam os seres propriamente ditos, isto é, os nomes de pessoas, animais, vegetais, lugares, instituições, coisas." (p.106). Abstratos, para ele, são "substantivos que designam noções, estados, qualidades, considerados como seres." (p.107).
A Gramática Houaiss, diferentemente das duas anteriormente citadas, explica de uma maneira mais extensa a diferença entre as duas classificações em questão. Segundo o autor, Azeredo, "A distinção entre concreto e abstrato refere-se a dois modos de representar os conceitos denotados pelos substantivos: seres animados ou inanimados, reais ou criados pela imaginação, mas que 'estão no mundo' como seres reconhecíveis pelos sentidos, são nomeados por substantivos concretos [...]; noções que denotam propriedades abstraídas dos seres concretos, e não estão sujeitas à distinção animado x inanimado, real x imaginário, são nomeadas por substantivos abstratos". (p.155). Azeredo completa: "É comum a alteração semântica do substantivo abstrato para designar uma entidade concreta. É o caso de chamar construção ou edificação ao prédio, entrada ou saída aos lugares por onde se entre ou sai [...] Também é possível o emprego do substantivo concreto para designar uma entidade abstrata. É o caso de coroa para denotar o poder do rei ou do imperador, ou de luz para significar esclarecimento." (p.156).
Vejamos como Bechara conceitua substantivo concreto: "é o que designa ser de existência independente: casa, mar, sol, automóvel, filho, mãe. [...] Os substantivos contretos nomeiam pessoas, lugares, animais, vegetais, minerais e coisas.", (p.113). Substantivo abstrato, conforme diz a Moderna Gramática Portuguesa, "é o que designa ser de existência dependente: prazer, beijo, trabalho. [...] Os substantivos abstratos designam ações (beijo, trabalho, saída, cansaço), estado e qualidade (prazer, beleza), considerados fora dos seres, como se tivessem existência individual." (p.113).
Bem, juntando (por justaposição) todos os conceitos apresentados a respeito do substantivo concreto, temos: designa seres reais ou imaginários que têm existência própria; designam seres propriamente ditos (os nomes de pessoas, animais, vegetais, lugares, instituições, coisas); representam seres que podem ser distinguidos em animados ou inanimados, reais ou imaginados, que, de certa forma estão no mundo como seres reconhecíveis pelos sentidos; designam seres de existência independente (pessoas, lugares, animais, vegetais, minerais e coisas).
Isolados, esses conceitos são um pouco confusos, uns mais e outros menos. O fato de representar seres de existência independente, por exemplo, suscita a questão: o que é existência independente? Carro, segundo a classificação é concreto e, portanto, "não precisa de outro ser para existir". Mas ele se fez sozinho ou foi construído por outros seres (máquinas e homens)?
Tentarei fundir esses conceitos extraídos das gramáticas em estudo:
Substantivo contreto: representa seres propriamente ditos, ou seja, que têm existência própria e podem ser reconhecidos pelos sentidos, bem como distinguidos entre animados ou inanimados, reais ou criados pela imaginação: pessoas, animais, vegetais, minerais, coisas e instituições.
Vejamos agora os conceitos para substantivo abstrato: designa qualidades ou ações, tomadas como seres, e está sempre apoiado em algo para ser percebido; designa noções, estados, qualidades, considerados como seres; nomeia noções que denotam propriedades abstraídas dos seres propriamente ditos, que não estão sujeitas à distinção entre animado ou inanimado, real ou imaginário; designa ser de existência dependente: ações, estado e qualidade, considerados fora dos seres, como se tivessem existência individual.
Vamos ver o que eu consigo fundindo essas informações e acrescentando umas mais:
Substantivo abstrato: designa sentimentos, sensações físicas, ações, estados, qualidades (características), considerados fora dos seres, como se tivessem existência individual. Além de estar sempre apoiado em algo para ser percebido, foge à distinção entre animado ou inanimado, real ou imaginário. As noções nomeadas pelo substantivo abstrato denotam propriedades abstraídas (separadas) dos seres propriamente ditos.
Tentarei, com base nos conceitos obtidos, classificar em concretos ou abstratos alguns substantivos que causam bastante dúvida, tanto em alunos como em professores.
Diogo Xavier