"Traga o livro para mim ler" ou "traga o livro para eu ler" ?
Há quem explique que o "certo" é "traga o livro para eu ler" porque "mim" não lê - Eu leio.
É verdade.
"mim" não só não pode como não é sujeito do verbo "ler" em uma das frases acima. Porém, a explicação de que "mim não lê" é uma síntese, não uma análise e por isso não invalida a construção sintática da frase.
No período [traga o livro para] [eu ler] - "eu" é sujeito sintático do verbo "ler" com o qual constitui a oração "eu ler" ( o que explica o verbo não estar conjugado é o fato de essa oração ser subordinada à principal "traga o livro para" ).
Um fato curioso: a história da língua portuguesa revela que preposições regem, ou melhor regem pronomes. Na língua urbana, a preposição "para" rege, entre o pronome pessoal de 1º pessoa, um oblíquo ( para mim ). Uma explicação para essa construção poderia ser ilustrada assim:
[ traga o livro para x ] [eu ler] - em que "x" indica uma posição vazia, nesse caso a de regência. Por isso em "traga o livro para mim ler", o que houve foi uma reorganização do período:
1- Primeiro, a preposição atraiu o pronome-sujeito de dentro da oração subordinada deixando a posição de sujeito do verbo "ler" vazia:
[ traga o livro para eu [x ler]
2-Depois, transforma esse pronome do caso reto em oblíquo conforme a regência:
[ traga o livro para mim [x ler]
Então temos o período [traga o livro para mim] [ler] - em que "ler" é uma oração sem sujeito subordinada à principal "traga o livro para mim"
Esse fenômeno da oração sem sujeito subordinada não é incomum. Também ocorre em construções literárias, acompanhe a evolução:
[Deixei] [ele sair] - ("ele sair" é oração subordinada à "deixei" )
[Deixei ele [x sair] - ( a transitividade verbal atrai o pronome-sujeito)
[Deixei-o] [x sair] - ( o pronome/ reto é transformado em oblíquo)
"Deixei-o sair" é uma forma literária em que "sair" é oração sem sujeito subordinada à principal "deixei-o". A única diferença é que aqui o que rege oblíquo não é a preposição e sim a transitividade do verbo "deixar".
Em suma, orações subordinadas com ou sem sujeito são duas construções sintáticas legítimas do português. A escolha entre uma ou outra é uma questão estilística ou normativa e não estrutural. Nesse caso, o que a gramática normativa quer dizer com "é certo" é que, na visão dos gramáticos e da academia brasileira de letras, "traga o livro para eu ler" é mais elegante.