LUGAR-COMUM

Lugares, na antiga Retórica, eram “gavetas” virtuais onde se ordenavam os tipos de argumentos, para lançar mão deles quando preciso. Lugar da quantidade comportava, por exemplo, argumentos de que um livro lido por mais gente deveria ser melhor que os outros (vide os atuais “best-sellers”).

Lugar comum era o mais vulgar, o uso de citações e aforismos já consagrados na argumentação. Sobrevive hoje sob os nomes de clichês, lugares comuns, chavões, etc. São quase como objetos dos quais lançamos mão para produzir significados prontos, um “prêt-à-porter”. Assim, as palavras que usamos não provêm de reflexão, não nos damos ao trabalho de procurar o termo exato, original, para comunicar alguma ideia ou sentimento. Os lugares-comuns pensam por nós. Observe a entrevista de policiais ou paramédicos ante um acidente acontecido. É uma fieira de expressões: a vítima encontra-se em estado de óbito, em decúbito dorsal, etc.,etc.

O interessante é que, com exceção das boas obras literárias, mormente poesias, nenhum texto sobrevive sem o uso de clichês. Os lugares-comuns estão tão enraizados na Língua que torna-se impossível escrevermos ou falarmos alguma coisa sem recorrer a alguns ou a muitos deles.

Duvido você não encontrar em artigos ou matérias na imprensa expressões como: cair por terra, faca de dois gumes, página virada, pano de fundo, passar em branco, reta final, prova de fogo, dar na vista, exame de consciência, lançar mão, páreo duro, pôr ordem na casa, poder de fogo, ganhar corpo, ganhar notoriedade, baixar a guarda, a ferro e fogo, beco sem saída, acenar com a possibilidade, abraçar a causa, ajustar as contas, lançar mão, guerra de nervos, hora H, com mão de ferro, pontapé inicial, peça-chave, lista negra, limpar o nome, saltar à vista, seguir à risca, suar a camisa, sob a batuta de, sumir do mapa, trazer à tona, tempo hábil, toque de mestre, trilhar caminhos, etc., etc., etc..

(exemplos tirados da Revista Língua Portuguesa – Conhecimento Prático, n. 17, pg. 61)

Cada área, cada assunto, possui seus lugares-comuns. Com isso, hoje é possível dizer que, ao invés de o homem controlar a linguagem, é ela quem controla o homem, pois já se apresenta pronta em nossa boca ou em nossos textos.

Hilton Gorresen
Enviado por Hilton Gorresen em 07/08/2009
Código do texto: T1742455
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